No próximo sábado (25), completam seis anos da tragédia-crime de Brumadinho (MG), causada pela ruptura da barragem da Mina Córrego do Feijão, da Mineradora Vale. Até o momento ninguém foi responsabilizado criminalmente pelo desastre anunciado, que resultou na morte de 270 pessoas – duas ainda por nascer – e na devastação de ecossistemas locais.
O sentimento de impunidade e a dor das famílias das vítimas por essa violência sem precedentes que abalou o Brasil e o mundo, ainda ecoam nas ruas da cidade e nas consciências de todos que acompanharam a tragédia.
Embora diversas investigações tenham sido iniciadas, até o momento ninguém foi responsabilizado criminalmente de forma efetiva. A Vale, empresa responsável pela barragem, enfrenta processos civis e ações judiciais, mas os desdobramentos são lentos. Em meio a promessas de reparação e compensação, apenas 10% dos atingidos foram reconhecidos em programas de reparação.
O contrato assinado em 2021 entre o Governo de Minas Gerais, entusiasta da mineração predatória na pessoa do governador Romeu Zema (NOVO), a mineradora Vale e órgãos judiciais está encerrando seus programas, mas ainda não reparou a maioria das pessoas afetadas. Para denunciar essa situação, atingidos organizam uma série de atos em Belo Horizonte nesta sexta-feira (24). Entre eles, assembleia, debates, reuniões com instituições de justiça e uma marcha pela capital. Ao mesmo tempo, para homenagear e honrar às vítimas e para demonstrar a resistência das famílias.
As consequências do desastre vão além da perda de vidas. Comunidades inteiras foram desestruturadas, e o impacto ambiental continua a ser sentido. A lama tóxica que se espalhou pelo Rio Paraopeba comprometeu a qualidade da água e a vida aquática, afetando a subsistência dos moradores que dependem da pesca e da agricultura.
Organizações sociais e movimentos de direitos humanos têm se mobilizado para exigir que as autoridades tomem providências. Os órgãos fiscalizadores, como o Ministério Público e a Agência Nacional de Mineração (ANM), têm sido criticados pela lentidão e falta de efetividade nas ações.
Hoje, o processo criminal tramita em âmbito nacional e 15 pessoas respondem por homicídio doloso. As empresas Vale S.A. e a alemã Tüv Süd, esta última, responsável por certificar a segurança da barragem, enfrentam acusações de diversos delitos da lei ambiental. As investigações correm também na Procuradoria criminal de Munique. Espera-se que esse procedimento se conclua em 2025 e que possa levar a abertura de uma ação penal contra a empresa e aos corresponsáveis pelo crime brutal ocorrido em 2019.
DEMORA
“A gente tem muita dificuldade de entender por que, até hoje, se fala tanto que é um processo muito complexo”, critica Maria Regina da Silva, integrante da Associação de Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (Avabrum). “Eles mataram! E se eles mataram, eles têm que ser julgados e condenados”, defende Maria Regina, que perdeu a filha Priscila Ellen Silva durante a tragédia.
Para as famílias, a reparação depende da punição dos responsáveis, que sabiam do risco de rompimento. Sem a aplicação da lei penal, não haverá a mudança de comportamento esperada, argumentam. Danilo Chammas, jurista, advogado da Avabrum e presidente do Instituto Cordilheira, também corrobora a tese das famílias. “Existem provas contundentes de que algumas pessoas tinham conhecimento sobre a situação de risco da barragem”, mas tomaram, “conscientemente, a decisão de ocultar essa informação dos órgãos públicos”, diz. Também, “dos próprios trabalhadores da mina, dos moradores do entorno e da sociedade em geral”, sustenta.
A decisão de federalizar as ações, no início de 2023, foi para atender ao pedido da defesa de alguns réus. Eles alegavam a existências de sítios arqueológicos na área atingida, o que não foi provado, mesmo assim a ação foi transferida. Após anos de atraso, que levaram os atos processuais a serem refeitos, a ação está prestes a concluir as respostas à acusação.
“Nessa disputa de opiniões e de teses jurídicas, passaram-se três longos anos”, lembra o advogado da Avabrum. “Ao final, continua Danilo, “quem ganhou com isso foram os réus e quem perdeu foram todos aqueles interessados na realização da justiça”. Com isso, “o processo teve que ser retomado do início e diversos atos processuais tiveram que ser refeitos”, explica o jurista.
A expectativa das famílias representadas pela entidade é que, ainda em 2025 sejam realizadas audiências para que os depoimentos dos envolvidos sejam retomadas. No entanto, temem que o processo não se sustente ou volte às fases anteriores.
Para elas, é fundamental que a acusação de homicídio doloso (quando há intenção de matar ou quando se assume o risco de causar a morte), seja mantida no decorrer da ação. A preocupação é que, caso essa tipificação seja retirada, o processo do Tribunal do Júri poderia abrandar as penas esperadas. Outra importante reivindicação é que os familiares participem do julgamento, segundo o advogado.
O imbróglio por parte das autoridades judiciais produziu no ano passado, pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), um habeas corpus em favor do ex-presidente da mineradora Vale Fabio Schvartsman. A decisão excluiu da lista de réus no processo o nome do executivo.
A defesa das famílias disse que vem atuando para impedir que medidas como essa não se repliquem e para também reverter a decisão. “Seguiremos atentos para que mais nenhum réu seja presenteado com o benefício de se livrar prematuramente do processo”, declarou Danilo Chammas ao Brasil de Fato. “No caso de Fábio Schvartsman, trabalhamos para que a decisão do TRF 6, que não é definitiva, seja revertida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ)”, completou o advogado da Avabrum.