Qual caminho serve ao Brasil?
MIGUEL MANSO (*)
Muito se discute sobre o que virá ou como será o pós-pandemia.
Emissão de moeda é a saída? Por que? Para quê? Para quem?
Diante da mais grave crise capitalista deste século, até mesmo os economistas mais conservadores ou neoliberais defendem a intervenção do estado no sistema financeiro e a necessidade da emissão monetária, a ampliação do papel dos bancos centrais.
Além de reguladores e garantidores do sistema financeiro e do valor da moeda, devem agir praticamente como bancos de investimento, comprando as dívidas das empresas privadas, ações e títulos privados, como forma de capitalizar as empresas e dar-lhes liquidez, como o caminho inevitável para evitar a falência em larga escala e uma inevitável corrida aos bancos, em busca dos valores ali depositados ou investidos nos fundos lastreados em ações, títulos e derivativos dessas empresas que, de uma hora para outra, assistem sua riqueza virar pó ou derreter nas bolsas de valores.
O discurso muda. Agora os representantes dos bancos e do mercado financeiro defendem o uso ilimitado da emissão monetária e a sua expansão para financiar a sobrevivência da economia capitalista, ganhar tempo e evitar prejuízos e enriquecer como parasitas, em busca de uma saída. O arrocho dos salários e a supressão dos direitos trabalhistas e previdenciários, e alguns trocados para os programas de renda mínima, a contratação intermitente, precarizam e desvalorizam violentamente a força de trabalho.
Parece novidade, mas afinal, emissão de moeda, por quê? Para quê? Para quem?
Há pelo menos uma década os barões das finanças alimentam suas fortunas com base em superemissões monetárias.
Como apontado pela teoria descrita por Marx, apesar dos monetaristas buscarem fórmulas para evitar que a perda dos valores das mercadorias atingissem a moeda, mercadoria universal de troca, as abruptas emissões monetárias na crise geral eram inevitáveis. Como já demonstrada em outras crises gerais, como a do final do século XIX, que deu origem à Primeira Guerra Mundial e a revolução socialista de 1917 e na crise de 1929, que desembocou na ascensão do nazismo e na Segunda Grande Guerra Mundial, encerrada com a derrocada dos regimes coloniais e a mudança da hegemonia da Inglaterra para os EUA no campo capitalista.
Foi no bojo dessas crises e em oposição ao caminho capitalista monopolista e suas guerras de repartição da economia mundial que se levantaram as Nações em sua luta de independência. Com a formação de um grande campo de países que avançaram em seu processo de libertação, com muitos deles evoluindo em direção ao socialismo.
Como descreveu Marx, as crises gerais eram resultados da superprodução, da falta de planejamento e crescimento desigual, da anarquia do processo produtivo por meio do mercado e das relações de propriedade, cada vez mais monopolizadas. Superprodução de bens e mercadorias que, sem mercado consumidor capaz de consumi-las, não por falta de gente ou de necessidade social, mas por má distribuição da propriedade e da riqueza social, perderiam seu valor nessas crises de forma abrupta. Essa perda do valor das mercadorias atingiria, inevitavelmente, a moeda, levando a crises de liquidez e a um processo de superprodução da moeda, a emissão de papéis monetários e por conseqüência à sua inevitável perda de valor.
Dez anos antes da pandemia de 2019 o sistema financeiro dos EUA e do sistema capitalista global foi colocado novamente à beira do colapso, desta vez por conta da crise hipotecária e seus papéis derivativos, na grave crise de 2008/2009. A ruptura da bolha hipotecária e de papéis subprime exigiu em poucos dias enorme liquidez no sistema financeiro.
Diante da abrupta e generalizada falta de liquidez as autoridades monetárias dos EUA cobravam, sem nenhum sucesso, a contribuição dos maiores bancos americanos para que estes injetassem recursos e impedissem o colapso do sistema, socorrendo assim outros conglomerados financeiros e corporativos que se encontravam abarrotados de papéis subprimes impagáveis e que rapidamente apodreciam.
Depois de um período de crescimento artificial de seus ativos financeiros com base em ganhos fáceis, meramente contábeis e especulativos dos papéis subprime, supervalorizados, transacionados aos bilhões em segundos nas bolsas e mercados eletrônicos, a resposta do maior banco privado americano aos apelos da autoridade monetária, o JP Morgan Chase, foi de colocar à disposição das autoridades monetárias ridículos 1 bilhão de dólares, uma migalha, diante da necessidade de 1 trilhão de dólares ou mais demandados pelas subestimadas estimativas do FED na ocasião.
