Os gestores da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) ignoraram alertas feitos pela Controladoria-Geral da União (CGU) a respeito do superfaturamento de uma licitação realizada em 2020 na Bahia.
Segundo um relatório da CGU, publicado no último dia 14, elaborado no fim do ano passado, há detalhes de dois processos licitatórios repletos de problemas e irregularidades, sendo que em um deles a Codevasf cancelou após relatório da CGU e, em outro, manteve o pregão, apesar da recomendação de suspensão.
As duas licitações previam a compra de tubos de PVC. No caso da que foi levada adiante, o valor final para a aquisição foi estimado em R$ 11,3 milhões. Entre os apontamentos de fragilidade no processo, os técnicos da CGU advertiram para os valores excessivos, mas os gestores da Codevasf ignoraram o alerta e levaram o processo licitatório adiante.
“Apesar de ser tempestivamente alertada quanto às deficiências expostas, a empresa decidiu prosseguir com o certame. Agindo assim, mesmo diante das falhas existentes, a empresa se expôs aos riscos inerentes à compra”, comentaram os técnicos da CGU no documento.
O órgão de controle observou um aumento médio de 92% nos preços praticados nessas novas contratações, com impacto estimado em R$ 3,4 milhões. A análise de ambos os pregões “evidenciou grande deficiência de planejamento das aquisições, seja na definição e especificação do objeto, seja nas pesquisas de mercado, seja pela ausência/deficiência de estudos técnicos preliminares”, disseram os técnicos da Controladoria.
Outro ponto questionado é que os gestores da Codevasf adotaram no processo uma opção de fazer parte da compra no varejo, algo que a controladoria aponta que foi uma “decisão imotivada”. O órgão explicou que a definição representou um gasto a mais estimado em R$ 308 mil.
Na licitação que foi cancelada pela empresa, estava previsto a compra de 458 mil tubos no valor total de R$ 26,7 milhões, algo que os técnicos da CGU logo apontaram sobre risco de sobrepreço estimado em R$ 16,4 milhões. Já no segundo edital, a Controladoria recomendou a suspensão por observar a persistência de fragilidades nos Estudos Técnicos Preliminares, da inefetividade do planejamento e de falhas na estimativa de preços.
“A recomendação não foi acatada pela gestão da Codevasf, que optou por assumir os riscos advindos do prosseguimento do certame. Ocorrido o pregão, observou-se que houve substancial aumento nos preços praticados nessas novas contratações, ou seja, o risco de contratação com preços majorados se confirmou”, pontuou a Controladoria no relatório.
A Codevasf, empresa federal entregue por Jair Bolsonaro (PL) a políticos do chamado Centrão em troca de apoio no Congresso Nacional, foi alvo nesta semana de uma operação da Polícia Federal (PF), que realizou 16 mandados de busca e apreensão e um de prisão em uma investigação sobre crimes de corrupção e enriquecimento ilícito envolvendo a estatal no Estado do Maranhão, que envolve cerca de R$ 140 milhões.
A ação buscou desarticular um “engenhoso esquema de lavagem de dinheiro, perpetrado a partir do desvio do dinheiro público proveniente de procedimentos licitatórios fraudados”. Um “sócio oculto” da Construservice, empreiteira que é a segunda que mais recebe verba pública e obras da Codevasf, Eduardo José Barros Costa, foi preso. Durante a operação, foram apreendidos relógios de luxo e R$ 1,3 milhão em dinheiro vivo. Ele já foi solto.
Com o casamento de Bolsonaro com o grupo de políticos intitulado “Centrão”, o orçamento da Codevasf passou a ser robustamente irrigado com dinheiro das emendas de relator-geral do orçamento, a chamada RP9, mas popularmente conhecida como “orçamento secreto”, já que a definição dos recursos se dá sem transparência.
A estatal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional passou a ser controlada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), que sustentam Bolsonaro nas relações com o Congresso.
De sua vocação histórica de promover projetos de irrigação no semiárido, hoje a Codevasf atua apenas em projetos obscuros, em geral, obras de pavimentação e compra de máquinas e equipamentos destinados a regiões metropolitanas.
A estatal recebeu R$ 2,1 bilhões em emendas parlamentares entre 2018 a 2021.
Para este ano, inicialmente, estava previsto, para Orçamento de 2022, R$ 610 milhões em emendas de relator para a Codevasf.
No entanto, este valor passou para R$ 1,2 bilhão a pedido de lideranças partidárias e autorizado por uma portaria publicada pelo Ministério da Economia, segundo afirmou na semana passada (21) o relator do Orçamento, deputado Hugo Leal (PSD-RJ). No total, a Codevasf tem orçamento de R$ 2,7 bilhões em 2022.