Segundo o cientista, não se deve “colocar todos os ruralistas em um balaio só”. “A produção de soja quase que quintuplicou sem invadir áreas desmatadas na Amazônia. Tem um meio agroindustrial bem desenvolvido e para eles é importante a preservação da Amazônia”, disse
O ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, disse que o aumento do desmatamento e das queimadas na Amazônia prejudica o agronegócio brasileiro.
Para ele, não se deve “colocar todos os ruralistas em um balaio só”. “O Brasil tem um agronegócio moderno e muito bem desenvolvido” que está sendo prejudicado pela vista grossa que o governo Bolsonaro está fazendo para o desmatamento.
“A produção de soja quase que quintuplicou sem invadir áreas desmatadas na Amazônia. Tem um meio agroindustrial bem desenvolvido e para eles é importante a preservação da Amazônia, inclusive para enfrentar a competição externa”, disse em entrevista ao UOL.
Ele citou como exemplo o presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Brito, que critica a postura negacionista de Jair Bolsonaro e seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
“Tem também os agricultores, não só pecuaristas, que não são bem desenvolvidos e têm aquela ideia de sempre ocupar mais terras”, que são quem causam o desmatamento.
“Na questão do meio ambiente, se não fizermos nada, podemos chegar a um ponto de não retorno. Se a Amazônia for desmatada mais do que 25% ou 30%, a tendência de se tornar uma savana é irreversível, o que vai afetar todo o regime de águas no Brasil, o problema de crescimento do gás carbônico, da biodiversidade, vai afetar nossa agricultura”, afirmou Galvão.
“As ações têm que ser contínuas e com um controle muito forte da sociedade”.
O pesquisador disse que tem uma esperança de que a política do governo para a preservação da Amazônia mude com o vice-presidente Hamilton Mourão à frente do Conselho Amazônia, ao invés de Ricardo Salles.
Salles “tem uma percepção de que o desenvolvimento econômico da região é ortogonal à preservação, ele tem uma posição de que a preservação do meio ambiente atrapalha o país. Ele diz isso com as ações, como a de demitir fiscais do Ibama que confiscaram material e equipamento de desmatadores”.
“Eu tenho alguma esperança de que a política do governo vai mudar porque a pressão econômica é enorme. Não é possível que ele [Mourão] seja tão ignorante a ponto de colocar o Brasil numa situação mais difícil”.
“Não há desenvolvimento sustentável na Amazônia sem uma base científica sólida, sem a menor dúvida”.
Galvão acredita que as Forças Armadas podem ajudar no combate ao desmatamento, mas “têm que estar sob comando dos funcionários civis, que são os especialistas nisso”.
Para reconquistar o reconhecimento internacional de que preservamos o Meio Ambiente, é preciso parar de compactuar com o desmatamento, argumentou. “Devemos mostrar que preservamos. O Brasil fez isso durante muito tempo. De 2004 a 2012, com a ex-ministra Marina Silva, o Brasil decresceu o desmatamento na Amazônia em mais de 80%. Isso elevou a respeitabilidade do Brasil”.
Ricardo Galvão disse que os servidores do Inpe têm medo do que pode vir pela frente, visto que a coordenadora-geral de Observação da Terra, Lubia Vinhas, foi demitida logo depois da divulgação de novos dados que mostram o aumento do desmatamento e das queimadas em 2020.
“O que está sendo feito é uma reestruturação que não está sendo aceita pelos próprios servidores e pesquisadores, em um momento muito difícil que é o da troca de diretoria. O que vai acontecer no futuro é muito preocupante, esse que é o medo que os servidores têm”.
“É dito que é apenas uma reestruturação, uma mudança de regimento, mas não está claro qual vai ser o futuro disso. Isso é muito preocupante, em particular se os serviços de monitoramento do Inpe e a sua atividade no desenvolvimento de satélites for tirado de sua égide e passado para outro organismo”.
“Desde que eu saí até agora, os dados sobre desmatamento têm sido providos com continuidade e com exatidão”, comentou.