Os dois maiores conglomerados americanos que haviam alimentado a especulação subprime e dela se beneficiado preparara-se para a quebradeira que viria com uma megafusão, logo no início do milênio. Os bancos Chase da família Rockefeller e JP Morgan da família Morgan, deram origem ao JP Morgan Chase. A empresa foi formada em 2000 e já em 2019 o braço de gerenciamento de ativos do banco possuía US $ 2,99 trilhões em ativos sob gestão, enquanto seu braço de investimentos e bancos corporativos detinha US $ 25,45 trilhões em ativos sob custódia, mais do que o PIB dos EUA.
Os gigantescos bancos estavam apostando na quebra dos demais para abocanhar, a preço vil, os ativos de seus outrora parceiros de especulação. Foi o que ocorreu. Dos 20 maiores bancos estadunidenses e todas as empresas e fundos de ações e seus ativos foram incorporados em poucos dias pelos 4 maiores, JPMorgan Chase, Bank of América, Wells Fargo e Citibank, sendo este último também da família Rockefeller, que de 2009 a 2018 viram seus ativos duplicar.
A atitude fria e tramada dos barões do TOO BIG TO FAIL (GRANDES DEMAIS PARA FALIR), como eles mesmo se faziam apresentar, usava abertamente dessa ameaça para chantagear o governo e o congresso estadunidense, pois se quebrassem arrastariam os EUA e seus satélites para a bancarrota de todo o sistema capitalista, por eles hegemonizado desde a Segunda Guerra Mundial.
A chantagem desencadeou um processo de superemissão monetária, em três processos conhecidos como QE1 (Quantitative Easing – emissão monetária para dar liquidez aos bancos), QE2 e QE3, mas para quem?
O FED – Banco Central privado dos EUA (*1), com poder de autorizar emissão de moeda – colocou à disposição destes poucos bancos e seus conglomerados, algo em torno de 10 trilhões de dólares, ao longo dos últimos 10 anos em empréstimos a juros muito baixos, praticamente próximos de zero, dinheiro na veia dos bancos e da especulação, mas não para produzir, não para financiar e ampliar o consumo e a produção, muito menos para distribuir renda e dar acesso ao consumo, mas para que então?
A alegação era dar liquidez ao mercado e evitar o colapso da economia e retomar o ciclo de desenvolvimento após a “destruição criativa Schumpeteriana” dos menos eficientes. Mas a finalidade real da expansão monetária serviu apenas para que estes TOO BIG BANKS mantivessem o valor de seus ativos em bolsa e abocanhassem os ativos lucrativos das massas falidas, por simbólicos punhados de dólares, ficando com os ativos limpos e lucrativos, enquanto o tesouro público assumia o prejuízo dos ativos tóxicos. Receberam uma imensa massa de dinheiro para adquirir mais propriedades e companhias e para continuar especulando em bolsa. Foi o maior processo de concentração de riqueza da história neste século e a maior injeção de recursos na imensa e mais perigosa bolha especulativa.
Os maiores bancos dos EUA continuaram a crescer enquanto a concentração de ativos aumentava e os seis maiores bancos tinham ativos de US $ 9.5 trilhões no final do ano de 2012, de acordo com seus relatórios anuais de 2012 (Formulário 10K da SEC), 59% do PIB dos EUA em 2012 que era de US $ 16.2 trilhões de dólares. Em 1998 os cinco principais bancos dos EUA possuíam aproximadamente 30% dos ativos bancários dos EUA e aumentaram para 45% em 2008 e para 48% em 2010, antes de cair para 47% em 2011, 60% de enriquecimento e concentração de propriedade em uma década, de 98 a 2008, enquanto a economia americana se arrastava sem crescimento algum. Essa concentração monopolista agravou ainda mais a crise do sistema, que retornou com força em 2008/09.
Essa concentração continuou a crescer, apesar da crise das hipotecas subprime e de suas consequências. Em março de 2008, o JP Morgan Chase adquiriu o banco de investimentos Bear Stearns. O Bank of America adquiriu o banco de investimentos Merrill Lynch em setembro de 2008. O Wells Fargo comprou o Wachovia em janeiro de 2009. Os depósitos bancários em todos os bancos dos EUA variaram entre 60 a 70% do PIB entre 1960 e 2006, saltaram durante a crise para um pico de quase 84% em 2009, antes de cair para 77% em 2011. O número de bancos comerciais e de poupança dos EUA atingiu um pico de 14.495 em 1984; caiu para 6.532 no final de 2010. Os dez maiores bancos dos EUA mantinham quase 50% dos depósitos dos EUA em 2011.
