Em agosto, o condenado e ex-presidiário disse que pediria o afastamento de Avalanche por suas ligações com a facção criminosa. Depois mudou de ideia. Datena disse que a mudança de posição é porque “ele levou uma chegada” do bando
A ousadia do crime organizado está chamando a atenção das autoridades brasileiras nessas eleições. Depois da passagem de Bolsonaro pelo Planalto, eles passaram a operar em vários setores da sociedade, desde o mercado financeiro até a política. Agora, um elemento com uma vasta ficha criminal, que foi preso e condenado por roubo qualificado e estelionato, que integrava uma quadrilha de golpes bancários, tenta chegar à Prefeitura de São Paulo.
Mais do que isso. Recentemente, o jornal Estado de S. Paulo mostrou que aliados do presidente do PRTB, partido usado por Pablo Marçal para disputar o pleito na capital, participaram de um esquema de troca de carros de luxo por cocaína para a organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Em um áudio revelado pelo jornal “Folha de S.Paulo”, Leonardo Avalanche, presidente do PRTB, aparece afirmando que mantém vínculo com a facção paulista.
QUEM É O CHEFE DO PARTIDO DE MARÇAL
Leonardo Alves de Araújo, conhecido como Léo Avalanche, é o presidente nacional do PRTB. Ele disse a um colega de partido, em fevereiro deste ano, que mantém relações com integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).
Na gravação, Avalanche fala com Thiago Brunelo, filho de um dos fundadores do PRTB. O diálogo ocorreu em meio a uma disputa interna do partido, após o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decretar intervenção na sigla.
“Não tem o Piauí, de [inaudível]? Não tem o chefe do PCC que está solto? Ele é a voz abaixo”, disse Avalanche, referindo-se ao seu motorista. “Ele nunca mexeu com política. Hoje ligaram para o menino, né, lá dentro da cadeia e falaram: ‘Estou trabalhando pro Avalanche de motorista’”.
Segundo a Folha de São Paulo, o Piauí citado por Avalanche seria Francisco Antonio Cesário da Silva, ex-chefe do PCC na favela de Paraisópolis, zona sul da capital. O motorista do político seria, na versão dele, um aliado do criminoso na facção. A conversa foi registrada em um áudio divulgado em 8 de agosto pelo jornal Folha de S. Paulo.
EU SOU O CARA QUE SOLTOU ANDRÉ [DO RAP]
“Eu sou o cara que soltou o André [do Rap]. A turma não sei se vai te contar isso. Esse é o meu trabalho, entendeu? A próxima, agora, a gente vai botar um lugar acima dele. Esse é o meu dia a dia […] Eu faço um trabalho bem discreto”, afirmou o presidente da legenda de Pablo Marçal (PRTB) na gravação.
Em 26 de agosto, em uma sabatina na Globonews, já desmascarado pela participação na quadrilha de golpes bancários em Goiás, Marçal foi questionado sobre o PCC e Leonardo Avalanche, quando afirmou que iria se livrar dele. “Eu vou fazer isso. Vou deixar formalizado da minha parte [o pedido de afastamento do Avalanche]”, afirmou. Ele ainda afirmou que já havia solicitado informalmente o afastamento de Avalanche, mas o presidente da sigla recusou, alegando que vai “provar sua inocência”, disse na época.
Em outras ocasiões, Pablo Marçal afirmou que era Avalanche quem teria que responder sobre as acusações de relações com o PCC. Outros elementos acusados de pertencerem ao PCC e estarem na empreitada de Marçal de ocupar a prefeitura da maior cidade do país são Tarcísio Escobar de Almeida, ex-presidente estadual do PRTB, e Júlio César Pereira, o Gordão, sócio de Escobar que também participou de eventos da sigla.
PCC DEU UMA ‘CHEGADA’, DIZ DATENA
Agora, na quarta-feira (4), ao ser flagrado num evento com Avalanche, Pablo Marçal muda o tom e sai em defesa de presidente do PRTB: ‘Esse cara não é do PCC’”, jurou.
O candidato do PSDB, José Luiz Datena, ironizou a situação de Marçal nas redes sociais. “Primeiro o ‘PCC Marçal’ disse que o presidente do partido dele deveria se afastar dos amigos que tem do PCC. Depois, acho que levou uma ‘chegada’ por parte do presidente do partido dele e teve que arregar para ele e para o PCC. Voltou atrás dizendo que o cara é uma figura honrada, uma pessoa maravilhosa”, afirmou, em vídeo divulgado por sua campanha.
Recentemente, numa agressão a uma jornalista, no programa Roda Viva, o ex-presidiário quis corrigir o que a profissional fazia e ela rebateu. “O senhor é coach, eu sou jornalista. Quando o senhor foi preso pela primeira vez, em 2005, eu estava cobrindo o Mensalão”, afirmou Malu Gaspar, deixando o ex-coach sem reação. Em sabatina na Folha de São Paulo, Marçal admitiu que não pretende cumprir nenhuma proposta de governo. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, também vem aparecendo na TV para combater Marçal.
ÁUDIOS DA PRISÃO
Na semana passada vieram a público os áudios obtidos pela Polícia Federal com os detalhes da prisão de Marçal e da quadrilha de golpes bancários da qual ele fazia parte. As trocas de mensagens revelam como agia a quadrilha. Marçal era responsável no bando para roubar e-mails de pessoas que seriam vítimas dos golpes bancários. Ele usava o codinome de “delegado federal”. Numa dos áudios, o chefe da quadrilha o repreende pelo codinome. “Tira essa porra daí”, diz o chefão Danilo Oliveira.
Os criminosos roubavam dados e informações das vítimas e, ainda, “infectavam” computadores e dispositivos digitais com programas conhecidos como “cavalos de Troia”. Marçal foi preso pela Polícia Federal e condenado em primeira instância a quatro anos e cinco meses de prisão por furto qualificado, em abril de 2010.
Marçal é investigado ainda pelos crimes de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita eleitoral e lavagem de capitais nas eleições de 2022, quando lançou sua candidatura ao Planalto. A PF suspeita que o meliante e seu sócio Marcos Oliveira tenham feito doações no valor de R$ 1,7 milhão à campanha e torrado o dinheiro com serviços de suas próprias empresas. O caso tramita em sigilo.
Ele foi barrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em meio a disputas pela liderança do PROS, sua sigla na época. Depois disso, ele concorreu a uma vaga na Câmara, mas teve o registro indeferido após o pleito. A PF chegou a cumprir diligências na casa do estelionatário em julho do ano passado. Marçal rebateu em suas redes sociais, afirmando que era vítima de “perseguição política”.
Leia reportagem abaixo com a transcrição dos áudios