O boletim número 3 do Comitê Científico do Consórcio do Nordeste, divulgado na noite de quinta-feira (9), alerta que o relaxamento da quarentena no país pode trazer graves problemas para a população diante do coronavírus.
“Não há justificativa alguma para qualquer tipo de relaxamento no distanciamento social”, adverte o comitê.
Os cientistas nordestinos também enfatizam que “não existe nenhum embasamento científico ou clínico que justifique o uso da hidroxicloroquina no tratamento de pacientes em qualquer fase da infecção produzida pelo coronavírus” e que a quarentena é o melhor meio para combater a Covid-19.
O Comitê Científico do Nordeste foi lançado pelos governadores nordestinos no dia 30 de março. Ele é coordenado pelos cientistas Miguel Nicolelis (neurocientista) e Sérgio Rezende, ex-ministro de Ciência e Tecnologia.
Os dados mais recentes, com base nas secretarias estaduais, mostram que a região tem 3.518 casos de coronavírus, com 182 óbitos. 210 cidades nordestinas apresentam casos confirmados da Covid-19.
Segundo o Ministério da Saúde, até as 16:30h da sexta-feira (10), no Brasil são 1.056 mortes e 19.638 casos confirmados. Nas últimas 24 horas foram 115 mortes, um aumento de 12% sobre o dia anterior.
Leia o boletim na íntegra:
Boletim 03 – Comitê Científico do Consórcio Nordeste
Nordeste, 09 de abril de 2020
Flexibilização de distanciamento social pode gerar
tragédia humana sem precedentes no Brasil
O Comitê Científico do Consórcio Nordeste para o COVID-19, integrado por representantes de todos Estados da região e assessorados por cientistas e médicos de outras regiões do país e do exterior, está estudando todos aspectos da pandemia através de 9 subcomitês. As recomendações de hoje são:
1 – Distanciamento social
As determinações de distanciamento social e medidas restritivas correlatas são, no momento, as medidas mais eficientes de combate à pandemia e o relaxamento do distanciamento social amplo.
Assim sendo, o Comitê Científico do Consórcio do Nordeste ratifica nos mais fortes termos e sem hesitação que, baseados em todas evidências disponíveis no Brasil e em todo mundo, não há justificativa alguma para qualquer tipo de relaxamento no distanciamento social. Reafirma, portanto, que qualquer flexibilização agora vai gerar tragédia humana sem precedentes no país.
Como resultado da medida, o isolamento social reduziu a velocidade de contaminação por coronavírus em Fortaleza e no Estado do Ceará. Estudo realizado pelo Grupo de Sistemas Complexos, do Departamento de Física, da Universidade Federal do Ceará (UFC), com apoio da Secretaria de Saúde do Estado (SESA-CE) e da Vigilância Epidemiológica da Prefeitura de Fortaleza, concluiu que em 24 de março Fortaleza registrava 542, e o estado do Ceará, na mesma data, 607. Sem o isolamento determinado pelo governo estadual o número seria 1.194 para a capital e 1.349 para o estado.
2 – Hidroxicloroquina
Em vista das notícias veiculadas na mídia e nas redes sociais, o Comitê Científico enfatiza que, neste momento, não existe nenhum embasamento científico ou clínico que justifique o uso da hidroxicloroquina no tratamento de pacientes em qualquer fase da infecção produzida pelo coronavírus.
Artigos publicados nos últimos dias em diversas revistas científicas de grande relevância, corroboram esta compreensão e indicam os graves riscos, inclusive de morte súbita, que o uso indiscriminado deste medicamento pode acarretar.
Em meio a uma pandemia, não se justifica aumentar ainda mais o risco a que estão submetidos pacientes infectados, com a possibilidade de submetê-los a graves efeitos colaterais de uma droga que não foi devidamente testada neste tipo de infecção.
O artigo muito apresentado pelo governo Trump com justificativa para a defesa da hidroxicloroquina como tratamento para a infecção pelo novo coronavírus recebeu uma declaração de preocupação da sociedade que publica o periódico em questão trabalho foi publicado.
No dia 3 de abril de 2020, o International Journal of Antimicrobial Agents afirmou que o artigo de 20 de março, “Hidroxicloroquina e azitromicina como tratamento de Covid-19: resultados de um ensaio clínico não randomizado de rótulo aberto” não atende ao padrão esperado da [Sociedade Internacional de Quimioterapia Antimicrobiana], especialmente relacionado à falta de melhores explicações sobre os critérios de inclusão e à triagem de pacientes para garantir a segurança do paciente. [1].