A figura mostra a evolução do JPMorgan Chase – de 13.2 para 23,2 trilhões de dólares em ativos sob custódia – o equivalente a 10 PIBs do Brasil em um único banco. Se já eram grandes demais para falir em 2008, o que dizer dez anos depois, em 2018, quando duplicaram a sua riqueza?
Os lucros dos 5 maiores bancos americanos também dobraram como pode ser visto no gráfico.
As medidas do FED eram apresentadas como “saneamento do sistema financeiro americano” inevitáveis e saneadoras, necessárias para inaugurar um novo ciclo de desenvolvimento do capitalismo. O crescimento anual da economia estadunidense oscilou na casa dos 2%, enquanto os ativos e os lucros financeiros dobraram em uma década. Longe disso, os trilhões colocados à disposição, dos já trilionários TOO BIG TO FAIL, foram utilizados para operar processos especulativos com ações e títulos de suas próprias companhias e para a aquisição de mais companhias e concentração de operações, na produção e no mercado, de bens e commodities. A derrocada dos papéis em bolsa foi temporariamente afastada e os maiores conglomerados aumentaram seus lucros, sem qualquer ganho de produtividade, eficiência ou escala de produção, apenas aprofundando o processo de concentração, de especulação nos mercados de apostas para manter os valores de sua riqueza, cada vez mais ineficiente e fictícia.
A consequência para os países em desenvolvimento e da periferia do sistema capitalista foram logo sentidos: Banco Mundial, FMI, OMC aumentavam as cobranças e as pressões dos organismos internacionais para o aumento da rigidez fiscal e orçamentária, o arrocho nos salários e retrocesso nos direitos, corte nas aposentadorias e na previdência pública, corte dos investimentos públicos em obras, privatização das empresas estatais e mais abertura para o capital especulativo estrangeiro.
Nos países que se submeteram a essa pressão o resultado foi o aumento da pobreza, a desnacionalização das empresas públicas, a desindustrialização e o retorno ao seu papel de meros exportadores de produtos primários e agrícolas e fornecedores de mão de obra barata. A piora na educação, na saúde, na segurança e nos serviços públicos, sucateamento das cidades, dos transportes, enfraquecimento e desmonte dos estados nacionais para benefício dos especuladores em bolsa, do estado americano e suas TOO BIG TO FAIL Corporações.
Mesmo com essa enxurrada de dólares e toda a pressão para o arrocho fiscal e monetário aos países da periferia a retomada do crescimento do sistema capitalista não veio, foi pífia e muitos analistas, vendo novamente as bolsas balançarem em quedas vertiginosas, no inicio de 2020, acreditavam que não havia espaço para mais megaemissões monetárias, tendo em vista que as bolsas não reagiam, voltavam a cair e a recessão se agravava na Europa e nos EUA.
Com a pandemia do Coronavírus se espalhando a partir do final de fevereiro, a economia dos países capitalistas centrais que já se encontravam estagnadas ou no vermelho foram empurradas ainda mais para o fundo do poço. As bolsas despencaram violentamente. Foi de 1.37 trilhão de reais a perda de valores nos papeis da bolsa de São Paulo em março de 2020 e a estimativa era de que os 500 maiores investidores em bolsa no mundo haviam perdido mais de 1,7 trilhões em poucos dias.
Eram 813 mil investidores pessoas físicas na bolsa B3 sediada em SP em 2018, saltaram para mais de 2 milhões de investidores, quando em fevereiro de 2020 veio a pandemia. O dólar subia 25% em relação ao real por conta da fuga para papéis “mais seguros. “A busca por dólares não é pelos fundamentos da economia americana, é fuga mesmo” apontava Thiago Salomão analista da Rico Investimentos.
No dia 16 de fevereiro o número de mortos pelo vírus sobe para 1.770 em todo o mundo, noticiava a CNN.
