LEONARDO WEXELL SEVERO/Hora do Povo-ComunicaSul*
O atual candidato do governo ao segundo turno das eleições presidenciais da Colômbia, Rodolfo Hernández, anunciou esta semana que, para o país sair da crise em que se vê mergulhado, se faz necessário “ampliar a jornada de trabalho para 10 horas e reduzir o horário e do almoço para meia hora”. De acordo com o magnata, seria “bom que as pessoas fossem trabalhar às seis da manhã e saíssem entre quatro e cinco da tarde”.
Questionado sobre como isso seria possível, principalmente em grandes centros urbanos, o declarado admirador de Adolf Hitler resumiu sua fórmula: o que se precisa “fazer é acordar às 4 da manhã”.
Hernández disse que isso “não vai aumentar os congestionamentos” e ainda contribuirá para aumentar a produtividade. “Temos que fazer isso: meia hora para o almoço seria suficiente”, acrescentou o autoproclamado candidato da “Liga Anticorrupção”, frisando que quem quiser fazer uma refeição mais tranquila o faça nos finais-de-semana.
“Jornada de 10 horas é a volta do capitalismo selvagem”, denuncia Gustavo Petro
“A jornada de trabalho de 10 horas nada mais é do que a exploração do trabalhador, como se fazia no século XIX, época do capitalismo selvagem. A luta pela jornada de oito horas durou um século, não vamos deixar o país retroceder”, rebateu de imediato o oposicionista Gustavo Petro, candidato da coalizão Pacto Histórico, para quem Hernández quer levar o povo a uma “nova escravidão”. Nas redes sociais a repulsa ao magnata foi unânime: “indigno e ignorante”, “escravidão e fome”, “mais horas de trabalho não são sinônimo de produtividade”.
Oficialmente, a jornada de trabalho na Colômbia é de oito horas por dia e 48 horas por semana, mas após intensa pressão popular, um projeto de lei recentemente aprovado no Congresso a reduziu para 42 horas até 2026. A medida será aplicada paulatinamente: uma hora em 2023, outra em 2024, duas em 2025 e, finalmente, duas em 2026.
MAIS MENTIRAS
Diante da onda de rejeição suscitada pela sua proposta de governo, da mesma forma que voltou atrás quando falou que havia se confundido ao homenagear Hitler quando queria dizer Einstein, Rodolfo Hernández disse que não era para os colombianos trabalharem tanto, mas somente ele e sua equipe.
Desde que teve o seu candidato oficial Fico Gutiérrez escanteado para a terceira posição, o presidente Iván Duque e o ex-presidente Manuel Uribe (2002-2010) – do terrorismo de Estado do Plano Colômbia e da implantação das bases militares estadunidenses – passaram a apostar todas as suas fichas no ex-prefeito de Bucaramanga, capital de Santander. Ele é processado por desvio de recursos públicos pela concessão da coleta de lixo da cidade à Vitalogic RSU, empresa que construiria uma usina de transformação de resíduos sólidos em energia elétrica. Casualmente, a mesma em que trabalha seu filho Luis Carlos Hernández. Neste exato período, entre 2016 e 2017, a esposa do então prefeito, Socorro Oliveros de Hernández, comprou duas propriedades na Flórida, nos Estados Unidos, por um total de um milhão de dólares (3,76 milhões em valores atualizados).
Para a manipulação de uma parcela expressiva da opinião pública como “bom velhinho”, o ricaço conta com o apoio do monopólio midiático de jornais, rádios e canais de televisão construído ao longo de décadas de luta contra as forças nacionais e democráticas, com toda a parafernália tecnológica proporcionada pelo controle da internet e de técnicos dos EUA.
“CONFISSÕES”
“As declarações de Hernández soaram como confissões de que aumentaria a sobrecarga a que já vem sendo submetidos os trabalhadores, agravando ainda mais seus problemas de saúde e reduzindo o tempo de convivência familiar”, condenou German Patiño, presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores e Empregados da Educação. O fato, ressaltou, “é que além de morarmos em locais distantes nos grandes centros, no interior vivemos em zonas de difícil acesso, onde enfrentamos a precariedade de estradas e a presença de bandos à margem da lei, principalmente à noite, na volta pra casa”. Isso aumenta o custo do transporte de cerca de dois mil pesos (R$ 2,54) para nove ou até dez mil pesos (R$ 12,70), explicou.
