“Em minha primeira reunião com o presidente, o que ele queria saber era sobre o poder de defesa das nossas Forças Armadas”. “O presidente tem a visão clara do peso estratégico do Brasil no mundo”, acrescentou Marcos Sampaio Olsen
O comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, afirmou neste domingo (03), no programa Canal Livre, da Rede Bandeirantes, que “a visão geoestratégica do presidente Lula é admirável”. Ele lembrou que na primeira conversa com o presidente haviam muitos assuntos que a mídia colocava no centro naquele momento, mas o que ele quis discutir foi capacidade de defesa e a necessidade de reaparelhar as forças”, disse.
DESAPARELHAMENTO
“Nos últimos 20 anos a Marinha desmobilizou 50% do seu poder naval. Até 2028 haverá mais 40% de baixas”, afirmou o almirante. Ele defendeu o fortalecimento da indústria naval. “De 2014 para cá nós perdemos, na construção naval, 60 mil empregos. A construção naval se caracteriza por uso intensivo de mão de obras, uma larga escala logística, tem mão de obra qualificada e é um setor estratégico para o Estado”, argumentou. “Eu não entendo apenas como construção naval, é indústria naval e o Estado tem que proteger isso”, acrescentou.
Um dos temas tratados no programa foi o de submarinos, inclusive o de propulsão nuclear. “Sete países detém a tecnologia nuclear e o Brasil está entre eles”, destacou o almirante. “Esta é uma área em que a tecnologia é de ponta, está no fronteira do conhecimento e é também uma área em que os estados se negam a transferir tecnologia. Não há transferência de tecnologias em áreas sensíveis”, afirmou o comandante da marinha.
ENERGIA NUCLEAR
“O Brasil é um Estado vocacionado para o desenvolvimento e uso da energia nuclear. Nós temos reservas de urânio em 25% do território explorado. Nós já somos a sexta reserva de urânio do mundo. E há benefícios para além da área de defesa. São benefícios para a sociedade que eu reputo como relevantes. Na área da medicina nuclear. Existe um projeto de um reator multipropósito que pretende a fabricação de radioisótopos, a fabricação de radiofármacos e isso permitiria ao SUS ampliar a sua capacidade de atendimento de diagnóstico e tratamento de câncer”, prosseguiu o almirante Olsen.
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Ele falou também no uso da tecnologia nuclear na indústria e na agricultura. “Podemos irradiar alimentos e aumentar a vida útil desses alimentos e alcançar mercados substanciais, para além da matriz energética, que hoje, com Angra 1 e Angra 2 representa 2% da matriz energética brasileira. Podemos desenvolver reatores modulares de pequeno porte, capazes de fornecer sem gasto da transmissão dessa energia em localidades e ainda, com o calor residual, fazer a osmose da água”, defendeu.
SUBMARINO NUCLEAR
“O submarino nuclear brasileiro será lançado ao mar em 2034. O projeto é brasileiro. A autoridade de projeto é brasileira. A parceria estratégica estabelecida em 2008 foi um ato de coragem. O projeto tem por objetivo precípuo a obtenção de um submarino de propulsão nuclear. Os quatro submarinos convencionais já em construção permitirão a capacitação tecnológica do processo construtivo”, prosseguiu o militar.
Ele falou dos dois primeiros submarinos já entregues e dos próximos passos. “O terceiro será lançado ao mar em março deste ano e o quarto em 2026”, informou. “Os submarinos têm autonomia de 90 dias e são importantes por sua capacidade de dissuasão. Inibir a ameaça antes que ela se constitua. O emprego de um submarino, dada a sua furtividade e discrição, obriga a força adversa a empregar meios para promover a proteção do seu corpo principal e às vezes inviabiliza o seu emprego pelas simples ameaça do submarino”, disse Olsen.
PODER DE DISSUASÃO
Ainda sobre as vantagens de se ter submarinos, o almirante disse que “ele não precisa necessariamente estar na cena de ação”. “O próprio fato do país ter a possibilidade de empregar já é motivo suficiente para obrigar que se tire meios de outras áreas para reforçar uma eventual operação adversa. Por isso, o custo benefício de operar um submarino, mesmo convencional, é positivo”, apontou.
