STJ: culpado na 2ª instância não é inocente
O malandro não sabe a diferença entre político preso e preso político
O vídeo divulgado por Lula após a rejeição de seu pedido de habeas corpus preventivo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) é, rigorosamente, cínico.
A começar pelo trecho em que diz: “Se não provarem um real na minha conta, um dólar na minha conta, uma telha na minha conta que não seja minha, terei que ser considerado um preso político”.
Lula foi condenado a 12 anos e um mês por ter recebido propina, em troca de facilitar e abrigar a pilhagem de uma empreiteira – através de sobrepreços e superfaturamento – contra a maior realização do povo brasileiro após a Revolução de 1930, a Petrobrás.
Lula foi condenado duas vezes, por quatro juízes diferentes, por roubo (corrupção passiva) e ocultação de patrimônio (lavagem de dinheiro obtido ilicitamente) que obteve através do assalto à nossa maior empresa, a mais popular e mais estratégica, pertencente ao próprio povo brasileiro.
Resumindo, Lula foi condenado por roubar o país e o povo brasileiro.
Contra ele foi encontrado não um real ou um dólar ou uma telha, mas um apartamento de três andares – um triplex – à beira mar, no badalado balneário oceânico de Guarujá, São Paulo.
As provas foram absolutamente copiosas – e, com o julgamento em segunda instância sendo transmitido pela TV e por rádio, todos ouviram o longo desfiar das provas, durante horas.
Essas provas foram tão cabais, que Lula e sua defesa nem tentaram desmenti-las. Preferiram se concentrar em preliminares ridículas, eludir o conteúdo do que estava em causa, e, simplesmente, dizer – como ele repete agora – que não existe aquilo que todos estão vendo que existe.
E esse é apenas o primeiro processo.
Há cinco outros, com sítio, apartamento e o escambau, ainda para serem julgados. E nem falemos nos US$ 14.400.000 (quatorze milhões e 400 mil dólares) que ele recebeu por palestras absolutamente pneumáticas (ou seja, cheias de ar), sendo US$ 6.000.000 (seis milhões de dólares) das empreiteiras agarradas na Operação Lava Jato.
Em suma, se for preso, Lula jamais vai ser um “preso político”, assim como Eduardo Cunha, preso em Curitiba, não é um preso político; assim como Geddel Vieira Lima, preso em Curitiba, não é um preso político; assim como Sérgio Cabral, preso em Curitiba, não é um preso político.
Todos, Lula, Cunha, Geddel, Cabral, são ladrões do dinheiro público e da propriedade pública. Não são presos políticos.
Que Lula pretenda se elevar à condição de “preso político”, faz parte de sua deterioração moral.
Mas roubo não é um delito político – mesmo quando quem é roubado é a sociedade, ou seja, o país, o povo. Aliás, aí mesmo é que o roubo não é um delito “político”.
Ou, dito de outra forma: querer passar por perseguido político, entrar na categoria de Tiradentes ou de Mandela, quando se pertence à mesma categoria dos cunhas, geddeis e cabrais, deveria ser um crime extra, a demandar punição. E, com efeito, também esta chegará, mais cedo do que tarde. Mas, nesse caso, o tribunal será o povo.
No julgamento de terça-feira, os ministros do STJ fizeram apenas o que tinham de fazer. Como disse o relator, Felix Fischer, acompanhado pelos seus colegas:
1) Não existe nenhum risco de prisão iminente, antes de terminarem os recursos à segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que justifique um “habeas corpus” preventivo.
2) A defesa de Lula tem o direito de fazer um “recurso especial” ao STJ após encerrada a apreciação dos recursos no TRF4. Mas não pode discutir através de um “habeas corpus” assuntos que são próprios do “recurso especial”. Em suma, não pode antecipar o recurso, antes que termine o julgamento no TRF4, cobrindo-o com a forma de um “habeas corpus”.
3) O “recurso especial” não tem efeito suspensivo da execução da pena. Um indivíduo condenado à prisão pode recorrer ao STJ (“recurso especial”) e ao STF (“recurso extraordinário”), mas esses recursos não suspendem a sua prisão.
Existe decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) neste sentido – e com fundamento, pois a segunda instância é a última a examinar o mérito do processo, ou seja, se o acusado é culpado ou inocente.
Os recursos ao STJ ou ao STF não analisam a questão da culpa, são destinados a questões de Direito, ou seja, se as normas (“princípios e regras”) jurídicas foram respeitadas nos julgamentos anteriores.
Um dos ministros referiu-se a essa questão – a do cumprimento da pena após o julgamento em segunda instância, mesmo existindo recursos à terceira (STJ) e quarta (STF) instâncias – como “necessário para reverter a situação de impunidade que vivíamos”.
Esse é o centro da questão: permitir que a execução da pena seja suspensa enquanto correm recursos no STJ e STF, além de ilegal, significa jamais punir alguém que tenha dinheiro suficiente para pagar advogados que façam esses recursos.
Como disse o ministro Luís Roberto Barroso, quando essa questão foi discutida no STF:
“… permite-se que as pessoas com mais recursos financeiros, mesmo que condenadas, não cumpram a pena ou possam procrastinar a sua execução por mais de 20 anos. Como é intuitivo, as pessoas que hoje superlotam as prisões brasileiras (muitas vezes, sem qualquer condenação de primeiro ou segundo graus) não têm condições de manter advogado para interpor um recurso atrás do outro” (cf. HC 126.292/SP, 17/02/2016).
Tudo isso vale para Lula e para qualquer um. Mas Lula está querendo um privilégio: o de roubar e não ser punido. Talvez seja por isso que um de seus defensores declarou, após o julgamento no STJ, que “foi um resultado unânime no qual o tribunal preferiu manter-se na posição punitivista em grande voga no país”.
Realmente, a posição de que criminosos têm que ser punidos – e de que é função da Justiça puni-los – é muito popular em nosso país.
A tragédia seria se não fosse popular – pois aí estaríamos em uma terra onde o senso moral teria deixado de existir, onde as pessoas teriam complacência com aqueles que as roubam.
O que fazer diante de alguém que declara, como Lula em seu vídeo, que “depois daquela votação no TRF-4, sinceramente, se dependesse dali eu não teria por que acreditar na Justiça, porque aquilo foi uma encenação de uma coisa absurda. A impressão que eu tenho é que nenhum juiz teve a menor preocupação de ler os autos do processo”?
Todo mundo sabe que isso é mentira. Somente o relatório e voto do desembargador João Pedro Gebran Neto, relator do processo no TRF4, preencheu 544 páginas, analisando cada aspecto dos autos. Durante três horas e meia, televisadas para todo o país, o desembargador resumiu seu voto, com detalhes, apesar do caráter sintético da sustentação oral.
Lula chegou a um ponto em que não importa o que é verdade – mesmo quando todos sabem o que é verdade. Pode ser triste para alguns, mas, para Lula, essa ausência de qualquer respeito pelos outros, é o começo do fim. Ou, talvez, mais exatamente, para ele, seja o fim do fim.
CARLOS LOPES