Após aprovar a “reforma” da Previdência, que obrigou os trabalhadores a se aposentarem muito mais tarde e de uma “reforma” trabalhista que precarizou as relações de trabalho, agora o governo Bolsonaro ressuscita uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 18) que pretende fazer com que os filhos do povo entrem mais cedo para o mercado ao legalizar o trabalho de adolescentes a partir dos 14 anos em qualquer atividade.
Em sessão da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados, na última quarta-feira (10), em que se discutia a PEC, o deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) classificou a matéria como “retrocesso civilizatório” e uma “vergonha para o parlamento brasileiro”.
“É preciso que o Brasil saiba que querem colocar as nossas crianças para trabalhar na idade que elas devem estudar, devem ter acesso à cultura, ao esporte, à vida. É preciso que o nosso povo saiba o risco que a nossa juventude vive se aprovarmos um projeto com esse conteúdo. É um retrocesso civilizatório o que está se pretendendo fazer nessa Casa”, denunciou Orlando.
A PEC 18 de 2011 pretende mudar o texto constitucional que proíbe qualquer trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos. Desde 1998, a Constituição permite que jovens com mais de 16 anos trabalhem – antes disso, apenas na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
O objetivo da PEC 18, e suas correlatas, é permitir que o adolescente nessa faixa etária desempenhe quaisquer atividades sob o regime de tempo parcial – mesmo atividades insalubres ou que acarretem riscos aos menores.
“Do jeito que a coisa anda nesta Casa, eu não vou ficar surpreso se algum deputado bolsonarista apresentar uma proposta de emenda à Constituição revogando a Lei Áurea e reintroduzindo o trabalho escravo no Brasil. Não será nenhuma surpresa, presidente, porque essa tem sido a postura: retirada de direitos, violação da dignidade. É muita cara de pau defender essa proposta. Repito, cara de pau”, disse Orlando.
Entre os marcos regulatórios da atividade de menor aprendiz está a Lei nº 10.097, de 19 de dezembro de 2000 que estabelece que “a validade do contrato de aprendizagem pressupõe anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, matrícula e frequência do aprendiz à escola”, além de “inscrição em programa de aprendizagem desenvolvido sob a orientação de entidade qualificada em formação técnico-profissional metódica.”
Além disso, a legislação determina que “o trabalho do menor não poderá ser realizado em locais prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em horários e locais que não permitam a frequência à escola.”
O deputado Gilson Marques (Novo) votou junto com a oposição pela inversão de pauta da comissão para que não se debatesse a matéria nesta semana e denunciou que os deputados da base bolsonarista na CCJ sequer aparecem para votar as matérias. Chega de ter deputado defensor de PEC de telinha, que não vem trabalhar, eu vou votar a favor da inversão [de pauta] porque o relator não está aqui. O autor não está aqui. A gente tem que trazer para a comissão gente que defenda sua posição”, defendeu Gilson.
“Quem está aqui, do governo, que é a favor da PEC para ajudar? É desvantajoso debater com dez deputados [da oposição] combativos que, por mais que eu não concorde com eles, estão aqui trabalhando desde cedo.”
Logo após a intervenção de Gilson, Orlando Silva afirmou que “eles não estão aqui, deputado Gilson, estão se escondendo no painel e no aplicativo porque não tem coragem de vir aqui defender essa tese absurda de violar a infância no Brasil.”
A proposta está na pauta para apreciação na próxima terça-feira (16).