A revelação é do Estadão. O primeiro estojo, com bens avaliados em R$ 16,5 milhões, foi retido pela Receita Federal
Nova revelação publicada pelo Estadão informa que Jair Bolsonaro chegou a receber, em mãos, um segundo pacote de joias oriundo da Arábia Saudita que chegou ao país através da comitiva do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque.
Constavam nesse estojo um relógio com pulseira em couro, um par de abotoaduras, caneta rosa gol, anel e um masbaha (uma espécie de rosário islâmico) rose gold, todos da marca suíça Chopard. Segundo o site da loja, o valor integral de peças similares chega a algo em torno de R$ 400 mil.
O próprio ajudante de ordens de Bolsonaro, conhecido como o “faz-tudo”, tenente-coronel Mauro Cid, confirmou que as peças se encontram no “acervo privado” de Bolsonaro, o que configura uma ilegalidade, pois a entrada desses bens teria que estar condicionada à declaração à Receita Federal, o que não foi feito.
Cid disse a aliados que Bolsonaro tem um acervo tanto no Palácio do Planalto quanto no Alvorada em que tudo o que ganhava iria para esses dois locais.
Revelou que o estojo com o relógio e outros itens foram colocados nos caminhões de mudanças quando Bolsonaro saiu da Presidência. Que foram embalados nesses acervos e que foram levados para outro lugar — sem especificar qual lugar. Segundo ele, tudo isso está catalogado, e o “relógio também está catalogado nesse meio”.
Segundo o blog de Andréia Sadi, no G1, Cid diz que o relógio do segundo pacote estaria catalogado “igual qualquer outro bem que ele recebeu”, como uma caneta, tênis, uma Bíblia ou um chapéu.
E que o relógio estaria com Bolsonaro “igual a outros presentes”, que Bolsonaro teria 200 metros cúbicos de presentes.
O documento com a relação de itens declarados por Bolsonaro como pessoais quando deixou a presidência foi requisitado e já está com a Polícia Federal.
O Tribunal de Contas da União (TCU) já firmou jurisprudência sobre o assunto segundo a qual os presidentes só podem se apoderar de lembranças de “caráter personalíssimo”, como roupas, perfumes ou algo similar.
O Estadão revelou documentos oficiais que comprovam que o pacote foi entregue no Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente da República. O funcionário Rodrigo Carlos dos Santos recebeu as referidas joias no dia 29 de novembro de 2022, precisamente às 15h50. Há, ainda, a informação de que a Documentação Histórica do Palácio do Planalto indica que as preciosidades foram visualizadas por Bolsonaro.
Até então, outro estojo com diamantes, encontrava-se guardado nos cofres do Ministério de Minas e Energia, tendo chegado ao Brasil pelo ministro Bento Albuquerque em outubro de 2021, bens que também não foram declarados oficialmente, o que contraria a legislação vigente.
Os diamantes vieram no mesmo voo em que se encontrava o assessor do ministro que trouxe, escondido em sua mochila, ilegalmente, outro estojo da marca Chopard, contendo um colar, um par de brincos, relógio e anel estimados em 3 milhões de euros (R$ 16,5 milhões), peças que foram apreendidas pela Receita Federal.
Coincidentemente, no mesmo dia em que o ajudante de ordens emite um documento para tentar reaver as joias retidas em Guarulhos, 29 de novembro de 2022, no estertor do governo, o Ministério de Minas e Energia envia o estojo até então guardado em suas dependências ao Palácio do Planalto, onde fica o gabinete presidencial.
Se o que Albuquerque agora sustenta – que se tratava de um “presente” do governo saudita ao governo do Brasil, por que essas joias não foram antes declaradas e qual o motivo de terem ficado tanto tempo no Ministério e, depois, encaminhadas ao Planalto e não ao acervo público da Presidência?
São perguntas que o ex-ministro – que deixou a pasta em maio de 2022, seu sucessor e o próprio Bolsonaro terão que responder para esclarecer fatos tão nebulosos.
Uma nova determinação foi dada também no dia 29 de novembro de 2022 para que o pacote fosse encaminhado imediatamente para a residência oficial de Bolsonaro, o Palácio da Alvorada.
Todos esses documentos se chocam com a versão de Bolsonaro, que no último sábado (4), dos Estados Unidos, disse que não pediu nem recebeu qualquer tipo de presente em joias do governo da Arábia Saudita e que estaria sendo “crucificado” por uma imprensa “maldosa”.
Em sua versão ao Estadão, o ex-ministro disse que ele e sua comitiva estavam deixando a Arábia Saudita, quando um representante do governo saudita os encontrou no hotel e entregou dois pacotes. “Esses pacotes foram distribuídos nas malas. Uma ficou com o Marco Soeiro, a outra eu não sei com qual membro da comitiva”, disse, afirmando que não tinha conhecimento do conteúdo das caixas.
A alfândega reteve o conjunto de brilhantes avaliado em R$ 16,5 milhões que, como confirmou Albuquerque, era destinado à primeira-dama Michelle Bolsonaro.
No entanto, o segundo estojo passou e conseguiu driblar a fiscalização alfandegária, igualmente escondida na bagagem de outro integrante da comitiva, cuja identidade Albuquerque não se lembra.
O fato que contraria a versão do ex-ministro, evasivamente sustentada também por Bolsonaro, é que, pela legislação brasileira, presentes oficiais de qualquer país ao Brasil devem ser endereçados para resguardo histórico ao Palácio do Planalto, podendo ser destinados, também, ao Arquivo Nacional ou ao Museu da República.
Nada disso foi feito em relação aos bens que conseguiram passar pela alfândega, sendo que o governo, em relação aos que ficaram retidos, recusou-se a declará-los oficialmente para destinação ao patrimônio nacional, diante da teimosia de Bolsonaro de tentar incorporá-los ao seu patrimônio pessoal. Foram oito ao todo essas tentativas desde que as joias chegaram ao país.