Deputada bolsonarista alega que os pagamentos feitos ao hacker foram para o site dela e que não usou recursos da cota parlamentar
Os pagamentos feitos pela deputada federal Carla Zambelli (PL) a Walter Delgatti Neto, conhecido como “hacker da Vaza Jato”, estão sob a mira da PF (Polícia Federal).
A corporação teve acesso aos dados das transações financeiras e comprovaram que ele recebeu R$ 13,5 mil, via PIX, de pessoas próximas à deputada federal. Agora, o contrato obtido pela PF pode revelar que o dinheiro público talvez tenha sido utilizado nesse pagamento.
Após a Operação 3FA, da PF, que ocorreu na última quarta-feira (2), Zambelli veio preocupada a público alegar que os pagamentos feitos ao hacker foram para manter o próprio site. Mas negou que tenha usado dinheiro público, por meio da cota parlamentar, que destina verba aos deputados para custeio das despesas relativas ao mandato parlamentar.
“Os pagamentos foram sempre relacionados ao site, para fazer melhorias no site. Não foi da minha cota. Todo dinheiro foi de empresa que eu subcontratei, e essa empresa pagou, mas do meu bolso, não da cota [parlamentar]”, disse a bolsonarista.
TRIANGULAÇÃO SUSPEITA
Apesar das afirmações, os dados de transparência da Câmara dos Deputados revelam que, de outubro de 2022 a abril deste ano, total de R$ 94 mil foram pagos por Zambelli a serviço de divulgação parlamentar.
Esses serviços foram terceirizados pela deputada para uma empresa, cuja dona é a mulher de Jean Hernani Guimarães Vilela, assessor da deputada e responsável por parte do pagamento ao hacker, Monica Romina Santos de Sousa.
Ao todo, foram cerca de 7 pagamentos no valor de R$ 9 mil em cada mês.
ENTENDA O IMBRÓGLIO
De forma resumida, a patranha golpista que envolve a deputada bolsonarista e o “hacker da Vaja Jato”, da chamada Operação 3FA, da PF, teve como principal foco esclarecer a invasão aos sistemas do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e a inserção de documentos e alvarás de soltura falsos no BNMP (Banco Nacional de Mandados de Prisão).
Os crimes ocorreram entre os dias 4 e 6 de janeiro deste ano, quando foi inserido inicialmente mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes e, em seguida, 10 ordens de soltura favorecendo lista de pessoas presas por diversos motivos.
COMO ESSES CRIMES OCORRERAM
Segundo os investigadores, entre setembro e dezembro de 2022, o hacker Walter Delgatti Neto, a pedido da deputada Carla Zambelli, invadiu os sistemas do CNJ com o objetivo de expor a vulnerabilidades dos sistemas do Judiciário como forma de desacreditar o sistema das urnas eletrônicas gerenciado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Para o crime, os investigadores suspeitam que Delgatti recebeu valores em espécie em quantidade ainda não identificada. Também foram identificadas transferências via PIX no valor de R$ 13,5 mil. As transferências foram feitas por Renan Cesar Silva Goulart e Jean Hernani Guimarães Vilela, servidores ligados ao gabinete da deputada e do irmão dela, que é deputado estadual em São Paulo.
Dia 4 de janeiro de 2023, em Araraquara, supostamente a pedido de Zambelli, o hacker incluiu mandado de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes no BNMP após invadir os sistemas do CNJ.
Ainda dia 4, a partir de local ainda não identificado e por pessoa não identificada, com o mesmo acesso utilizado por Delgatti, foram inseridos alvarás de soltura em favor de 10 pessoas presas por diversos motivos. Em depoimento à PF, Delgatti apontou outro hacker, Thiago Eliezer Martins Santos, como o provável autor desta ação, mas não relacionou os alvarás de soltura à deputada Zambelli.
ACUSAÇÕES CONTRA ZAMBELLI
Zambelli foi puxada para dentro da investigação no final de junho, quando, dia 27, o hacker Walter Delgatti prestou depoimento à PF. Naquele momento, o caso ainda estava sob a competência da Justiça Federal em Brasília.
No depoimento, Delgatti disse que a deputada se aproximou em setembro de 2022 porque queria que ele invadisse uma urna eletrônica ou qualquer sistema da Justiça brasileira para demonstrar a fragilidade do sistema eletrônico diante da aproximação das eleições gerais de outubro.
Ele relatou que o pedido de Zambelli foi feito em encontro em posto de combustível na rodovia dos Bandeirantes, em São Paulo.
ALEGAÇÕES DE ZAMBELLI E DELGATTI
Na manhã da última quarta-feira (2), Zambelli foi ao Salão Verde da Câmara dos Deputados dar a versão dela sobre os fatos investigados.
Ela confirmou os pagamentos feitos para Walter Delgatti Neto, mas alegou que esses foram feitos por serviços prestados para o site pessoal da parlamentar.
De acordo com a parlamentar, R$ 3 mil da cota para comunicação foram usados para fazer os pagamentos a Delgatti. O restante, que soma R$ 13,5 mil, “saiu de seu próprio bolso”.
VERSÃO DE DELGATTI
A versão de Delgatti foi passada pelo advogado dele, Ariovaldo Moreira, que manteve a versão dada pelo hacker no depoimento à PF de que a invasão ao sistema do CNJ foi feita a pedido de Zambelli.
Segundo Moreira, não há negociação de delação premiada em andamento. Porém, afirmou que o cliente tem predisposição de colaborar com a Justiça para “trazer até as autoridades o que realmente aconteceu, quem são as pessoas envolvidas, qual é a participação dele e dessas outras pessoas”.
“Ele fez isso [invasão], e fez isso a mando de Carla Zambelli. Ele é réu confesso e vai responder pelo crime, tem ciência do que ele fez e quer colaborar com as investigações para que se chegue ao que realmente aconteceu”, pontuou.
M. V.