CARLOS LOPES
(HP 30/09/2003)
Tal como mencionamos na matéria anterior, em nossa garimpagem dos documentos das agências terroristas dos EUA encontra-se um amplo relato da CIA sobre o terrorismo que ela desencadeou no Irã, em 1953.
“Desde o fim de 1952 tornou-se claro que o governo de Mossadegh no Irã era incapaz de estabelecer um arranjo com os interesses petrolíferos dos países do Ocidente (Summary, pág. III). (….) Nenhum outro remédio pôde ser achado, senão o plano de uma operação encoberta. Especificamente, o objetivo era colocar no poder um governo que chegasse a um arranjo petrolífero” (pág. IV).
Ou seja, o negócio era se apropriar do petróleo do país, cuja nacionalização, pelo primeiro-ministro Mossadegh, ocorrera em 1951. A nacionalização havia sido feita contra companhias, sobretudo, inglesas. A própria imprensa americana, na época da nacionalização, não havia sido desfavorável: Mossadegh foi, até mesmo, escolhido “homem do ano” pela Time. Já que era contra os ingleses…
Porém, ao que se pode deduzir, a casta ianque percebeu logo que podia substituir seus “aliados” no roubo do petróleo iraniano, como ocorreu depois do golpe. É o que se pode depreender de observações, no documento da CIA, de que o xá do Irã – peça-chave a ser envolvida contra Mossadegh – tinha “medo patológico da ‘mão inglesa’”, logo, não podia saber que os ingleses estavam também por trás da trama. A partir daí, foi a CIA quem manipulou tudo – inclusive um traidor que os ingleses consideravam o seu principal agente no Irã, por estar muito próximo ao xá.
MONOPÓLIOS PRIVADOS
O imbricamento entre o Estado dos EUA e as grandes companhias – os monopólios privados – e seus magnatas, aliás, é transparente em todos os documentos. Mais exatamente, o que está cristalino neles é que o Estado dos EUA não é muito mais do que um comitê de capangas a serviço desses monopólios privados, a começar pela presidência e pelos ministérios. Em prol desses bucaneiros, os ramos do Estado – não somente a CIA – assassinam, mentem, fraudam e desencadeiam o terrorismo. A campanha pública contra o Irã foi deslanchada por Eisenhower e seu secretário de Estado, Foster Dulles, irmão do diretor da CIA, Allen Dulles, com discursos sobre como o país “estava prestes a cair atrás da Cortina de Ferro”. Eisenhower e Foster Dulles aprovaram a operação encoberta contra Mossadegh, junto com Churchill – aliás, o inventor da expressão “cortina de ferro” – que não fazia outra coisa senão entregar o petróleo aos seus mui amigos ianques.
Que havia uma trupe de parasitas ressentida com Mossadegh e sua política, ou seja, com o Irã e seu povo, é evidente: eram os cortesãos do xá, inclusive o próprio. Mas eles não tinham a menor condição de perpetrar um golpe de Estado. Seu esmagamento diante do resultado das eleições que consagraram Mossadegh era tal que nem mesmo se propunham a fazê-lo, como, aliás, a CIA reconhece.
ATAQUE À CASA DE MOSSADEGH
Tudo foi forjado de fora. Mesmo o ato final – o ataque à casa de Mossadegh – foi realizado por meia dúzia de marginais e membros da guarda do xá, comandados diretamente pela CIA, enquanto a maioria esmagadora das forças armadas ficava paralisada ante o terrorismo e a propaganda confeccionada nos EUA (“um considerável número de artigos anti-Mossadegh foi escrito pelo grupo [de “guerra psicológica”, estabelecido em Langley, sede da CIA], enquanto o Grupo de Arte da CIA recebia constante orientação em sua preparação de um grande número de cartoons e cartazes anti-Mossadegh. Além disso, esses artistas fizeram um efetivo desenho de um cartaz para muros, mostrando Zahedi sendo apresentado ao povo iraniano pelo xá. Os escritos e materiais ilustrados rapidamente acumularam-se em pilhas e, em 19 julho, um correio especial levou-os a Teerã” – pág. 20).
Zahedi era o traidor escolhido para ser colocado no lugar de Mossadegh. Quando a operação (denominada “Ajax”) foi planejada, a CIA nem contato com ele tinha. Sabia apenas que era um corrupto ressentido por sua demissão do Ministério da Guerra. Depois que os agentes da CIA contataram com ele, “tornou-se visível que faltava a Zahedi decisão, energia e planos concretos. Eles [os agentes] concluíram que ele devia ser controlado de perto e que os necessários planos deviam ser feitos para ele”.
Quando Mossadegh convocou um plebiscito para dissolver o parlamento e convocar novas eleições, “isso forneceu um assunto no qual Mossadegh podia ser atacado sem trégua pela imprensa de oposição subsidiada pela CIA”. A imprensa da CIA, segundo o documento, eram “20 jornais locais. Durante o plebiscito, 15 dos cartoons preparados no quartel-general apareceram nesses jornais (….) a imprensa controlada estava indo toda contra Mossadegh, enquanto, sob a direção da equipe local, estava publicando material que a equipe julgava de utilidade”.
RACISMO DA CIA
A acusação era a de que Mossadegh pretendia implantar uma ditadura, fechando o parlamento. No entanto, apesar da campanha da CIA, a proposta de Mossadegh obteve dois milhões de votos, contra algumas centenas. Mossadegh não implantou ditadura alguma. Quem o fez e fechou o parlamento foram os esbirros da CIA, após o golpe.
O que transparece, também, nesse documento da CIA, é o racismo. Os criminosos se julgam o tempo todo, ao modo dos nazistas, uma raça superior, embora não usem o termo. Mas, segundo eles, “é reconhecida a incapacidade dos iranianos de planejar ou agir de uma maneira inteiramente lógica”. Menos do que o juízo (?) sobre os iranianos como irracionais, o que transparece aí é que eles, esse bando de assassinos, julga que age de maneira inteiramente lógica, e que são os únicos com essa “capacidade” – que, aliás, se fosse verdadeira, nada teria de humana. Ao mesmo tempo, quanto aos outros, acham que só há uma maneira de agirem que é “inteiramente lógica”: se submeter inteiramente a eles. Negócio de psicopatas, cuja “lógica” é apenas a alucinada, irracional e estúpida fantasia de que todos devem se submeter a eles. Nada mais além disso.
BOMBAS CONTRA AIATOLÁS
“Os agentes da CIA deram séria atenção em alarmar os líderes religiosos de Teerã despejando ‘propaganda negra´ [isto é, falsa] em nome do Partido Comunista [Tudeh], ameaçando esses líderes com selvagem punição se fizessem oposição a Mossadegh. Chamadas telefônicas ameaçadoras eram também feitas para eles em nome do Partido Comunista, e uma das várias fraudes planejadas, de atacar com bombas as casas desses líderes, foi levado a efeito” (Parte V, pág. 37).
Somente para “comprar a cooperação de membros do parlamento iraniano” (Parte IV, págs. 18 e 19) , foi alocada a verba de um milhão em moeda do país (riais). Para as despesas iniciais da “estação da CIA” no Irã, foram destinados 1 milhão de dólares. Ás vésperas do golpe, Zahedi e outros traidores receberam diretamente em sua conta US$ 50 mil, quantia que representava, ao valor do dólar em 1953, magnitude muito maior do que hoje, e a promessa de US$ 5 milhões “para o tesouro do país”, quantia que foi paga dois dias após o golpe.