Outro ponto que precisa ser esclarecido para o conjunto dos colombianos, revelou Patiño, é que enquanto foi prefeito de Bucamaranga, “não houve negociação coletiva com os servidores, a quem tratou muito mal, se caracterizando por atropelos e demissões, o que diminuiu o número de profissionais na rede e, consequentemente, dificultando o atendimento à população”. “Toda esta somatória de práticas contrárias ao interesse público, que apontam para uma ditadura, fez com que haja uma decepção crescente entre os próprios eleitores de Hernández. Informados sobre as reais intenções do seu candidato, eles estão avançando rumo ao Pacto Histórico”, comemorou.
Ao contrário do candidato do retrocesso, ressaltou Fabio Melo, presidente do Sindicato Distrital dos Empregados de Bogotá, o senador Gustavo Petro, que já foi prefeito da capital, tem uma proposta “muito interessante” para os serviços públicos, particularmente para o setor de saúde. Enfermeiro, Melo acredita é que “como o acesso será gratuito e de qualidade, haverá melhoria na qualidade das relações trabalhistas nas empresas públicas”.
A identidade de Hernández com o uribismo, assinalou, se dá em vários campos, como o da manutenção de contratos de 15 dias de médicos e enfermeiros, submetidos à “escravidão moderna, sem qualquer direito e a garantias mínimas”. “Os antecedentes são muito nefastos para a atenção e o atendimento às famílias mais vulneráveis. Dividiram os 22 hospitais de Bogotá em quatro, chamando os 18 que sobraram de sub-redes de serviços de saúde. Com isso, na prática, tiraram serviços da comunidade, porque faltam profissionais nestes centros especializados, pela distância, pelos custos e pela falta de comida. É algo realmente impactante”, explicou.
PRIVATIZAÇÃO
Tudo isso é consequência direta da Lei 100, do senador Álvaro Uribe, modelo de política neoliberal imposto por organismos externos para condicionar empréstimos internacionais. Na prática, é uma figura legal de monopolizar e comercializar a saúde na Colômbia. Foi desenvolvido durante o governo de César Gaviria (1990-1994) e lançado durante o governo de Ernesto Samper (1994-1998).
Com este eixo, as empresas sociais tiveram que passar a vender serviços, recordou Fabio Melo, enfatizando que o “problema radica no fundo e se agudiza a cada dia mais com a sobrecarga de trabalho, uma vez que há um crescente déficit de enfermeiras, médicos e especialistas”. “Tudo para enriquecer as chamadas Empresas Promotoras de Saúde (EPS), intermediários que captam o recurso do governo, embolsando o dinheiro que deveria servir para um atendimento de qualidade. É contra isso que lutamos”, apontou.
TRABALHADORES APOIAM PETRO
Diante do segundo turno das eleições presidenciais, que acontecem no próximo domingo (19), a Central Única dos Trabalhadores da Colômbia (CUT), maior entidade sindical do país, lançou uma nota expressando sua decisão de apoiar a campanha de Gustavo Petro e Francia Márquez.
“O programa de governo de Petro e Francia expressa as medidas necessárias e mais convenientes para defender a vida, a paz e a democracia e uma importante retificação das piores medidas do receituário neoliberal, bem como uma luta determinada contra a corrupção”, defendeu a CUT.
Para a entidade, o programa apresentado pelo Pacto Histórico “reivindica o papel do público nos direitos fundamentais em saúde e educação”. “Da mesma forma, clama por avanços no trabalho decente e nos direitos das mulheres, dos jovens, da diversidade sexual e étnica”, concluiu.
*Recentemente a Agência ComunicaSul – integrada pelo jornal Hora do Povo – esteve presente na Colômbia e retornará esta semana para cobrir o segundo turno das eleições presidenciais graças ao apoio das seguintes entidades: Associação dos/das Docentes da Universidade Federal de Lavras-MG, Federação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário Federal e do MPU (Fenajufe), Confederação Sindical dos Trabalhadores/as das Américas (CSA), Diálogos do Sul, Barão de Itararé, Portal Vermelho, Intersindical, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Sindicato dos Bancários do Piauí; Associação dos Professores do Ensino Oficial do Ceará (APEOC), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-Sul), Sindicato dos Bancários do Amapá, Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Sindicato dos Metalúrgicos de Betim-MG, Sindicato dos Correios de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores em Água, Resíduos e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp Sudeste Centro), Associação dos Professores Universitários da Bahia, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal do RS (Sintrajufe-RS), Sindicato dos Bancários de Santos e Região, Sindicato dos Químicos de Campinas, Osasco e Região, Sindicato dos Servidores de São Carlos, Sindicato dos Trabalhadores no Poder Judiciário Federal de Santa Catarina (Sintrajusc); mandato popular do vereador Werner Rempel (Santa Maria-RS), Agência Sindical, Correio da Cidadania, Agência Saiba Mais, Revista Fórum e centenas de contribuições individuais.