Houve mais 100 mortes devido ao coronavírus na província chinesa de Hubei no domingo, disseram as autoridades de saúde de lá. Isso aumenta o número de mortes no centro do surto para 1.696. O número global de mortos é de 1.770, com a grande maioria dessas mortes na China continental. Mais de 1.900 casos adicionais do vírus foram confirmados no domingo, disseram as autoridades de Hubei, elevando o número total de casos no centro do surto para 58.182. A contagem global: houve mais de 71.204 casos do vírus registrados em todo o mundo, com a grande maioria na China continental. A Comissão Nacional de Saúde da China deve divulgar números para todas as províncias da China posteriormente.
Enquanto o capital estrangeiro fugia das bolsas de valores mais investidores individuais entravam e entregavam seus patrimônios na especulação. Gráficos da Bovespa.
Em praticamente todos os ramos a paralisação das atividades e do consumo levavam a prejuízos e a perda dos valores das empresas em bolsa. Prevendo mais perdas futuras a corrida para a venda de ações em massa acirravam a busca por ativos seguros e fizeram disparar o preço do ouro. Mas os papéis e as bolsas não paravam de cair. O FED entra em campo.
No domingo, 15 de março, o Federal Reserve embarcou em um programa de larga escala, e sem limites, empregando poderes emergenciais, a fim de estabilizar uma economia decadente sob pressão da pandemia do COVID-19. A principal dessas ações emergenciais foi reduzir efetivamente as taxas de juros para zero e uma rodada de QE emissão monetária de US $ 700 bilhões. Apesar dessas intervenções, os preços das ações na segunda-feira caíram mais acentuadamente superando a Segunda-Feira Negra de 1987. Mesmo com os anúncios do FED os analistas se perguntavam: “resta ver se foi injetada liquidez suficiente no mercado para impedir que o sistema financeiro sofra falhas generalizadas”. No dia 22 de março, movidas por nova enxurrada de emissão monetária a bolsa inicia lenta recuperação dos patrimônios dos especuladores, como aponta o gráfico acima.
Em Comunicado à imprensa o FED anunciava:
Enquanto os mercados financeiros se debatem em resposta à ameaça única representada pelo COVID-19, o presidente do Federal Reserve (FED), Jerome Powell, observou em uma entrevista coletiva surpresa no domingo, 15 de março: “Os efeitos do coronavírus pesarão na atividade econômica no curto prazo. e representam riscos para as perspectivas econômicas. ” O Federal Reserve (FED) aproveitou a oportunidade para iniciar uma série de ações emergenciais, reduzindo notavelmente sua principal taxa de juros para 0% e lançando uma ambiciosa rodada de flexibilização quantitativa (QE). A seguir, é apresentado um resumo das ações adotadas esta semana pelo FED na tentativa de fortalecer a economia…
Os analistas de mercado e a imprensa registravam os problemas:
“A taxa do fundo federal, usada como referência para empréstimos de curto prazo e a taxa à qual a maioria das taxas de consumo está atrelada, serve como substituto das taxas de juros para a economia americana. Apesar da pressão considerável, o Fed relutou em diminuir a taxa de fundos federais nos últimos dois anos, diminuindo a taxa de 2,25% para 2% em agosto de 2019, com novos cortes menores em setembro e outubro. Apesar de ter diminuído a taxa em 50 pontos base em 3 de março, isso evidentemente não era suficiente e, no domingo, 16 de março, o Fed deu o passo dramático para reduzir a taxa do fundo federal para 0%…
Além de reduzir a taxa de fundos federais para zero, o Fed também anunciou uma nova rodada de QE, uma ferramenta controversa para impulsionar a última economia empregada de maneira significativa como resultado da crise financeira de 2007-2008. A flexibilização quantitativa, também conhecida como compra de ativos em larga escala, normalmente envolve o próprio banco central comprando títulos do governo ou outros títulos de longo prazo, a fim de restaurar a confiança e, crucialmente, adicionar liquidez ao mercado. O Fed anunciou que iniciaria o programa QE com uma compra imediata de US $ 80 bilhões (US $ 40 bilhões na segunda-feira, US $ 40 bilhões na terça-feira), mas compraria “pelo menos” US $ 700 bilhões em ativos nos próximos meses, sem limite…
…Em 29 de junho o FED anunciava o inicio da Linha de Crédito Corporativo do Mercado Primário. E o início de linhas de empréstimo de emergência – a Linha de Crédito Corporativo do Mercado Principal (PMCCF). O PMCCF e o Mecanismo de Crédito Corporativo do Mercado Secundário (SMCCF) juntos fornecerão crédito para grandes empresas, um mecanismo em que as empresas podem emitir títulos diretamente ao FED mediante taxa. Sob o PMCCF e o SMCCF,
o FED emprestará até US $ 750 bilhões. O FED oferecerá esse mecanismo além de comprar diretamente a dívida da empresa no mercado por meio de uma iniciativa separada. “
A síntese do que foram as atividades dos Bancos Centrais nas seis semanas dos dois primeiros meses de 2020, março e abril, pode ser visto neste Segundo Relatório da Fitch Ratings:
Painel de economia: balanços do banco central aumentam com a crise do coronavírus, Fitch Ratings-Londres-24 de abril de 2020:
É provável que as compras de ativos da Facilitação Quantitativa Global (QE) atinjam US $ 6 trilhões em 2020, diz a Fitch Ratings. Os balanços dos bancos centrais estão se expandindo extremamente rapido à medida que compram grandes quantidades de ativos públicos e privados e aumentam seus empréstimos a instituições financeiras em seus esforços para combater o impacto econômico prejudicial do coronavírus.
