
Passados os 90 dias, conforme o Washington Post, é “inconclusivo” o relatório encomendado no final de maio pelo presidente Biden à ‘comunidade de inteligência”, isto é, à CIA, para que estabelecesse a ‘origem do coronavírus’ – se natural (transmissão de animal a humano) ou se por ‘vazamento do laboratório de Wuhan’.
Em suma, o que o Post registra é que fracassou a operação da CIA, acionada por Biden mas que em última instância retoma o racismo de Trump em sua acusação de “vírus chinês”, tudo com o objetivo de enlamear e isolar a China, cujo desenvolvimento econômico, tecnológico e social e capacidade demonstrada ao fazer frente a desafios como a pandemia causam paúra e espanto em Washington.
A CNN, por sua vez, revelara anteriormente que a CIA estava usando “supercomputadores” para supostamente hackear bancos de dados chineses na nuvem.
A China já repudiara a tentativa de politizar a busca pela origem do coronavírus da Covid-19, advertira que essa atitude estava sabotando a cooperação internacional contra a pandemia e exigira que a ciência estivesse no posto de comando.
Também conclamara a direção da Organização Mundial da Saúde a não se deixar intimidar pelas pressões de Washington e a se ater às decisões da Assembleia Mundial da Saúde e ao estudo China-OMS de março.
A mesma fonte relatou ao Post que o ‘relatório’ não tem quaisquer fatos que ‘abalem os alicerces’, menos ainda, provas concretas. “Ficou aquém de responder a perguntas críticas”, reconhece o jornal.
Não chega a ser um espanto. Nunca ninguém ouvira falar na expertise da CIA em matéria de ciência e sua reputação é mais conhecida pelo escândalo das inexistentes armas de destruição em massa que serviram de pretexto para invadir o Iraque.
Ou pelo vídeo do então diretor Pompeo de “nós mentimos, nós fraudamos, nós roubamos”. Agora, “nós damos parecer em ciência”.
Recentemente, o virologista norte-americano Robert Garry, co-autor do estudo publicado na revista Nature no ano passado, que examinou e refutou a ‘hipótese laboratorial’, declarou que “nossa conclusão de que não vazou do laboratório é mais forte hoje do que quando escrevemos o artigo”.
“MOTIVO DE CHACOTA”
Como assinalara Yang Zhanqiu, do Instituto de Virologia de Wuhan, ao jornal Global Times, mandar uma equipe de espionagem procurar origens de vírus é “ridículo o suficiente”, razão pela qual “não é surpreendente que Biden acabe sem uma resposta definitiva”. Para o cientista, a insistência na chicana levará o governo Biden a virar “motivo de chacota”.
Segundo a Casa Branca, dentro de dias o relatório poderá ter seu teor divulgado. Para “dois oficiais seniores” norte-americanos, naturalmente ouvidos sob anonimato, a “ausência de conclusões é fruto, em parte, da falta de informações detalhadas por parte da China”.
Antes da invasão de 2003, durante a interminável década de bloqueio, Washington culpava o Iraque por se negar a mostrar as armas de destruição em massa inexistentes. Agora, o ardil é tentado, cinicamente, contra a China. Não vai funcionar.
Em julho, Pequim rechaçou proposta do secretariado da OMS que pretendia centrar as ‘buscas’ no laboratório de Wuhan, apresentada sob pressão de Washington. O Ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, disse que, como um país independente e soberano, a China não aceitará e não poderá aceitar qualquer plano de trabalho que não seja um plano real para encontrar o vírus, mas um plano para desacreditar a China.
RASTREAMENTO COMO A CIÊNCIA MANDA
Para a China, o estudo da próxima fase deve ser conduzido em escala global, se concentrando na fonte zoonótica e nos reservatórios, com estudos em vários lugares, e investigando pistas como amostras de sangue [com anticorpos de Covid, como na Itália e Espanha, anteriores ao início oficial da pandemia].
Na véspera do ‘relatório’, o embaixador da China junto aos organismos da ONU em Genebra, Cheng Xu, entregou à OMS carta de Pequim reafirmando sua posição sobre o rastreamento das origens da Covid-19, de que a fase 2 da investigação aborde vários países e que sejam acatadas as conclusões conjuntas da investigação in loco na China de março. Entre elas, a de que é “altamente improvável” que tenha havido vazamento laboratorial.
