Com juro real nas alturas, “viver de renda se tornou o bom negócio”, afirma Josué Gomes
O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Josué Gomes da Silva, voltou a criticar a prática de juros altos no Brasil, que impossibilita a indústria de transformação nacional de retomar o seu protagonismo do passado. “Ao logo de 50 anos, crescemos a um média de mais de 7% ao ano, perdemos esse dinamismo”.
“Se nós não recuperarmos a indústria de transformação nacional, dificilmente teremos um desenvolvimento econômico e social compatível com as necessidades de nosso país”, afirmou Gomes Da Silva, nesta terça-feira (23) no seminário “A indústria no Brasil hoje e amanhã – a importância do ambiente econômico para o futuro do setor industrial” -, um evento produzido pelo Jornal O estado de São Paulo, com o apoio da Fiesp, Ciesp, Firjan e CNI.
De acordo com o presidente da Fiesp, no passado a produtividade na indústria de transformação brasileira correspondia ao equivalente de cerca de 55% da produtividade da indústria de transformação dos EUA.
“Hoje está em torno de 25%, aliás, caindo, talvez já esteja aproximando-se de 20%”, destaca Josué Gomes, ao apontar o elevado juros entre as principais causas para a queda de produtividade da indústria manufatureira brasileira. “A taxa de juros real ao longo desses 30 anos é 10 vezes maior do que a taxa de inflação. No Brasil viver de renda se tornou o bom negócio. Produzir é um péssimo negócio”, criticou o empresário no setor têxtil.
“O custo de capital absolutamente é incompatível com a atividade produtiva, especialmente de um setor que é mais intensivo em capital, seja no que se refere aos investimentos em bens de capital, em edificações e instalações, seja no que se refere ao uso de capital de trabalho, já que são os setores muito mais longos e, portanto, muito mais intensivos em capital de trabalho”, afirmou o presidente da Fiesp e dirigente da empresa Coteminas.
“O Plano Real pôs fim a um flagelo nacional que era a hiperinflação. Mas, infelizmente, algo que deveria ser transitório, como instrumento de também ajudar no combate à hiperinflação e a quebra da inércia inflacionária, que era uma taxa de juros real alta, acabou se transformando em algo permanente”, criticou e seguiu.
“Ao longo dos últimos 30 anos se nós tivéssemos aplicado R$ 100 há 30 anos atrás, no dia da criação do plano real, em CDI, em títulos públicos denominados ou corrigidos pelo CDI, sem qualquer spread bancário, nós teríamos hoje R$ 8.093, enquanto um bem ou um serviço que custava R$ 100 há 30 anos atrás, hoje custaria, em média, se medido pelo IPCA, R$ 808. Ou seja, a taxa de juros real ao longo desses 30 anos é 10 vezes maior do que a taxa de inflação. No Brasil viver de renda se tornou um bom negócio. Produzir é um péssimo negócio”, condenou o empresário.
Segundo Josué Gomes Da Silva ainda, se considerar “os 25 anos desde a criação do tripé macroeconômico [câmbio flutuante, meta de inflação e meta fiscal], colocado em prática por Armínio Fraga [presidente do Banco Central, entre 1999 e 2002], nós vamos ver que a taxa de juros, em média, foi de 12,4% contra uma taxa de inflação medida pelo IPCA de menos de 6,5%. [Isto significa] uma taxa de juros real de quase 6% ao longo de 25 anos. 25 anos dos quais, em pelo menos 15 ou 20 anos, nós convivemos com taxas de juros reais negativas no mundo desde 2008”, observou.
“Ora, como que um setor que é altamente intensivo em capital geraria recursos necessários para manter a sua produtividade, para investir em bens de capitais modernos pari passu com seus competidores, se por um lado você não pode tomar recursos de terceiros porque eles são proibitivos e [do outro], você tem uma carga tributária pesada, o que faz com que a sua geração própria de caixa, que é outra fonte de investimento, também seja diminuída? Como se quer que se mantenha produtividade num contexto como esse?, questionou o presidente da Fiesp.
O empresário defende que o estado brasileiro precisa alavancar mais investimento para a sua indústria, assim como fez num passado não muito distante para o agronegócio.
“Temos que aplaudir o grande desenvolvimento do agro brasileiro, mas temos que lembrar que desde 2003 ele conta com o Plano Safra, que cresce ano a ano. O deste ano, são R$ 475 bilhões. Grande parte deles mostrando não só uma estabilidade de planejamento em termos de recursos disponíveis, como também reduções implícitas ou explícitas de juros. Além disso, é um setor que paga muito pouco imposto. A carga tributária sobre a indústria de transformação é de 45% do seu valor adicionado, em média. No agro é menos de 5%. Nada contra o Agro, pelo contrário, nós temos que aplaudir e entrar na mesma porta que eles entram. Mas, se nós não recuperarmos a indústria de transformação nacional, dificilmente teremos um desenvolvimento econômico e social compatível com as necessidades de nosso país”.
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