A economista Monica De Bolle, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University, em sua coluna no Estadão da quarta-feira (18), aponta que os negacionistas que imperam no governo Bolsonaro, “também, não poderiam estar em outro lugar senão dentro do Ministério da Economia”.
“A segunda onda da pandemia é tão certa quanto a existência do vírus que a provoca. Ela já está evidente em vários números: o de leitos ocupados nos hospitais, o de novos casos, o de óbitos. Mesmo assim, há quem a negue”.
“Claro que há quem a negue e é claro, também, que os negacionistas não poderiam estar em outro lugar senão dentro do Ministério da Economia, afirma De Bolle, se referindo a um dos secretários do ministro Paulo Guedes “que veio a público dizer que não há onda alguma e que os Estados brasileiros estão muito bem, obrigado, porque muitos já obtiveram a imunidade de rebanho”.
“Lembram-se dela? Lembram-se de como teve gente insistindo que era esse o caminho, o modelo da Suécia? ‘Deixem a infecção natural acontecer, que logo, logo estará todo mundo imune!’, bradou a estupidez brutal”, lembrou De Bolle em seu artigo “Estupidez Brutal”
“É curioso porque a Suécia acaba de abandonar o modelo sueco por causa da segunda onda e acaba de abandoná-lo devido à segunda onda porque já está comprovado, inclusive na Suécia, que imunidade de rebanho é conceito inaplicável a uma situação de infecção natural. Como já escrevi neste espaço, o termo usado por epidemiologistas se refere àquelas situações em que existe uma vacina para uma doença infecciosa com eficácia comprovada”.
“Por exemplo, se a eficácia das vacinas genéticas da Pfizer e da Moderna forem comprovadas, quando começarem a ser distribuídas e as campanhas de imunização estiverem em andamento, seremos capazes de dizer algo sobre imunidade de rebanho. Mas não agora. E certamente não será pelo secretário de Guedes, que já revelou não entender nem de pandemia, nem de economia. Trata-se do mesmo secretário que inventou conceitos inexistentes na disciplina, como PIB privado. Melhor nem perguntar o que é”, enfatizou De Bolle.
De Bolle lembra o mês de março, exatamente o dia 16 de março. “Nesse dia, quando a pandemia já estava presente no Brasil, o ministro da Economia veio a público dizer que a economia cresceria mais de 2,5% em 2020. Perto da mesma data, Paulo Guedes também disse que enxotaria o vírus do País jogando sobre o RNA encapsulado uns R$ 5 bilhões. Não se deu conta de que o RNA encapsulado não reage nem às notas, nem às palavras que profere. A única coisa da qual ele precisa é de uma célula hospedeira para parasitar, replicar e se proliferar. Dito e feito, a primeira onda estourou bem na cara do ministro. Com volúpia”.
Passados oito meses da tragédia, que já ceifou a vida de mais de 166 mil brasileiros, não saímos nem da primeira onda e a economia segue estagnada no mesmo patamar de antes da pandemia, o desemprego explodiu e milhares de empresas fecharam as portas, segundo os indicadores do IBGE. E todas as previsões apontam para recessão da economia este ano. Já o ministro Guedes diz que a economia está crescendo em “V” e que vamos “surpreender o mundo”.
A iniciativa de maior impacto, o auxílio emergencial de R$ 600, que Guedes resistiu, foi uma construção do Congresso Nacional, juntamente com economistas e setores da sociedade civil, assim como o Pronampe, a desoneração da folha de pagamento para 17 setores que mais empregam, entre outras.
Passada essa fase, mais uma vez o negacionismo militante tenta se firmar. A situação do Orçamento da União para 2021, parado no Congresso, é a maior expressão disso.
Devido ao irrealismo dos seus números, tentando desconhecer o desdobramento da crise para 2021, fixando-se na inexequível Lei do Teto de Gastos, já denunciado pela economista em seus artigos e lives, é mais uma vez a trava de Guedes e Bolsonaro.