Dos 87 votos para encharcar as arcas dos maníacos de guerra, 41 foram de senadores democratas e 46, de republicanos. Trump achava que US$ 668 bilhões já estava de bom tamanho
Enquanto falta dinheiro nos EUA para consertar a infraestrutura sucateada, deter os incêndios na Califórnia, implantar o Medicare para Todos (saúde pública), tornar a universidade gratuita ou até mesmo acabar com a encanação de chumbo na água de Flint, o Congresso dos EUA acaba de aprovar US$ 717 bilhões para o Pentágono e suas guerras e intervenções a serviço de Wall Street, Big Oil e dos demais monopólios. Como saudou o líder da maioria, senador Mitch McConnell, a lei estabelece “o maior aumento anual no financiamento das forças armadas norte-americanas em 15 anos”.
Mais até do que Trump pedira: US$ 668 bilhões. O aumento recorde – que só fica abaixo do auge da Guerra do Iraque – foi alcançado graças ao, como McConnell reconheceu, “compromisso orçamentário bipartidário”. Também elogiado pelo general “Mad Dog” Mattis, chefe do Pentágono. E US$ 100 bilhões acima daquele exorbitante último orçamento deixado por Obama (e logo inflado por Trump).
No Senado, 41 de 48 senadores democratas se juntaram a 46 republicanos para a farra do Pentágono, cuja lei foi batizada em homenagem ao belicista John McCain. Não faltou o entusiasmado voto ‘sim’ do líder da minoria, o democrata Chuck Schumer. Na Câmara de Representantes, passou fácil. Curiosamente, o senador Marco Rubio votou contra, não por ter virado pacifista inesperadamente, mas sim por repúdio à atenuação de cláusula anti-China.
Mal sabia o então presidente, e ex-general, Ike Eisenhower, quando na década de 1950 advertiu sobre o “complexo industrial-militar”, o que esperava os EUA e sua “democracia”. Nos tempos de Reagan, o inchaço das verbas militares – o chamado keynesianismo militar – era tido como uma coisa sideral. Mas nas guerras pelo petróleo de W. Bush, o patamar de US$ 300 bilhões vigente na década de 1990, logo dobraria, para US$ 600 bilhões. Acaba de ultrapassar a barreira dos US$ 700 bi. Dos altos mandos, generais e almirantes de pijama se tornam diretores dos boards das corporações, com salários anuais de até US$ 1 milhão, e as encomendas prosperam.
Mais da metade dos gastos discricionários do governo federal são sugados pelo Pentágono. Há quem assevere que, somando rubricas em outras dotações, como a espionagem (CIA e congêneres), o grampo eletrônico (NSA e coirmãs) e as armas nucleares, já está em US$ 1 trilhão. Mesmo “só” com os US$ 700 bi, os EUA já tem de orçamento militar mais que os gastos militares combinados das dez maiores potências seguintes. São 800 bases no exterior, as frotas de porta-aviões e de submarinos nucleares, e Trump já pediu sua própria versão da guerra nas estrelas.
A dotação orçamentária para 2019 do Pentágono, que já foi para a mesa de Trump, prevê, entre outros desperdícios, dezenas de aviões F-35, um porta-aviões e dois submarinos nucleares. Já virou anedota, contada e repisada muitas vezes, o hábito dos fornecedores do Pentágono de colocarem fermento no preço das encomendas que recebem.
E nem por isso deixam de se assombrar quando a Rússia, com um décimo disso e produção por estatais, deixa os ianques para trás e domina a tecnologia dos mísseis hipersônicos e de como desativar navios de guerra ianques de última geração. “Não quiseram nos escutar, vão nos escutar agora”, disse então o presidente russo Vladimir Putin.
Nos últimos 25 anos de dominação unilateral, os EUA andaram ocupados invadindo e destruindo países, cometendo ataques com drones contra civis indefesos, e toda a sorte de tortura e crimes de guerra. Um milhão de mortos no Iraque, centenas de milhares no Afeganistão e na guerra por procuração na Síria, Líbia e Somália estados falidos, dezenas de milhares nos Bálcãs, disseminação do terrorismo, para manter a rédea curta sobre a Europa e o Japão, e apostando no esmagamento da Rússia.
Não sem custos. Um estudo do ano passado estimou em quase US$ 6 trilhões o custo dessas aventuras, mas mais provavelmente é o dobro ou triplo disso, feitas todas as contas – e o serviço da dívida. Como alguns analistas costumam dizer, o império faz tempo que paga as guerras no ‘cartão de crédito’ do privilégio exorbitante do dólar. Trump ultimamente anda dizendo que o império está alquebrado e que o preço da ocupação vai subir para 4% do PIB.
73 anos após o fim da II Guerra, tropas e bases dos EUA seguem ocupando a Alemanha, a Itália, o Japão e a Coreia. Ultimamente, deram para estender suas tropas de choque e seus drones à África, para deter a cooperação da China com os africanos. Insistem nas provocações e cerco contra a Rússia e a China.
VETERANOS
Também é pesado o custo – internamente aos próprios EUA – dessa interminável intervenção contra quase a humanidade inteira. Todos os dias veteranos de guerra dormem nas ruas dos EUA, sem ter sequer um teto. Mais de um milhão estão recebendo pagamento por incapacidade. 327 mil foram diagnosticados com lesão cerebral traumática, por causa das bombas improvisadas. Chama também a atenção a forma como a mídia dos EUA noticiou a aprovação da lei de financiamento do Pentágono. Sobre a enorme e absurda dilapidação de recursos socialmente necessários, nenhuma palavra. Menos ainda sobre os possíveis crimes de guerra graças à montanha de dólares. Mas se lembraram de registrar como a lei prevê melhorar a proteção ao assédio nas escolas aos filhos de militares nas bases. E, ainda, de uma cláusula sobre a proteção de duas espécies de galinhas selvagens.
Como assinalou o Common Dreams, citando o analista Adam Johnson, nenhum editor de opinião, de editorial ou de tevê a cabo “perguntará ‘como vamos pagar por isso?’ Financiamento para bombas, armas, bases militares, navios de guerra, aviões de combate simplesmente é levado em conta. Como a gravidade ou a entropia, simplesmente é”.
ANTONIO PIMENTA