“Seis trilhões de dólares são uma quantia impressionante que equivale a mais da metade
do total global de QE acumulado, observado entre 2009 e 2018″, disse Robert Sierra, diretor da equipe de economia da Fitch.
A extensão da injeção de liquidez se torna aparente quando se considera que em meados de março o balanço do FED era de US $ 4,3 trilhões e, no final de abril (23 de abril), havia subido para US $ 6,5 trilhões, sendo a maior parte desse montante, expansão devido ao aumento das compras de títulos do Tesouro dos EUA. Em apenas seis semanas, durante o período de março a abril, o FED comprou um total de US $ 1,4 trilhão em títulos do Tesouro dos EUA, excedendo as compras realizadas pelo Fed durante todo o período nos QE1, QE2 e QE3 no auge da crise financeira global. O balanço do Fed também está se expandindo como resultado de substanciais swaps cambiais com outros bancos centrais, em meio a um aumento na demanda por liquidez em dólares, a rápida expansão das linhas de crédito existentes e o anúncio de novos programas, incluindo o Main Street Lending Program.
Igualmente impressionante, mas em menor escala, o BCE – Banco Central Europeu – comprou cerca de 120 bilhões de euros em apenas quatro semanas entre meados de março e meados de abril de 2020, em comparação com cerca de 20 bilhões de euros por mês antes da propagação do vírus. Isso reflete a implementação do anúncio do BCE, em meados de março, de mais 870 bilhões de euros de QE para atenuar a crise. O resultado dessas medidas é que o balanço do FED- em uma base ampla, incluindo QE e outros componentes – deverá chegar perto de US $ 10 trilhões até o final de 2020, enquanto os do BCE podem facilmente ultrapassar 6 trilhões de Euros.
O Banco da Inglaterra anunciou que comprará mais 200 bilhões de libras esterlinas de Gilts e, ao mesmo tempo, aumentará o total de seu balanço ao expandir seu Programa de Financiamento a Prazo para PMEs. Por seu lado, o Banco do Japão está focado na compra de mais ETFs (fundos negociados em bolsa), aumentando sua meta para este ano para um máximo de JPY12 trilhões (aproximadamente US $ 118 bilhões), além de fornecer empréstimos baratos para empresas afetadas pelo surto do vírus. Outros bancos centrais, incluindo o Reserve Bank da Austrália e o Bank of Canada, também estão expandindo rapidamente seus balanços.
O relatório do painel “Os balanços dos bancos centrais aumentam no COVID-19” está disponível em www.fitchratings.com.
O impacto na bolsa de valores foi registrado no artigo da ADVFN:
O estrondo de 2020, o QE e o canto do mercado do Federal Reserve Por que o mercado de ações subiu tão fortemente?
Eis o porquê: o aumento do mercado de ações é uma consequência da enorme inflação do Federal Reserve em seu balanço.
O balanço do Federal Reserve agora é verdadeiramente astronômico.
Muitos comentaristas ficaram impressionados com o Federal Reserve agora que atingiu novos patamares. O balanço do Federal Reserve é verdadeiramente astronômico e difícil de conceber em termos concretos. Vamos chamá-lo de US $ 1.000 para cada ser humano vivo na Terra.
Como questão secundária, é a primeira vez que vejo um eixo expresso em milhões de milhões. Estes são tempos de “divisor de águas”.
