Depoimento do líder do governo na Câmara promete ser tenso, pois pode implicar diretamente o presidente Jair Bolsonaro, que, sabendo que Barros estaria por trás de negócios na compra de imunizantes, nada fez, incorrendo então em crime prevaricação
A CPI da Covid-19 no Senado ouve, na próxima quinta-feira (12), o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR). O nome dele foi mencionado por Jair Bolsonaro em supostas irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin.
A comissão também convocou para depor, o presidente do Instituto Força Brasil, Hélcio Bruno de Almeida, e o presidente da Vitamedic Indústria Farmacêutica, Jailton Batista.
A convocação de Barros foi sugerida pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). De acordo com o autor do requerimento, o líder do governo na Câmara foi “mencionado pelo próprio presidente da República no cometimento de potenciais ilícitos no contexto de negociação e compra da Covaxin”, escreveu Vieira no pedido. O depoimento está marcado para quinta-feira, a partir das 9 horas.
O depoimento do deputado promete ser tenso, pois pode implicar diretamente o presidente Jair Bolsonaro, que sabendo que o líder dele na Câmara estaria por trás de negócios ilícitos na compra de imunizantes, nada fez, incorrendo então em crime de prevaricação, pelo menos.
IMBRÓGLIO
Todo esse imbróglio veio à tona no depoimento prestado à CPI, em 25 de junho, pelos irmãos Miranda — o deputado Luis Miranda (DEM-DF), e o irmão dele, que é servidor concursado do Ministério da Saúde, Luis Ricardo Miranda.
O contrato foi fechado pelo governo e a Precisa Medicamentos, atravessadora do negócio, para fornecer 20 milhões de doses da vacina Covaxin, produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech, no valor total de R$ 1, 6 bilhão.
Luis Ricardo Miranda estava sendo pressionado a autorizar a importação da Covaxin com o invoice determinando o pagamento antecipado dos US$ 45 milhões num paraíso fiscal.
Foi essa invoice que Miranda entregou a Bolsonaro como prova das irregularidades. Bolsonaro, ao ver documento, disse, ao que tudo indica, enganosamente, aos irmãos Miranda que a coisa era séria, embora não tenha tomado nenhuma providência como prometera.
Segundo o deputado Luis Miranda, Bolsonaro chegou a dizer que sabia do que se tratava e creditou o malfeito ao seu líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros. “Isso é coisa do fdp do Barros”, disse ele, segundo Miranda.
Ou irregularidade é o preço da vacina que o governo aceitou pagar: US$ 15 a dose da Covaxin.
Uma ata do Ministério da Saúde resume uma reunião de 20 de novembro de 2020 com o ex-secretário-executivo Elcio Franco, e representantes da Precisa. O documento indica que o preço seria de US$ 10 dólares com possibilidade de redução de valores. Ao final, o contrato foi assinado por US$ 15 a dose da vacina.
O crime de prevaricação é cometido por funcionário público quando, indevidamente, esse retarda ou deixa de praticar ato de ofício, ou pratica-o contra disposição legal expressa, visando satisfazer interesse pessoal.
Na semana passada, o laboratório Bharat confirmou que a Precisa falsificou documentos e rompeu com a atravessadora.
A CPI vai ter mais 90 dias de investigações, pois em 14 de julho teve os trabalhos prorrogados. Desse modo, o inquérito no Senado que apura as ações, inações e responsabilidades do governo, sob a liderança de Bolsonaro, no combate à pandemia da Covid-19, deve ir até o início de novembro.
400 MILHÕES DE DOSES DA ASTRAZENECA
Na terça-feira (10), a CPI ouve Helcio Bruno de Almeida. O requerimento é do vice-presidente da comissão, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Ele lembra que, em depoimento à CPI, representantes da empresa Davati no Brasil disseram que o presidente do Instituto Força Brasil intermediou encontro entre eles e o então secretário-executivo do Ministério da Saúde, coronel Elcio Franco.
Na ocasião, discutiu-se a compra de 400 milhões de doses do imunizante da AstraZeneca.
O CHAMADO “KIT-COVID”
Na quarta-feira (11), os senadores tomam o depoimento de Jailton Batista. O presidente da Vitamedic Indústria Farmacêutica deve falar sobre a venda de medicamentos relacionados ao chamado “Kit-Covid”, que não têm eficácia científica comprovada contra a Covid-19.
O requerimento do relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), previa originalmente a convocação de outro representante da Vitamedic, o empresário José Alves Filho. A substituição, entretanto, foi solicitada pela própria farmacêutica.
QUEBRAS DE SIGILO E REQUISIÇÃO DE SERVIDORES DA PF
Ao final da reunião da última quinta-feira (5), a CPI aprovou cinco requerimentos, dos quais três são relacionados às quebras de sigilo. Um desses pediu a quebra do sigilo telemático do perfil Dallas Cowboy, do Twitter. O autor, senador Humberto Costa (PT-PE), pediu que a plataforma forneça, por meio eletrônico, os dados cadastrais e de criação da conta, com nome, e-mail e telefone dos responsáveis.
Segundo Costa, o perfil se vale do anonimato para difundir “fake news” e atacar instituições e autoridades da República. No requerimento, o senador registra ainda que o perfil ataca “a ciência para se disseminar ideias falsas sobre a pandemia, inclusive sobre tratamentos sem qualquer evidência científica”.
Também foi aprovado o requerimento para a quebra de sigilo telefônico do empresário Rodolfo Fortes Neto. De acordo com o pedido, de iniciativa do vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), a transferência de sigilo deve retroagir até o mês de janeiro do ano passado.
O senador aponta que Fortes Neto teve contato com agentes políticos e representantes do governo na tratativa de aquisição de vacinas. Randolfe classifica a quebra de sigilo como “imprescindível”, já que existe o “justo receio de que muitas dessas pretensas contratações foram eivadas de vícios de legalidade”.
RELAÇÃO ENTRE A PRECISA MEDICAMENTOS E A FIB BANK
A CPI ainda aprovou a quebra dos sigilos telefônico, bancário, fiscal e telemático da FIB Bank Garantia de Fianças. Randolfe, também autor do requerimento, aponta a relação entre a Precisa Medicamentos e a FIB Bank como justificativa para o pedido de quebra de sigilo.
Ele argumenta que a Precisa, suspeita de irregularidades na negociação de vacinas anticovid com o Ministério da Saúde, apresentou ao governo carta de fiança emitida pela empresa FIB Bank, sediada em Barueri (SP), no valor de R$ 80,7 milhões. Segundo Randolfe, há suspeitas de irregularidades nessa transação bancária.
Na sequência da quebra de sigilo da FIB Bank, foi aprovado o requerimento, também de Randolfe, para a convocação do advogado Marcos Tolentino da Silva, apontado como sócio oculto dessa empresa.
A CPI ainda aprovou outro requerimento de Humberto Costa, no qual solicita à Polícia Federal a cessão de dois servidores para prestar apoio e assessoramento técnico investigativo aos trabalhos da comissão.
M. V.