Uma equipe da Universidade de Paris e do Hospital Saint-Louis, também na capital francesa, avaliaram 11 pacientes consecutivos internados com o mesmo curso de tratamento que o grupo criticado. Um paciente morreu (e outros dois foram para a UTI) e, dos dez sobreviventes, 8 ainda eram positivos para o vírus 5/6 dias após o tratamento. Um paciente teve que interromper a terapia no dia 4 por causa do prolongamento do intervalo QT, efeito colateral conhecido da hidroxicloroquina que pode levar à arritmia cardíaca fatal.
Outro ponto potencialmente importante e levantado na toxicologia de ratos relata interação com metformina, com cerca de 30% de mortalidade. Se isso se traduzir em seres humanos, pode ser uma má notícia, porque os diabéticos parecem um grupo de alto risco e muitos pacientes podem estar tomando metformina quando se apresentam no hospital. [2]
Os resultados com a Hidroxicloroquina são tão erráticos que há hospital deixando de usar HcQ.
1 https://blogs.sciencemag.org/pipeline/archives/2020/04/06/hydroxychloroquine-update-forapril-6
2 https://retractionwatch.com/2020/04/06/hydroxychlorine-covid-19-study-did-not-meetpublishing-societys-expected-standard/
3 – Monitora Covid-19
Foi lançado nesta quinta-feira, 9, o app Monitora Covid-19, aplicativo ratificado por este comitê e desenvolvido por instituições privadas, em parceria com o Consórcio Nordeste, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação da Bahia (Secti), a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB) e a Fundação Estatal Saúde da Família (Fesf-SUS/FESF-tech).
A ferramenta pode ser baixada gratuitamente no Google Play, marca que detém 92% do mercado de aplicativo das plataformas Android, e será uma das principais ferramentas no combate da pandemia da região. A expectativa é que o Monitora Covid-19 esteja também disponível na Apple Store nos próximos dias.
O Monitora Covid-19 será viabilizado progressivamente pelo Consórcio Nordeste para os 57 milhões de habitantes dos nove estados que compõe o grupo e visa suprir falta de testes no mercado, evitar aglomerações em hospitais, orientar recursos médicos para cada localidade, além de garantir a fiscalização adequada do distanciamento social em locais com índices elevados de contaminação.
Os dados vão gerar informações e mapas sobre como a pandemia desloca-se no território, locais que possam ter contaminação mesmo sem que haja testes confirmando pessoas com covid19, tempo de quarentena, dentre outras informações que servirão de base para tomada de decisões em saúde pública e de atendimento.
Busque MonitoraCorona em https://play.google.com/store/apps/details?id=br.com.novetech.monitoracorona e baixe o app.
4 – Site do Comitê Científico
Entrou no ar também nesta quinta-feira, 9, o site operacional do Comitê Científico do Consórcio Nordeste https://www.comitecientifico-ne.com.br/. O espaço irá reunir toda a produção do grupo que orienta as decisões de combate à pandemia mundial de coronavírus a partir do conhecimento científico.
Em uma área virtual do site há espaço para organizar colaborações com pesquisadores e redes de cientistas do Brasil e do exterior. Em votação no Twitter, a funcionalidade, que será um verdadeiro “instituto virtual de pesquisa” ganhou o nome de Projeto Mandacaru e terá como trilha sonora O Xote da Meninas, de Luiz Gonzaga. Até sua completa estruturação, as colaborações para o projeto podem ser enviadas para o endereço eletrônico: nicolelis@isd.org.br
Comitê Científico do Nordeste
Coordenação Miguel Nicolelis e Sérgio Rezende.
Membros: Adélia Carvalho de Melo Pinheiro (BA); Antônio Silva Lima Neto (CE); José Noronha (PI); Ricardo Valentim (RN); Luiz Cláudio Arraes de Alencar (PE); Sinval Brandão Filho (PE); Marco Aurélio Góes (SE) Marcos Pacheco (MA); Maurício Lima Barreto (BA); Priscilla Karen de Oliveira Sá (PB); Roberto Badaró (BA); e Fábio Guedes Gomes (AL).