O deputado Marcelo Calero (Cidadania-RJ) protocolou no Tribunal de Contas da União (TCU) um pedido para investigar a licitação aberta pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) para contratar uma empresa privada para monitorar queimadas na Amazônia.
“Pedi ao TCU para investigar a licitação aberta pelo Ministério do Meio Ambiente a fim de contratar sistema de monitoramento de queimadas na Amazônia. Por que tamanho interesse em fazer essa licitação, uma vez que o Brasil já possui sistema como esse, que é público e gratuito?”, questionou o deputado no Twitter.
“O ministério está pesquisando uma empresa que possa fazer serviços de monitoramento das queimadas na Amazônia, quando na realidade existe um sistema chamado DETER [Detecção de Desmatamento em Tempo Real] e esse sistema consegue com precisão – segundo especialistas que nós contatamos – cumprir essa função de monitoramento. Então pedimos ajuda ao TCU para entendermos, afinal de contas, por que o Ministério do Meio Ambiente tem tanto interesse em fazer uma licitação que tem por objeto a contratação de algo que ele não só já tem, como é público e é gratuito”, explicou o parlamentar.
Depois do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgar dados referentes ao aumento do desmatamento nos últimos meses, Jair Bolsonaro e seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, passaram a atacar o Instituto e afirmar que seus dados eram falsos. Bolsonaro chegou até mesmo a dizer que Ricardo Galvão, que presidia o Inpe, estava a serviço de uma ONG internacional.
Segundo a constatação do Inpe, o desmatamento em julho deste ano, na Amazônia, chegou a 2.254,8 km², ou seja, +278% que o desmatamento de julho de 2018 (596,6 km²).
“As autoridades sempre se incomodam quando os dados não dizem aquilo que elas gostariam de ouvir. A ciência sempre sofreu pressão de poderosos e seus resultados incomodam bastante; e as vezes em que os cientistas recuaram, não foi bom para a humanidade”, afirmou o renomado cientista Ricardo Galvão durante conferência realizada pela Pró-reitoria de Pesquisa da USP, no dia 16 de agosto, na própria USP.
Na conferência, o cientista criticou o ministro Ricardo Salles por querer trocar o INPE por uma empresa privada no monitoramento de queimadas da Amazônia.
Ele questionou o fato do ministro já ter anunciado o interesse de contratar os serviços da empresa Planet, sem antes ter feito uma licitação. E disse que as imagens de altíssima resolução vendidas pela empresa são caras e permitem um detalhamento que é desnecessário para o monitoramento em tempo real da Amazônia, como é feito pelo DETER.
Um dos argumentos que Salles e Bolsonaro usavam quanto aos dados do Inpe é de que a resolução dos equipamentos utilizados era baixa demais. “Imagine analisar a Amazônia inteira com uma resolução de dois metros. Para quê? Não preciso enxergar a porta para saber que uma casa está sendo derrubada”, respondeu Galvão. “Eu falei: ‘Ministro, não se mede a distância Rio-SP com uma régua de 10 cm. A copa de uma árvore da Amazônia tem diâmetro de 15 m, 20 m. Para que eu preciso de uma resolução de 2 m para um alerta de desmatamento?”.
“O DETER foi desenvolvido como serviço para o Ibama. Os dados estão lá [no sistema] diariamente”, enfatizou Ricardo Galvão em debate com o ministro no programa GloboNews.
Durante o debate, o ministro admitiu ter intenções de privatizar parte do sensoriamento. Apontou para a contratação de empresas estrangeiras para isso. “É tanto ‘ufanismo’ com coisa nacionalista, que ao invés de ter o melhor, a gente tem o que tem só por que é brasileiro”, reclamou.
“Vamos desenvolver um sistema mais avançado, mas usando a ciência brasileira. Pare com esse negócio de vender tudo para os americanos”, rebateu Galvão no programa da Globo.
Galvão concordou com Salles que “os sistemas têm que ser melhorados”, mas “isso tem que acontecer com a participação da ciência brasileira aqui no país”.
“Admiro-me que um servidor do governo diga ‘vou contratar a Planet’. Nem sabe ele que tem que fazer licitação e tudo mais, já fala da Planet”, criticou.
“Quem conhece isso é o Inpe, quem sabe fazer coisas é a Imazon, a Mapbiomas Alerta, várias universidades. Vamos desenvolver um sistema mais avançado, mas usando ciência brasileira”, afirmou.
Salles recuou de fazer a contratação sem licitação, mas sua intenção é privatizar o sistema de monitoramento.
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