Essa expansão do balanço patrimonial é a única causa da recuperação do mercado de ações, mas se a recuperação da atividade econômica ocorrerá quando os bloqueios terminarem ainda não foi vista. Provavelmente, isso fará parte da prevenção de um colapso agudo e cruel da economia dos EUA.
E não parou por aí, foram 3 trilhões de dólares em 3 meses de pandemia, como aponta no gráfico do FED o artigo:
“ FED comenta histórico de impressão de dinheiro
O BCE dobrou suas medidas de estímulo ao combate aos efeitos do coronavírus, para 1,35 trilhão de euros. Nos Estados Unidos, nesta semana, o Federal Reserve se reunirá para definir um roteiro para lidar com as consequências econômicas da crise. Enquanto as bolsas de valores têm período de alta, Bitcoin e dólar enfrentam quedas.
O FED não tem precedentes de suas impressões de dinheiro desde março de 2020 segundo o Cointelegraph, seu balanço agora é de US$ 7,16 trilhões – US$ 3 trilhões em três meses.
Um analista falando ao Financial Times disse que o mercado estava “sedento de orientação” do FED, em meio a temores de uma segunda onda de infecções por coronavírus e à atitude paradoxal do laissez-faire em relação ao distanciamento social adotado pelas autoridades durante os protestos em andamento nos EUA. “
Em síntese, nos meses de pandemia e nos meses que ainda temos em 2020, a megaemissão monetária do FED deve superar a superemissão monetária realizada ao longo da última década, ou seja, 10 anos em 1, dobrando os valores emitidos em dólar, o que já vinha preocupando muitos analistas, autoridades e economistas, que já apontavam os perigos antes da pandemia da formação da superbolha, agora com mais esta gigantesca emissão monetária, e com o destino que lhe foi dada, transferência direta aos bancos, a superbolha expande-se ainda mais, muito maior e mais letal do que a da crise dos papéis subprime do final da década de 2010.
Sem crescimento real da economia à vista, a não ser o da superbolha, sem que os recursos cheguem na economia real, as perspectivas prenunciadas pelos organismos internacionais são que, apesar dessas megaoperações no mercado financeiro e suas consequentes especulações nas bolsas de valores, a economia real global deve amargar uma depressão de – 6%. Com desempenho diferenciado para a China e seus principais aliados que podem crescer em 2020 mais de 3%.
Antes da pandemia, em termos econômicos, nos países capitalistas centrais as taxas de crescimento eram pífias ou negativas. PIBs inflados e maquiados por pirâmides de papéis artificialmente supervalorizados, por capital e riqueza fictícia arrastavam, em suas crises de liquidez, o sistema financeiro mundial e o colocavam a beira do colapso global, enquanto acirravam as pressões e sangravam as economias dos países em desenvolvimento e os países da periferia, travando o seu desenvolvimento real, impondo-lhes a desindustrialização, a escassez, o arrocho salarial e do mercado interno, ajustes fiscais e orçamentários com desmonte das políticas sociais, drenando todos os recursos financeiros para o olho do furacão da crise financeira e da concentração de propriedade da riqueza.
Durante os meses da pandemia, os bilionários estadunidenses ficaram US$ 434 bilhões mais ricos desde o início da pandemia. O patrimônio líquido total dos bilionários americanos cresceu para US$ 3,382 trilhões ante os US$ 2,948 trilhões do período pré-crise. Ao mesmo tempo, centenas de milhões de trabalhadores tiveram seus salários reduzidos, ou pior, perderam completamente seus empregos e salários.
Agora, com a pandemia, a crise se aprofunda e o sistema capitalista sob hegemonia dos monopólios americanos vive uma grave depressão.
Alastra-se o desemprego e aumenta a desigualdade social. O PIB global – segundo prognósticos de vários organismos internacionais – sofrerá uma queda de pelo menos 6%. Cerca de 200 milhões de pessoas, em todo o globo, serão empurradas à situação de extrema pobreza, sendo 30 milhões só na América Latina.
Relatório da ONU para a América Latina em tempos de pandemia dá conta do impacto do coronavírus na região. A contração esperada do PIB regional é de 9,1%, o maior em um século. O desemprego passará de 8,1% (2019) para 13,5 (2020). O número de desempregados chegará a mais de 44 milhões de pessoas, um aumento de mais de 18 milhões em relação a 2019. A taxa de pobreza passará dos 37%, chegando a 230 milhões no total. A pobreza extrema deve passar dos 15%, atingindo 96 milhões de pessoas.
