“Limitar ou obstruir de forma repentina a utilização desse produto financeiro importante comprometerá as vendas e a própria atividade do comércio e dos serviços, prejudicando a capacidade de pagamento dos consumidores e desaquecendo a economia”, diz CNC
Quase 90% do comércio varejista brasileiro tem suas vendas parceladas sem juros no cartão de crédito, aponta uma pesquisa inédita da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), divulgado na última segunda-feira (2), que foi realizada em todas as unidades federativas, com 6 mil empresas de todos os segmentos e portes do varejo.
Esse estudo foi entregue ao Ministério da Fazenda, no dia 28 de setembro, em defesa da manutenção do parcelamento sem juros no cartão de crédito. “A pesquisa mostra a relevância do parcelamento nas vendas do comércio e a consolidação do cartão de crédito como um condicionante do consumo nos últimos anos”, afirma o presidente da CNC, José Roberto Tadros.
Para Roberto Tadros, “é necessário encontrar uma solução para racionalizar as taxas de juros exorbitantes, que chegam a impressionantes 440% ao ano”.
Segundo o levantamento, do total de estabelecimentos do comércio varejista, 47% (1.064 milhão de empresas) tem metade do faturamento dependente das vendas parceladas, o que representa R$ 1.493 bilhão.
No documento entregue à Fazenda, a CNC também afirma que “os bancos consideram que limitar os juros no rotativo pode reduzir a oferta de crédito, especialmente aos mais pobres. Como alternativa, sugerem o fim do parcelamento sem juros, com o argumento de que não participam da análise de crédito do cliente, mas assumem o risco final da operação. A CNC defende o parcelado sem juros, porque comércio e serviços têm grande dependência dessa forma de pagamento nas vendas”.
A CNC destaca, ainda, que “o consumidor tem como necessidade e cultura parcelar as compras no cartão, meio de pagamento usado como instrumento para fidelização dos clientes pelo grande varejo. Com isso, limitar ou obstruir de forma repentina a utilização desse produto financeiro importante comprometerá as vendas e a própria atividade do comércio e dos serviços, prejudicando a capacidade de pagamento dos consumidores e desaquecendo a economia. “Estaríamos intervindo nas condições livres que o lojista pode oferecer aos clientes, e pelas quais os estabelecimentos já arcam com juros para antecipar parcelas do cartão (antecipação de recebíveis)”.
Oposto a limitar a cobrança de juros altos no Brasil, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, propôs o fim do parcelamento sem juros no cartão, em meados de agosto deste ano, em audiência promovida pelo Senado Federal. Desde então, a medida, que se efetivaria por meio do aumento de tarifas cobradas na modalidade, vem sendo fortemente rechaçada pelo comércio, bares e restaurantes, além de economistas.
Ocorre que, na prática, a restrição do parcelado sem juros do cartão derrubaria a já baixa demanda de bens de consumo no país, o que agravaria ainda mais as dificuldades financeiras que as empresas vêm enfrentando nos últimos tempos – por conta da própria política contracionista econômica imposta pelo BC “independente”, por meio da manutenção da taxa básica de juros (Selic) em níveis elevados.
No contexto do endividamento e da inadimplência, o cartão de crédito – com seus juros extorsivos – é o principal vilão das dívidas. Segundo outra pesquisa da CNC, 30% dos brasileiros estavam inadimplentes em agosto deste ano. Já o contingente de endividados chegou a 77,4% no período.
Diante do arrocho salarial no país na última década, o cartão de crédito se tornou uma válvula de escape para os trabalhadores, principalmente os de mais baixa renda e também para classe média poder consumir, não só dos produtos de médios ou de altos custos, mas para a alimentação e cobrir até outras despesas do dia a dia.
Neste ambiente, também aproveitando-se do ciclo de elevação da Selic, que culminou em uma taxa de 13,75% ao ano em agosto de 2022, ficando fixada assim até agosto deste ano, foi que os bancos e instituições financeiras não se pouparam de empurrar para os consumidores os seus cartões. Estas instituições emitiram quase 200 milhões de cartões no ano passado, o que é quase o dobro da população economicamente ativa do país.