O desmatamento da Amazônia de janeiro a junho de 2020 foi 25% superior ao do mesmo período em 2019, aponta o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Durante esse semestre, 3.069,57 km² da Amazônia foram desmatados. Somente em junho, o sistema Deter, do Inpe, alertou para o desmatamento em 1.034,4 km².
Em relação a junho de 2019, o desmatamento cresceu 10,65% e foi o maior com mais desmatamento dos últimos cinco anos.
É o 14º mês seguido com crescimento do desmatamento, e é o maior desde 2016.
De agosto de 2019 até agora, o Inpe já identificou o desmatamento de 7.566km². Comparado com o mesmo período entre 2018 e 2019, que teve 4.589km² desmatados, o aumento foi de 65%.
No segundo semestre se inicia a estação seca da Amazônia e os madeireiros aproveitam disso para aumentar as queimadas.
O número de queimadas em junho de 2020 foi o maior para o mês dos últimos 13 anos. 2.248 focos de incêndio na Amazônia, um aumento de 19,6% em comparação com o mesmo mês do ano passado quando foram registrados 1.880 focos.
Desde 2007 o Inpe não identificava mais de 2 mil focos de incêndio.
Dos R$ 60 milhões previstos para o combate ao desmatamento, apenas 0,7% foi utilizado.
Apesar da contundência dos dados do Inpe, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, que coordena o Conselho da Amazônia, alegou que as discussões sobre desmatamento são “conversa de bêbado”.
“Só no ano que vem, quando vai passar o satélite de novo, vamos poder comprovar que nossos esforços para reduzir o desmatamento na Amazônia surtiram efeito. Até lá, é conversa de bêbado: eles [fundos estrangeiros] dizendo uma coisa e nós argumentando outras”, disse o vice-presidente. “Os europeus, assim com a maioria dos brasileiros, desconhecem o que é a Amazônia”, disse à coluna de Lauro Jardim, do jornal O Globo.
Com Bolsonaro na presidência da República, o desflorestamento da Amazônia cresce rapidamente.
O agronegócio e 38 empresários estrangeiros e nacionais estão cobrando do governo medidas efetivas de preservação do meio ambiente. Eles enviaram carta a Mourão cobrando ações em defesa do meio ambiente.
Os signatários, muitos deles empresas internacionais, afirmam que o descalabro patrocinado pelo ministro Ricardo Salles na Amazônia dificulta a venda de produtos brasileiros no exterior. “Na Europa, sobretudo, a preservação do meio ambiente é um tema sensível, tanto que as ameaças ao acordo de livre-comércio entre União Europeia e Mercosul são motivadas pela crise no Brasil”, diz um trecho na carta. “Todos necessitam que o Brasil tenha uma boa reputação no exterior para não sofrerem boicotes de seus produtos, seja por parte de governos, seja pelos próprios consumidores estrangeiros”, acrescentou o documento.
Na quinta-feira (9), Mourão conversou com investidores estrangeiros que também estão preocupados com as queimadas na região.
Na entrevista, Mourão tomou a defesa do cada vez mais questionado ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Ele afirmou que “críticas têm sido feitas, principalmente em relação ao ministro Ricardo Salles, e eu quero deixar claro aqui que essas críticas não estão sendo justas”.
Desde que assumiu o Ministério, Salles tem se ocupado em desmantelar a estrutura de fiscalização do ministério. E facilitar a invasão de madeireiros e garimpeiros ilegais na Amazônia e em terras indígenas.
MPF
O MPF (Ministério Público Federal) entrou com uma ação de improbidade administrativa contra o ministro. A acusação é de desestruturar de forma dolosa as estruturas de proteção ao meio ambiente. Ver MPF pede na Justiça o afastamento do ministro do Meio Ambiente
Na ação, 12 procuradores da República pedem o afastamento do ministro do cargo em caráter liminar (urgente) e a condenação dele nas penas previstas pela lei de improbidade administrativa, como perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa e proibição de contratar com o poder público e de receber benefícios e incentivos fiscais ou creditícios.
A ação judicial do MPF enumera 14 atos, medidas, omissões e declarações de Ricardo Salles que inviabilizaram a proteção ambiental e assim contribuíram decisivamente para a alta do desmatamento e das queimadas, sobretudo na região amazônica.
Um dos fatos apontados pelo MPF é que o ministro exonerou, no final de abril de 2020, três coordenadores da fiscalização ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, Olivaldi Azevedo, Renê Oliveira e Hugo Loss. As exonerações ocorreram após ações de fiscalização nas terras indígenas Ituna Itatá, Apyterewa , Trincheira-Bacajá e cachoeira seca, na região de Altamira, onde as equipes do Ibama conseguiram reduzir drasticamente o desmatamento após o aumento, em 2019, que chegou a 754%. Nas operações, que ocorreram no mês anterior às suas exonerações, os fiscais destruíram cerca de 100 máquinas e equipamentos utilizados por quadrilhas para cometer crimes ambientais, número superior ao de todo ano de 2019. Em vez do reconhecimento pela eficácia do trabalho, perderam os cargos, no que o MPF considera uma evidente retaliação.
Após decreto de Bolsonaro, Ibama deixou de registrar multas em seu sistema
Na reunião ministerial de 22 de abril, tornada pública pelo Supremo Tribunal Federal, Salles – que é homem de confiança de Bolsonaro – defende aproveitar o período da pandemia para destruir a legislação de proteção ao meio ambiente. Nas palavras dele, “ir passando a boiada e mudando todo o regramento”.
“Então, para isso, precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), de ministério da Agricultura, de ministério de Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo. Agora é hora de unir esforços pra dar de baciada a simplificação”, disse o ministro, conforme a transcrição disponibilizada pelo STF.
Salles prossegue, afirmando que o governo federal “não precisa de Congresso”, ainda mais “nesse fuzuê”, provavelmente referindo-se à falta de base de apoio ao governo. E sugere: “Agora tem um monte de coisa que é só, parecer, caneta, parecer, caneta. Sem parecer também não tem caneta, porque dar uma canetada sem parecer é cana. (…) Isso aí vale muito a pena. A gente tem um espaço enorme pra fazer”.
Ele chegou a dar um exemplo do que seria “dar de baciada”, citando uma “simplificação na lei da Mata Atlântica”. “Hoje já tá nos jornais dizendo que vão entrar com medi (…) com ações judiciais e ação civil pública no Brasil inteiro contra a medida”, comenta ele.
As mudanças às quais ele se refere dizem respeito a um despacho assinado em abril que permite a produção em áreas de preservação da Mata Atlântica que foram desmatadas e ocupadas até julho de 2008. Uma anistia para os desmatadores.
O Ministério Público ajuizou uma ação na Justiça contra o ato. Mas antes de ter uma decisão judicial contrária, pressionado, Salles revogou sua medida.
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