Polícia Federal apura a participação do ex-ministro bolsonarista nas operações ilegais da PRF para impedir ou dificultar o acesso dos eleitores de Lula às sessões eleitorais no 2º turno presidencial, nos Estados – e cidades – onde o atual presidente teve ampla vantagem no 1º turno
O depoimento do superintendente da Polícia Federal na Bahia, Leandro Almada, durante as eleições de 2022, aumentou, ainda mais, as já fortes suspeitas sobre o envolvimento do ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, Anderson Torres, na manipulação da Polícia Rodoviária Federal (PRF), através de várias blitze, para atrapalhar a presença de eleitores de Lula no segundo turno daquele pleito.
O delegado Almada é considerado peça-chave no inquérito da PF que investiga o ex-ministro bolsonarista, hoje em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica, depois de um bom período nas grades em consequência das apurações em torno de um outro episódio diretamente relacionado à tentativa de golpe no dia 8 de janeiro, quando Torres estava à frente da segurança pública do Distrito Federal.
A origem da investigação deflagrada pela PF está no fato de a maior parte das blitze da PRF concentrarem-se nos redutos onde o atual presidente teve ampla vantagem sobre Bolsonaro no 1º turno das eleições presidenciais. Na Bahia, por exemplo, Lula ficou à frente do adversário com 69,7% de votos, enquanto Bolsonaro ficou teve apenas 24,3%. Não por acaso, foi na Bahia que a PRF, a mando do então dirigente da instituição, Silvinei Vasques, um declarado bajulador bolsonarista, concentrou os bloqueios para dificultar ou, mesmo, impedir a chegada dos eleitores de Lula nas sessões eleitorais no 2º turno.
Em seu depoimento, o delegado da PF tocou em pelo menos 4 pontos, revelados pelo jornal O Globo, que agravam a situação de Anderson Torres.
LISTA DE CIDADES
O delegado disse que recebeu em reunião da qual participou Torres e o diretor-geral da PF à época, Márcio Nunes, um pedido para reforçar o policialmente ostensivo no dia do 2º turno do pleito eleitoral, tendo havido, inclusive, a indicação de algumas cidades que deveriam ser alvo dessas blitze por parte da corporação.
Disse ele: “A gente foi informado, sim, que tinha algumas localidades especificamente, não sei se em função do número de eleitores ou pela cobertura da cidade, enfim. Houve sim, foi encaminhada uma sugestão de cidades para que fosse reforçado”.
Tal reforço consistiria em mandar equipes ostensivas para essas localidades, “ir lá, ver no TRE, ou na polícia local, conseguir uma base e ficar lá aguardando as demandas”. O delegado acrescentou: “Houve uma relação de cidades. Eu não tenho, mas houve”. Almada comprometeu-se a procurar a lista e enviá-la aos responsáveis pelo inquérito.
SUGESTÃO “INADEQUADA” DE ATUAÇÃO COM A PF
O ex-superintendente na Bahia contou também que recebeu, tanto de Torres como de Márcio Nunes, uma “sugestão” para que a PF atuasse em conjunto com a PRF na data do segundo turno, o que ele avaliou como “inadequado”, razão pela qual não se concretizou, pois trata-se de uma atividade que foge inteiramente do escopo de competências dos policiais federais.
Afirmou ele: “Nesse dia também, além do reforço, foi sugerido que a gente atuasse também em conjunto com a PRF”. “A gente alinhou depois dessa reunião, quando eles foram embora, que a gente não… Entendendo inadequada essa ação conjunta, a gente atuaria sozinhos, dentro do nosso planejamento da PF. E foi o que ocorreu”, afirmou Almada.
PRETEXTO DE “ANORMALIDADE” EM COMPRA DE VOTOS
A reunião, realizada cinco dias antes do 2º turno, segundo Almada, concentrou-se no processo eleitoral, ocasião em que Torres e Nunes “pediram para reforçar bastante a nossa parte ostensiva no dia do segundo turno, porque eles ouviram relatos de uma compra de votos muito grande que estaria ocorrendo no Estado da Bahia”.
No entanto, não foi citada uma única prova ou indício que corroborasse com as suspeitas, tratando-se, obviamente, de um pretexto utilizado na flagrante tentativa de manipulação da PRF.
FAKE NEWS SOBRE FACÇÃO CRIMINOSA PRÓ-LULA
Almada foi mais longe ao informar que durante o encontro houve até compartilhamento de informações falsas com o então ministro da Justiça e o chefe da PF, que teriam comentado sobre a existência de “facções criminosas em Salvador estariam nitidamente apoiando candidato do PT” e “constrangendo eleitores em seções eleitorais”, com uso de armas de fogo, “a votarem em determinados candidatos”, sem, também, apresentarem qualquer prova ou indício, pois nada mais era do que fake news.