FORT DETRICK SOB LUPA
A carta foi acompanhada por petição assinada por mais de 25 milhões de internautas chineses que exigem uma investigação do laboratório norte-americano de Fort Detrick, notório pela manipulação dos mais perigosos vírus do mundo e que em 2019 teve de ser fechado por problema de segurança biológica. Também se verificou, na época, uma estranha pneumonia nos EUA (Evali).
“Se algumas partes acreditam que a hipótese do “vazamento de laboratório” permanece aberta, são laboratórios como Fort Detrick e o da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, que deveriam ser objeto de investigações transparentes, disse Chen.
Para o porta-voz da chancelaria chinesa, Wang Wenbin, “o trabalho de rastreamento de origens precisa da ciência, não da comunidade de inteligência, e deixar para essas agências o trabalho a ser feito é anticientífico, disse Wang Wenbin.
Não há como abafar que persistem perguntas sem resposta sobre o rastreamento das origens no lugar mais atingido no mundo – os Estados Unidos. Mais evidências sugerem que casos anteriores de Covid-19 foram encontrados nos EUA antes do surto oficialmente anunciado. Um jornal da Califórnia, o Mercury News, relatou que as primeiras mortes de Covid-19 nos Estados Unidos ocorreram mais cedo em lugares diferentes do que se pensava, o que é uma reviravolta significativa na compreensão do surto inicial.
Os registros de óbitos indicam que o vírus contribuiu para mortes anteriormente desconhecidas em janeiro de 2020 em locais na Califórnia, Alabama, Geórgia, Kansas, Oklahoma e Wisconsin.
“É intrigante que, quando os EUA culpam a China pela falta de transparência na pesquisa de rastreamento de origens e a difamam pela chamada desinformação, eles estão perseguindo seus próprios problemas”, disse Wang.
REVIRAVOLTA NA TESE TRUMPISTA
Esse jogo de Washington começou após matérias plantadas em dois dos principais jornais norte-americanos, o Post e o Wall Street Journal, para justificar uma cambalhota em relação a tudo o que os democratas diziam antes da eleição, que a origem do vírus era natural e que ‘vazamento do vírus chinês’ era negacionismo e racismo.
Curiosamente, um dos autores há duas décadas cumprira o mesmo papel, exatamente no caso das falsas alegações de ‘armas de destruição em massa de Saddam’, que tão bem serviram à guerra de W. Bush.
Assim, sem nenhum fato, nenhuma prova, como num passe de mágica, de deplorável “tese trumpista”, o “vazamento de laboratório” passou a ser endossado pelo governo Biden e, depois dos devidos braços torcidos, até adotado por certos cientistas que dependem de generosas verbas para se manterem no negócio das pesquisas.
Na resposta à Covid-19, os EUA sempre colocaram a manobra política acima da prevenção da epidemia, tornando-se um propagador de variantes mais contagiosas após não conter o surto e ao esconder o verdadeiro número de casos confirmados de infecções e o número de mortos.
Ainda, Washington se engajou em uma campanha terrorista quanto ao rastreamento das origens, desde o uso do termo “vírus da China” até espalhar boatos e ameaçar cientistas.
Um jornalista norte-americano premiado com o Pulitzer, Michael Hiltzik, e que não aderiu à farsa, registrou em sua coluna no Los Angeles Times que “o que falta” na chamada “revisão” sobre a origem do novo coronavírus “é o fato básico”: “não há qualquer evidência” de uma suposta infecção pelo vírus em laboratórios chineses, nem para as “versões mais violentas, de que o vírus foi deliberadamente manipulado”. “Não houve e não há”.
FALSA EQUIVALÊNCIA
Hiltik também destacou a tentativa de criar uma falsa equivalência em termos de ciência da probabilidade de ocorrência entre a hipótese zoonótica [transmissão animal-humano] e a hipótese ‘laboratorial’.
Uma – como apontou -, ‘repetidamente comprovada pelos virologistas’, e outra, que depende de uma “conspiração e silêncio entre muitos cientistas participantes”.
Quanto ao frenesi sobre o “rastreamento do vírus”, ele lembrou que a primeira Covid (SARS) só teve a origem identificada com precisão 14 anos depois do surto; o vírus da Ebola, detectado há 45 anos, continua sem origem conhecida.