“Seria uma injeção de recursos na base da economia, num momento de crise como essa, isto é fundamental”, afirma Kleber Cabral
A correção da tabela do Imposto de Renda para Pessoa Física (IRPF) “seria uma injeção de recursos na base da economia, num momento de crise como essa, isto é fundamental”, defendeu o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), Kleber Cabral, em entrevista à Hora do Povo, nesta segunda-feira (18).
“A questão da não correção da tabela é um problema que a gente aponta há muitos anos, porque ela faz com que a cada ano de não correção, o contribuinte, sobretudo o assalariado, pague mais do que deveria. Num momento de crise como esse, isso fica ainda mais agudo, fica ainda mais latente os efeitos dessa injustiça tributária”, disse o auditor Fiscal.
Na semana passada (12), o Sindifisco divulgou um novo estudo, em que demonstra que a defasagem da tabela do IRPF chegou a 113%, com o avanço da inflação no ano passado. De acordo com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial no País fechou a 4,52%. Em 24 anos, a variação do IPCA somou 346,69%.
O cálculo é a diferença entre a alta acumulada da inflação, entre 1996 e 2020, e correções na tabela do IR no período. A última correção da tabela do IRPF foi realizada em 2015. A correção da tabela foi uma promessa de campanha de Bolsonaro em 2018. Na época, ele afirmou que subiria a faixa de isenção para R$ 5 mil.
Questionado, sobre o que significa para os brasileiros passar mais um ano sem o reajuste na tabela do IRPF – num quadro de pandemia e crise econômica, Cabral afirmou que, além da correção da tabela do imposto ser uma questão de “Justiça fiscal”, ela pode ter um efeito positivo na economia do País.
“Tem um componente econômico que deveria fazer o governo se mover para fazer essa correção na tabela, porque ela gira uma espiral positiva para economia: consumo, produção, questão do emprego”. “Você colocando dinheiro na ponta, lá no contribuinte que é consumidor, isto movimenta a economia”, destacou Kleber.
Se a correção da tabela tivesse acompanhado o IPCA, os contribuintes com renda mensal de até R$ 4.022,89 seriam isentos do IRPF, segundo projeções do Sindifisco Nacional. Hoje quem recebe R$ 3.000 por mês, cita como exemplo, está pagando por ano R$ 1.300 de imposto. “O governo está engordando uma arrecadação indevida”, denunciou Cabral.
“A gente faz anualmente o alerta disso, mas esse ano nós apresentamos um estudo mais completo, inclusive, para vencer as dificuldades, os argumentos contrários que sempre são apresentados, que são basicamente: ‘o governo não pode perder arrecadação’. Mas, na verdade, o governo está engordando uma arrecadação indevida ao não corrigir a tabela, porque bem ou mal a economia cresce, as pessoas têm seus dissídios e as pessoas que nunca pagaram começaram a ser contribuintes do Imposto de Renda. Lá atrás, para se ter uma ideia, a isenção chegou a cobrir nove salários-mínimos. Hoje é menos de dois. Então, muita gente que não pagava o Imposto de Renda começou a pagar”, explicou o presidente da entidade.
Na quinta-feira (14), Bolsonaro disse que vai tentar aumentar a faixa de isenção do IR para R$ 3 mil até 2022, e culpou a pandemia por não conseguir cumprir a promessa. A fala de Bolsonaro se deu uma semana após ele ter afirmado, em uma conversa com apoiadores no Palácio da Alvorada, que “queria mexer na tabela do Imposto de Renda”, mas que não poderia “fazer nada”, porque “o Brasil está quebrado”.
Na avaliação do auditor, o governo já poderia ter ampliado a faixa de isenção, atualmente limitada a rendimentos de até R$ 1.903,98. “Poderia, mas precisa ter a disposição, a coragem de enfrentar o andar de cima”, disse Cabral afirmando que “a tabela do IR acaba pegando muito a classe média baixa, a classe média e a classe média alta. Os ricos mesmo, os empresários, a grande elite econômica, acabam não pagando”.
“Eles não estão nem aí para que se corrija a tabela do IR. Eles recebem seus rendimentos via a distribuição de lucros e dividendos, que é isento no Brasil desde 1995. Então, o que a gente está apontando no estudo, é que essa queda de arrecadação, que de fato existe com essa correção da tabela, ela pode ser perfeitamente compensada com a tributação destes que hoje pouco ou nada pagam”, defendeu o presidente do Sindifisco Nacional.
“Há uma série de ajustes que são propostos em nosso estudo, com objetivo de viabilizar economicamente, sem comprometer o País, que de fato está em crise, não pode prender arrecadação, mas que precisa equilibrar de forma mais justa o peso da carga tributária sobre o lombo dos brasileiros. Hoje, quem paga mais imposto são [mais] os pobres do que os ricos. O que a gente não pode é se deixar enganar, porque há um discurso muito corrente de que quem ganha mais de dois salários-mínimos é rico – querendo igualar, com este tipo de argumentação, pessoas que vivem em condições completamente diferentes”, afirmou Cabral.
Como não houve nenhum reajuste na tabela do IR, parte dos 67,9 milhões de brasileiros que receberam o auxílio emergencial de R$ 600 (R$ 1.200 no caso de mães chefes de família), que em setembro foi cortado pelo governo para R$ 300, terão de declarar e pagar o imposto sobre o benefício.
Em maio do ano passado, Bolsonaro sancionou uma alteração na Lei que instituiu o auxílio (13.998/2020), que obriga os trabalhadores a incluírem os valores do benefício no total de rendimentos tributáveis de 2020. A regra vale para o beneficiário e para seus dependentes.
ANTONIO ROSA