O relatório também aponta que a crise afetará mais fortemente as mulheres, já que elas representam mais de 60% da mão de obra em setores como hotelaria e serviços de alimentação, 72,8% nos serviços de assistência médica e ocupam mais postos no mercado informal do que os homens. As mulheres ficaram mais sobrecarregadas com o acúmulo de trabalho e cuidados da casa, crianças e idosos.
Também aumentou a violência sexual e de gênero e a incidência de feminicídio. Também serão desproporcionalmente atingidos os indígenas (60 milhões de pessoas) e os afrodescendentes (134 milhões de pessoas). Igualmente os migrantes e refugiados sofrem por estarem em maior vulnerabilidade.
O documento sugere como medidas urgentes, a provisão de renda básica universal, negociação e perdão das dívidas públicas por parte dos credores, amplos programas multilaterais de segurança alimentar. (Relatório da ONU Brasil)
O contraponto a esse processo de decadência do sistema capitalista americano e seus satélites já existia e estava em pleno desenvolvimento. Os países que não se subordinaram e desenvolveram políticas soberanas em relação ao centro imperialista, em especial os BRICS cresciam, com destaque para China e Índia, o que em parte contrabalançava a falência geral do sistema capitalista.
Os BRICS, aliança política e a associação de 5 países que buscam sua soberania e progresso econômico e social avançava a passos largos. China, Rússia e Índia cresciam em patamares de 6 a 10% ao ano.
Juntos, os cinco países em desenvolvimento são responsáveis por um PIB maior do que o americano, maior do que o europeu e japonês, com uma população de aproximadamente 3 bilhões de pessoas, corresponde a 40 % dos 7.6 bilhões de pessoas do planeta, um mercado consumidor de quase 20 trilhões de dólares.
Entre 2003 e 2007, o crescimento dos quatro países que iniciaram o BRIC representou 65% da expansão do produto interno bruto (PIB) mundial. Em paridade de poder de compra, o PIB dos BRICS, em 2013, já superava o dos Estados Unidos ou o da União Européia. Para dar um exemplo do ritmo de crescimento desses países, em 2003 os BRICs respondiam por 9% do PIB mundial; em 2009, a participação do grupo passou para 14%. Em 2010, o PIB em conjunto dos cinco países do BRICs totalizou US$ 11 trilhões ou 18% da economia mundial. Considerando o PIB pela paridade de poder de compra, esse índice é ainda maior: 19 trilhões de dólares ou 25%.
Esta aliança dos BRICS além de significar a alternativa real de crescimento para cada país membro, colaborava de forma crescente para atenuar ou compensar a decadência do sistema hegemonizado pelos monopólios americanos, europeus e japoneses.
A China, primeiro país a ser atingido pela pandemia assombra o mundo com sua capacidade de enfrentar o vírus. Maior população do planeta é a que apresenta em termos proporcionais e absolutos as menores taxas de contaminação e óbitos e o menor impacto econômico, apontando para um crescimento ainda em 2020 na casa dos 3%. Com o governo e o estado voltado para financiar a produção e não a especulação, com planejamento e compromisso com seu povo, o caminho chinês apresenta outros resultados em contraposição ao caminho decadente dos monopólios privados capitalistas e seu caminho parasitário. A Rússia caminha na mesma direção. A Índia, segundo país mais populoso luta com mais dificuldade mas na direção correta.
O Brasil lamentavelmente, dirigido por Bolsonaro, caminha na contramão em todos os sentidos.
Afasta-se dos BRICS e de seus melhores aliados econômicos e estratégicos para subordinar-se ao decadente centro capitalista monopolista. Como nos EUA, no Brasil a pandemia explode, e a economia entra em profunda recessão, 9% negativos são as projeções.
Ao invés de defender a saúde do povo, da nossa economia e nossas empresas, Bolsonaro e Guedes querem posicionar o Brasil como vendedores baratos do patrimônio que pertence ao povo, exatamente no pior momento para fazer tal processo de venda em massa de nossas lucrativas empresas publicas, o que deve levar de roldão as empresas privadas que nelas se apoiavam, agravar a desnacionalização, a desindustrialização, e regredir à condição de colônia e de país exportador de matérias-primas baratas e agrícolas, importador de bens industriais, com trabalho precarizado e dezenas de milhões de desempregados.
