Finian Cunningham*
Talvez o Partido Democrata deva às vezes ouvir o presidente Trump em busca de uma mudança, em vez de ridicularizá-lo de forma reflexa a cada momento. O partido está desesperado para derrotar o candidato republicano a quem odeia ferozmente. Assim, enquanto os democratas se preparam para nomear seu candidato à presidência entre um campo apinhado, quem lhes dá a melhor chance de vencer a eleição em novembro?
Segundo o próprio presidente, é Bernie Sanders, a quem ele mais teme.
Questionado se Trump preferiria concorrer contra Sanders ou o magnata bilionário Michael Bloomberg, o presidente disse esta semana: “Francamente, prefiro concorrer contra Bloomberg do que contra Bernie Sanders”, falando a repórteres na Casa Branca. “Porque Sanders tem seguidores reais, quer você goste dele ou não, concorde ou não com ele. Acho terrível o que ele diz. Mas ele tem seguidores. Bloomberg está apenas comprando seu ingresso”.
Bloomberg, ex-prefeito da cidade de Nova York e magnata da mídia, está gastando dezenas de milhões de dólares para se promover como candidato democrata à presidência. O partido nomeará seu candidato em uma convenção em Milwaukee, em julho.
Mas, à medida que as primárias democratas avançam pelos EUA, é Bernie Sanders, senador de Vermont, 78 anos, quem mostrou estar desde o início na liderança. O autodeclarado socialista ganhou o voto popular em Iowa na semana passada, apesar de uma contagem de votos desastrosa. Nesta semana, Sanders liderou a votação no estado de New Hampshire.
No final deste mês, a campanha democrata segue para Nevada e Carolina do Sul antes das disputas da Super Terça-feira em estados pesados, como Califórnia e Texas.
Em seu discurso de vitória em New Hampshire, Sanders disse aos extasiados apoiadores: “Nós estamos indo para Nevada, estamos indo para a Carolina do Sul, vamos ganhar as próximas também… Deixem-me dizer que esta vitória aqui é o começo do fim para Donald Trump.”
A confiança de Sanders em ir à batalha contra Trump pela Casa Branca se deve à mesma razão pela qual Trump o teme: Sanders tem um movimento de base formidável de apoiadores e organizadores de campanhas. Ninguém entre os outros candidatos democratas inspirou a mesma verve entre os apoiadores. Sanders utilizou grupos demográficos cruciais de jovens, estudantes, trabalhadores e minorias étnicas. Ele parece ter galvanizado esse poder vital invejável – impulsionar o povo.
Outra arma política importante é a relevância das políticas. Como Sanders disse: “Nossa agenda fala da dor das famílias trabalhadoras deste país”.
Depois de Iowa e New Hampshire, as estrelas eleitorais da senadora Elizabeth Warren e de Joe Biden, ex-vice-presidente de Obama, esmaeceram.
No entanto, Pete Buttigieg e a senadora Amy Klobuchar emergiram como dois candidatos que disputam com Sanders a indicação democrata. Eles vieram em segundo e terceiro, respectivamente, nas primárias de New Hampshire.
Ambos os candidatos eram relativamente desconhecidos até recentemente. Klobuchar até brinca que os eleitores não sabem como se escreve seu nome na maioria das vezes. Enquanto Buttigieg, ex-prefeito de South Bend, Indiana, tem uma imagem de menino e uma carreira militar opaca como soldado no Afeganistão com supostos vínculos com operações secretas da CIA.
Há mais do que uma suspeita de que a hierarquia do Partido Democrata esteja preparando Buttigieg e Klobuchar para se apresentarem como os candidatos “centristas” em uma tentativa de maximizar o apelo aos eleitores tradicionais.
Como o New York Times colocou esta semana: “A competição democrata parece estar se voltando para a questão de saber se o partido se moverá para a esquerda com Sanders, um socialista democrático, ou para o centro com Buttigieg ou mesmo a senadora Amy Klobuchar, que ficou em um forte terceiro”.
O jornal deixou escapar a possibilidade de uma costura do partido contra Sanders ao admitir que “as estruturas tradicionais do Partido Democrata estão prestes se mobilizarem contra Sanders por medo de sua revolucionária caracterização como socialista democrático”.
Ao negar a Bernie Sanders a chance de concorrer à presidência em 2016, a máquina do Partido Democrata não só esnobou os desejos democráticos de membros comuns do partido e do eleitorado mais amplo, ela inevitavelmente deixou o azarão Donald Trump colher o enorme descontentamento entre os cidadãos americanos cansados do duopólio de belicistas de Washington, também conhecido como “o pântano”.
É aqui que as maquinações táticas e antidemocráticas de 2016 correm o risco de se repetir com consequências desastrosas. Naquela época, Bernie Sanders havia energizado jovens e trabalhadores por mudanças radicais em Washington, semelhante ao que ele está fazendo novamente neste ciclo eleitoral. Mas o alto escalão democrata achou há quatro anos que sabia melhor ao apoiar Hillary Clinton como candidata à presidência. O fisiologismo fétido da hierarquia do Partido Democrata não podia ver que Clinton era desprezada por muitos americanos comuns por seu centrismo anódino e conexões com as altas rodas.
Dada a terrível desigualdade econômica e o colapso social nos EUA, o que é necessário é um candidato que possa incitar a indignação popular contra a oligarquia dos EUA e seu Estado predatório e capitalista. Isso não é possível sendo um “centrista” medíocre e inofensivo. Um ataque político total contra o apodrecido sistema se faz necessário.
Em uma entrevista ao Independent da Grã-Bretanha, o irmão mais velho de Bernie Sanders, Larry, deu a seguinte visão de por que ele é o homem a enfrentar Trump.
Larry (84), um acadêmico aposentado e ativista político que vive na Grã-Bretanha, disse: “As eleições serão disputadas sobre essas grandes questões: as questões de quem recebe o quê, se riqueza e renda são direcionadas aos bilionários ou se todos têm a chance de uma vida decente. Dentro disso, os democratas – se forem liderados por Bernard – vencerão. Se forem liderados por algum meio-termo leniente, eles terão muito mais dificuldade. Deu Trump porque havia décadas de meio-da-estrada. Meio-da-estrada não significa o meio, significa que os poderosos não são desafiados.”
Bernie Sanders, ao que parece, conquistou o espírito do tempo vencedor. E Trump sabe disso – ao contrário dos burocratas do Partido Democrata.
* Articulista da RT e Sputnik