“Todos nós temos um certo grau de responsabilidade pela existência de dois candidatos de direita”, lamentou Andrónico Rodríguez, presidente do Senado, candidato presidencial pela Aliança Popular , que não chegou ao segundo turno
Com 98,2% das urnas apuradas, o Sistema de Resultados Preliminares da Bolívia anunciou a eleição presidencial do neoliberal Rodrigo Paz Pereira, senador do Partido Democrata Cristão, com 54,3% dos votos, contra 45% do ultradireitista Tuto Quiroga, ex-vice do ex-ditador Hugo Banzer (1997-2001) e ex-presidente (2001-2002).
Paz venceu em seis dos nove departamentos da Bolívia, país de 11,3 milhões de habitantes , confirmando o favoritismo da centro-direita na votação do primeiro turno, em 17 de agosto, onde obteve 32,44% dos votos.
“Todos nós temos um certo grau de responsabilidade pela existência de dois candidatos de direita”, afirmou Andrónico Rodríguez, presidente do Senado, líder cocaleiro e candidato presidencial pela Aliança Popular – uma das dissidências do Movimento Ao Socialismo (MAS) no primeiro turno, depois da campanha pelo voto nulo de Evo Morales.
Andrónico conclamou a todos os setores da esquerda para que assumam a responsabilidade da eleição presidencial ter sido decidida entre dois candidatos entreguistas, que têm por objetivo repassar as riquezas do povo boliviano às transnacionais.
Obtendo apenas 8,5% dos votos, com presença mínima na Câmara dos Deputados, Andrónico acredita que é necessário compartilhar os erros: “Tentamos nos unir, mas não conseguimos; de repente, tomamos decisões muito precipitadas por falta de tempo, e elas não foram compreendidas”.
“GUERRA POLÍTICA INTERNA DO MAS”
O ex-vice-presidente Álvaro Garcia Linera também responsabilizou a a “guerra política interna” no MAS pela fragorosa derrota. A organização dirigiu por duas décadas a transformação da Bolívia em uma pátria plurinacional, incorporou os indígenas à cidadania, nacionalizou o gás e o petróleo, triplicou o PIB e reduziu drasticamente a pobreza, mas se apequenou nesta disputa que abriu espaço para o entreguismo.
Ainda segundo Garcia Linera, faltou à esquerda e às forças nacionais – e não só na Bolívia – um projeto que fosse além do redistributivismo graças ao crescimento das commodities, e avançasse para o estabelecimento de uma base produtiva, capaz de sustentar as conquistas sociais.
“O resultado final desse fratricídio miserável é a derrota temporária de um projeto histórico e, como sempre, o sofrimento dos humildes, que nunca foram levados em conta pelos dois irmãos intoxicados por estratégias pessoais”, denunciou Linera.
O entreguismo de Tuto Quiroga era ainda mais explícito. Havia prometido romper os contratos assinados com a empresa russa Uranium One para a construção de uma usina com capacidade de extração de 14 mil toneladas por ano e, também, o acordo assinado com a subsidiária da chinesa CATL — a maior produtora mundial de baterias – para a instalação de duas unidades de produção, totalizando 35 mil toneladas.
O trágico resultado eleitoral coloca a Bolívia de volta às garras do neoliberalismo, agravado em maior ou menor grau, com chamados insistentes aos corte de gastos sociais e à reaproximação à órbita de Washington. No ano passado, a Bolívia havia sido acolhida como parceira dos BRICS.