Na lógica fiscalista e privatista, Bolsonaro posiciona-se ao lado de Guedes e contra seus ministros militares, que queriam traçar um plano de obras e investimentos públicos, o PRO BRASIL para buscar a retomada do crescimento.
Guedes prontamente acusou os ministros militares de tentar “um novo PAC” e defendeu “abrir mais a economia ao capital estrangeiro”, trama a privatização generalizada de empresas públicas lucrativas e estratégicas, desnacionalizando e desmontando nossas indústrias, estrangulando as empresas brasileiras, aumento de impostos e mais arrocho para o povo. Voltado para a transferência de riqueza e de recursos públicos aos bancos e as famílias mais ricas, deu 1,5 trilhões de reais aos bancos e menos de 20% disso para os 200 milhões de brasileiros.
Bolsonaro e Guedes governam para os muito ricos e abandona o povo. Enfraquece e sabota a nossa soberania enquanto comemora a independência dos EUA. Dos militares, querem apenas o prestígio e o apoio para suas aventuras fascistas, antinacionais e antidemocráticas.
Guedes, expert em operações fraudulentas e golpes no mercado, ex-proprietário do Banco Pactual, opera para ganhar suas gordas propinas para levar a cabo o desmonte do Estado e a entrega de nossas empresas e bancos públicos aos paquidérmicos e parasitários bancos americanos, sua elite e seus representantes no Brasil.
Nada mais submisso, corrupto, decadente, mais violento e opressor, diante da profunda crise que se acelera nos centros capitalistas, do que vender o Brasil na bacia das almas para engordar sua fortuna e ambição pessoal.
Mas esse não é o único caminho, muito menos o que serve ao Brasil.
Desenvolvimento ou Depressão são as disjuntivas possíveis que o Brasil tem pela frente.
Parece evidente que com Bolsonaro e Guedes o terrível caminho da Depressão está em curso.
Remover esse governo incompetente e corrupto é mais do que nunca imprescindível.
Evitar esta tragédia histórica é o desafio das forças democráticas e verdadeiramente patrióticas, que devem marchar unidas para uma Frente Democrática e de Salvação Nacional, em defesa da vida, do emprego, da renda, da Democracia e do Desenvolvimento.
(*) Engenheiro Eletrônico formado pela USP São Carlos.
18 julho de 2020 – Em homenagem às mais de 70 mil vitimas do genocídio Bolsonarista.
NOTAS
(*1) A estrutura do Sistema de Reserva Federal é composta por um Conselho de Governadores ( Federal Reserve Board), pelo Federal Open Market Committee (FOMC) e pelos doze presidentes de Federal Reserve Banks regionais, localizados nas maiores cidade do país, além de numerosos representantes de bancos privados dos Estados Unidos e diversos conselhos consultivos. O FOMC é o comitê responsável pelo estabelecimento da política monetária e é formado de todos os sete membros do Conselho de Governadores e pelos doze presidentes dos bancos regionais, embora somente cinco presidentes de banco votem. O Sistema de Reserva Federal tem aspectos de natureza pública e de natureza privada, tendo sido concebido para servir tanto aos interesses do público em geral como dos banqueiros privados. Disso resulta uma estrutura considerada única entre os bancos centrais. Também não é usual que uma entidade de fora do banco central, o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos, crie moeda.
De acordo com o Conselho de Governadores, o FED é independente dentro do governo, de modo que “suas decisões não têm que ser ratificadas pelo Presidente ou por nenhum outro membro do Poder Executivo ou do Legislativo.” No entanto, sua autoridade deriva do Congresso dos Estados Unidos e está sujeita a supervisão parlamentar. Além disso, os membros do Conselho de Governadores, incluindo seu presidente e vice-presidente, são escolhidos pelo Presidente dos Estados Unidos e confirmados pelo Congresso.
O QUE DIZ A CONSTITUIÇÃO DO BRASIL
Art. 164. A competência da União para emitir moeda será exercida exclusivamente pelo Banco Central.
§ 1º É vedado ao Banco Central conceder, direta ou indiretamente, empréstimos ao Tesouro Nacional e a qualquer órgão ou entidade que não seja instituição financeira.
§ 2º O Banco Central poderá comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, com o objetivo de regular a oferta de moeda ou a taxa de juros.
§ 3º As disponibilidades de caixa da União serão depositadas no Banco Central; as dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos órgãos ou entidades do poder público e das empresas por ele controladas, em instituições financeiras oficiais, ressalvados os casos previstos em lei.