
O presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o físico Luiz Davidovich denunciou o êxodo cada vez maior de cientistas e pesquisadores do Brasil, como consequência direta do corte de repasses de verbas às universidades federais e à ciência.
O físico diz que tem assinado cada vez mais cartas de recomendação para pesquisadores que deixam o Brasil. “A fuga de cérebros é muito concreta e dolorosa para mim”, disse o cientista em entrevista ao Jornal Valor Econômico, que considerou que as ações do governo até aqui refletem uma “total ausência de agenda para o desenvolvimento científico”.
Davidovich relembrou quatro colegas concursados abandonarem seus cargos para tocar trabalhos em Austrália, Holanda, Portugal e Chile. “Três vão para universidades estrangeiras, outro vai para uma empresa australiana de computação quântica, mas aprendeu tudo aqui”, afirmou.
“O apagão de investimentos pode quebrar o sistema de C&T. Tudo que temos hoje começou a ser institucionalizado na década de 1950, mas vem de antes. A construção é um processo longo, mas a destruição pode ser muito rápida, menos de uma década”.
A queda ocorre todos os anos desde 2010. No entanto, a magnitude dos cortes orçamentários na área promovidos neste ano surpreendeu o presidente da ABC, que fala em uma “total ausência de agenda para o desenvolvimento científico” por parte do atual governo.
Segundo Davidovich, o ano de 2019 foi difícil, com o corte de 30% no Ministério da Educação e 42% na pasta de Ciência e Tecnologia (MCTIC). O principal afetado é o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que provê a maior parte dos recursos à pesquisa científica.
“Com o corte, as bolsas de pesquisa só chegariam a junho, mas uma suplementação de R$ 300 milhões permitiu pagar até setembro. Ainda falta para o resto do ano”, criticou Davidovich.
De acordo com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), ainda faltam R$ 340 milhões para o CNPq honrar as bolsas de 84 mil pesquisadores neste ano.
FUGA
Segundo o cientista, muitas vezes, os pesquisadores procuram na verdade, insumos e equipamentos para os quais o governo brasileiro tem empenhado cada vez menos recursos nos últimos anos. A saída dos cientistas é a ferida mais exposta do sistema de Ciência e Tecnologia (C&T) do país, que se agravou no governo Jair Bolsonaro e seus cortes, ausência de projeto tecnológico e negação da ciência.
A SBPC também manifesta preocupação com a a fuga de cérebros do Brasil. “Em função dos drásticos cortes orçamentários para a Ciência, Tecnologia e Inovação, já se observa uma expressiva evasão de estudantes, o sucateamento e o esvaziamento de laboratórios de pesquisa, uma procura menor pelos cursos de pós-graduação e a perda de talentos para o exterior. Este quadro se acelerará dramaticamente com a suspensão do pagamento das bolsas do CNPq”, destacou a entidade.