Em dezembro do ano passado a inflação oficial, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), disparou por culpa da carne bovina e, logo, dos chineses, que resolveram aumentar a importação do produto brasileiro, assim analisavam o governo e seus analistas de plantão. Nem passou pela cabeça deles que qualquer governo sério tem política de abastecimento para garantir a alimentação de sua população.
Os preços disparam, mas, segundo os dados oficiais “a inflação está sob controle”. O IPCA fechou o ano em 4,31% no primeiro ano do governo Bolsonaro,
Porém, para o povo brasileiro, estes dados estão muito longe de explicar os seguidos aumentos nos alimentos em geral, nos transportes públicos, nos combustíveis (já tem lugar vendendo gasolina a R$ 5,00), nos aluguéis, planos de saúde, remédios, na conta de luz e o impacto no custo de vida nas famílias de milhões de brasileiros.
“Inflação sob controle” não é o que diz e sente a grande maioria da população brasileira que assiste a volta diária das maquininhas de preços nos supermercados. “50 reais não enchem mais nem uma sacola”, diz dona Vera, de 71 anos, enquanto recolhe a compra de poucos itens em um supermercado na zona sul de São Paulo.
Assim como boa parte dos brasileiros, a renda mensal de Vera é de um salário mínimo, que corresponde a R$ 998 até dia 1º de fevereiro.
CESTA BÁSICA
Não foi só o preço da carne que disparou em 2019. Os itens da cesta básica – que no ano passado consumiam a metade de um salário mínimo – subiu em 16 de 17 capitais neste período. Os números são do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos): Vitória, +23,64%; Goiânia, +16,94%; Recife, + 15,63%; Natal, +12,41%; Rio de Janeiro, +10,75%; Belo Horizonte, +8,86%; São Paulo, +7,44%.
A cesta básica em São Paulo, em dezembro de 2019, estava em R$ 506,50, comprometendo 50,73% do salário mínimo. Além da alimentação básica, se adicionada a conta de luz, o transporte, o remédio e o botijão de gás, não sobra para a carne: que aliás, teve uma variação de preços de +32,4% no ano passado, segundo o IPCA. Um movimento “natural do mercado”, disse Jair Bolsonaro.
Mas, para a grande maioria da população – para os trabalhadores, ou para os 11,2 milhões de desempregados, ou os 38,8 milhões de brasileiros que estão na informalidade – os preços estão batendo no teto e não há nada de natural e nem de controlado nisso. Os índices de inflação não refletem a carestia, o encarecimento do custo de vida. Isto porque a inflação oficial da qual se fala nos corredores dos supermercados ou à mesa do almoço pouco tem a ver com a renda arrochada e congelada dos trabalhadores, dos aposentados ou daqueles que estão vivendo de “bico”.
Para seguir com os exemplos, os preços administrados pelo governo são também os que a população mais reclama. Para se assustar com o preço do botijão de gás, por exemplo – que de acordo com a ANP (Agência Nacional de Petróleo) custava, em média, R$ 66,53 em 2018 – basta uma pesquisa rápida nos centros de distribuição de São Paulo para descobrir que é difícil encontrar por menos de R$ 92,00 (preço de janeiro de 2020).
COMBUSTÍVEIS
Os preços dos combustíveis também dispararam no ano passado. A gasolina ficou, em média, 4,85% mais cara nas bombas depois do primeiro ano do governo Bolsonaro. O preço médio do litro subiu de R$ 4,34 no fim de 2018 para R$ 4,55 no final de 2019. O etanol sofreu o maior reajuste dentre os combustíveis, somando 11,51% no ano. O litro do óleo diesel teve aumento de 8,7% no ano, passando de R$ 3,451 em 2018 para R$ 3,751 em 2019.
E os preços continuam subindo. No início deste ano, de acordo com a ANP, o valor médio da gasolina por litro nas bombas subiu 0,07%, para R$ 4,558, na semana encerrada em 4 de janeiro. Foi o décimo aumento seguido. O preço do diesel avançou 0,75% para R$ 3,779 por litro, em média, e o preço do etanol também teve alta de 0,54%, para R$ 3,174 por litro.
CONTA DE LUZ E TRANSPORTE PÚBLICO
A energia elétrica continua à mercê das bandeiras tarifárias e da boa vontade de Dom Pedro, mas, faça chuva ou faça sol, o consumidor paga uma das mais caras tarifas do mundo. E o transporte público, em média, está em R$ 4 reais nas grandes cidades, chegando R$ 4,70 em Porto Alegre.
SALÁRIO ARROCHADO
Enquanto isso, o reajuste no salário não chegou nem perto do que percentualmente o crescimento dos preços significa. Em vigor a partir de 1º de fevereiro, o novo salário mínimo será de R$ 1.045 (+4,71% sobre o salário de 2019). Parece difícil para uma família sobreviver nessas condições – e no governo de Bolsonaro há 54 milhões de pessoas que vivem com menos que isso.
E como disse um certo economista, o reajuste no salário mínimo não compra nem um quilo de carne de segunda.