“Vai haver um grande pulo entre dezembro e janeiro, com aumento muito intenso da pobreza”, alerta FGV sobre o fim da renda emergencial
O fim do auxílio emergencial em um momento de desemprego recorde e inflação nas alturas será responsável por jogar milhões de brasileiros na pobreza, prevê o economista e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Daniel Duque.
“Vai haver um grande pulo entre dezembro e janeiro, com aumento muito intenso da pobreza. Já estamos vendo isso ao longo dos últimos meses, de uma maneira mais gradual, porque as pessoas foram conseguindo o auxílio aos poucos”, afirmou o pesquisador.
Duque foi responsável por um cálculo que estimou o tamanho do impacto da redução da renda emergencial (de R$ 600 para R$ 300) pelo governo Bolsonaro em setembro, ainda no auge da pandemia e sem qualquer perspectiva sobre a vacina. Segundo os dados, obtidos pelo O Globo, 11,6 milhões de pessoas passaram para baixo da linha da pobreza a partir de agosto. Nesse período, além do corte no auxílio, o desemprego alcançou 14 milhões de pessoas e a inflação passou a pesar mais para os mais pobres, pois os itens cujos preços dispararam foram exatamente os essenciais.
No ano passado, até novembro, a inflação dos mais pobres (com renda domiciliar de até R$ 1.650) chegou a 4,56%. Entre os mais ricos (renda superior a R$ 16.509,66) ficou em 1,68% no mesmo período.
De acordo com as pesquisas da Fundação, a parcela da população na pobreza (linha de corte é a renda domiciliar per capita de R$ 455 por mês) chegou a 24,12% em novembro – já considerando os efeitos da inflação desigual. Em agosto, eram 18,42% da população, quando o auxílio emergencial estava injetando, em média, R$ 50 bilhões mensais para reforçar ou substituir a renda dos mais pobres, que perderam o emprego na pandemia.
Para um contingente de cerca de 65 milhões de pessoas que a partir deste primeiro de janeiro está completamente sem renda, o governo ainda não anunciou nenhum plano emergencial – apesar do recrudescimento da pandemia e da necessidade de medidas de isolamento social.
Cálculos do sociólogo Rogério Barbosa, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, mostram que a parcela de pobres deverá chegar a 30,8% no início de 2021. Sem o auxílio, o número de pobres sobe de 50,6 milhões para 65,2 milhões.
“Ainda tem um componente sazonal muito grave: janeiro é o mês com mais demissões, e não teremos o auxílio emergencial. No mínimo, a pobreza vai chegar a 30,8% da população”, prevê Barbosa.
O sociólogo é categórico ao afirmar que o Brasil continua em uma situação emergencial, apesar do negacionismo do governo.
“O vírus está circulando, e não parece que haverá vacina para todo mundo este ano. A causa que está afetando a economia não está resolvida. Estamos enxugando gelo”, sentenciou.
Ele lembra que, além dos 14,1 milhões de desempregados, há mais dez milhões de pessoas que ainda não voltaram a procurar trabalho, mas vão pressionar o mercado neste início de ano.