“A vantagem do submarino nuclear”, disse ele, “é a taxa de discrição. Hoje a superfície da terra é vigiada 24 horas por dia, sete dias por semana. Então, ter meios furtivos é condição para que se empregue uma força de maneira efetiva. A independência em relação à atmosfera é irrestrita. A limitação reside no psico social da tripulação e a marinha se prepara para enfrentar essas questões”, prosseguiu o comandante. “Submarino nuclear é o maior ativo de defesa que um país pode se dotar. Ele tem maior capacidade de inibir iniciativas contrárias aos interesses do Estado. Temos que monitorar 7,5 milhões do km2 com uma ação de presença. Com velocidade maior o submarino de propulsão nuclear permite maior cobertura”, afirmou Olsen.
VISÃO ESTRATÉGICA
“Eu reafirmo que a decisão corajosa de 2008, com uma visão estratégica de Brasil. E eu entendo perfeitamente condizente com a estatura estratégica do país”, acrescentou. “O programa de desenvolvimento de submarinos conjugado com o programa nuclear da Marinha, que pretende a obtenção de um submarino com propulsão nuclear tem um arrasto tecnológico absolutamente formidável”, defendeu o militar.
“Nós temos nesses projetos a criação de empregos, são 23 mil empregos diretos, 40 mil empregos indiretos, a participação de 23 universidades, 700 empresas, então é uma injeção de recursos na base industrial significante”, argumentou o almirante. “Há uma visão míope de que o produto de defesa se presta à destruição e que, portanto um país que comungue da solução pacífica de controvérsias ou que não perceba exatamente as ameaças pode prescindir. A questão no Brasil evidentemente não é essa”, acrescentou.
Depois de falar sobre as investigações de eventuais participantes de militares em articulações golpistas, o almirante disse que o presidente Lula se mostra absolutamente confiante nas forças. “E muito reconhecido também pelo papel que as forças cumpriram ao longo de 2023”. “Não há na força preocupação com o contexto político. Não há qualquer insatisfação dentro do efetivo da Marinha com a condução política”, destacou.
IMAGEM ATINGIDA
Sobre o período do governo Bolsonaro, ele criticou as tentativas de manipulação das FFAA. “Eu considero que a imagem da força foi atingida. Em termos de politização das forças é preciso entender que a força capta o seu pessoas no seio da sociedade e nós vivemos no segundo semestre de 2022 um país absolutamente polarizado, não só profissionalmente mas em diversos grupos de relacionamento nós tivemos essa polarização refletida”, argumentou.
Ele citou o ministro da Defesa, José Múcio, ao falar dessas repercussões. “Ele analisou que no dia 9 de janeiro, havia por parte do governo uma suspeita de que as FFAA pudessem estar envolvidas nas ações golpistas e, por parte da oposição, uma avaliação que as FFAA tinham se acovardado e traído as intenções golpistas do presidente”, disse Olsen.
O almirante criticou a análise dos que acham que o artigo 142 da Constituição cria a condição de poder moderador para as FFAA. Também criticou os que acham que a GLO possa constituir ameaça ao Estado democrático de Direito. “Convivemos com operações de GLO em portos e aeroportos e,c se os resultados são acanhados, pelo menos os esforços são grandes. Nos portos fizemos 30 mil abordagens feitas nesses 3 meses, 5 mil vistorias de carga com resultados. A atuação das FFAA vieram se somar aos órgãos federais que têm a competência para isso”, argumentou.
VINCULAÇÃO DE VERBAS AO PIB
O almirante defendeu a vinculação das verbas para defesa ao crescimento do PIB. “Não existe a vinculação. A área econômica é contra. Argumenta que engessa o orçamento. Mas nós dizemos que não se pode considerar um produto de defesa como uma mercadoria qualquer. Produzir um míssil é diferente de fabricar sapato”, disse o comandante.
“O Brasil desenvolveu um míssil de superfície exitoso, na última semana nós fizemos um lançamento com acerto. Com uma tecnologia complexa, vários subsistemas, fizemos lançamentos para validar. É admirável, chama-se Mansup, com tecnologia nacional”. Projetos como este não podem ser interrompidos”, completou o comandante, agradecendo a oportunidade dada pela Band para que ele pudesse discutir assuntos tão importantes para o Brasil.