O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que “serviços públicos diretamente vinculados à vida e à morte são assuntos de estatura constitucional, não meramente de ‘mercado'”. Diante disso, ele determinou um prazo de 15 dias úteis para que a Prefeitura de São Paulo esclareça se houve aumentos abusivos nos preços dos serviços funerários após a privatização do setor.
Desde novembro, por determinação judicial, as empresas que atuam no setor devem manter os preços estipulados nas tabelas de 2022, ano em que ocorreu a privatização do serviço funerário em São Paulo. O PCdoB, partido autor da ação, alega que a concessão desses serviços resultou em “exploração comercial abusiva, especialmente no momento de maior vulnerabilidade emocional das famílias enlutadas”.
A Prefeitura de São Paulo alega que a privatização teve como objetivo modernizar os cemitérios e garantir acessibilidade às famílias. Segundo a gestão municipal, não houve aumentos abusivos, mas apenas “reajustes moderados” e, em alguns casos, até mesmo redução dos preços.
Para embasar sua decisão, Dino solicitou um parecer técnico do Núcleo de Processos Estruturais do STF, que analisou a variação dos preços dos serviços funerários antes e depois da privatização. O relatório apontou que houve “elevação dos preços no período pós-concessão” e destacou que “é evidente o número significativo de casos em que esses preços não estão sendo devidamente praticados, resultando em prejuízos para a população”.
Ao negar o recurso da Prefeitura, Flávio Dino ressaltou a importância da questão, afirmando que o caso envolve possíveis abusos em um serviço essencial prestado em “momentos mais marcantes e dramáticos da existência humana”. Ele pontuou que a discussão não se restringe apenas aos custos monetários, mas também ao impacto emocional causado por cobranças excessivas e regras pouco transparentes.
“O objeto que se debate nos autos é a resposta à pergunta: a que preço? E não se cuida apenas da dimensão monetária — que pode representar o acesso ou não a um direito fundamental — mas inclusive do ‘preço’ de um sofrimento adicional, por exemplo em face de uma cobrança escorchante ou de parâmetros obscuros que dificultam a decisão familiar”, declarou o ministro.
Dino também refutou o argumento de que o STF não deveria julgar a questão por falta de relevência constitucional, enfatizando que “mesmo que assim fosse, os contratos obviamente não estão imunes ao controle jurisdicional baseado em regras constitucionais e legais”. Ele reforçou que serviços diretamente relacionados à vida e à morte possuem estatura constitucional e não podem ser tratados apenas como um negócio. “Para deixar bem nítido e dissipar obnubilações: serviços públicos diretamente vinculados à vida e à morte são assuntos de estatura constitucional, não meramente de ‘mercado'”, concluiu.
O prefeito Ricardo Nunes, ao comentar a decisão do ministro, agradeceu pelo prazo de 15 dias concedido para apresentar as explicações. “Fica minha gratidão ao ministro do STF”, afirmou Nunes durante um evento na sexta-feira (3). O prefeito também informou que representantes da Procuradoria-Geral do Município e da SP Regula foram a Brasília para fornecer esclarecimentos sobre o serviço funerário. “Se existe mais alguma dúvida, nós vamos apresentar ao ministro do Supremo Tribunal Federal sobre o serviço funerário da cidade”, declarou.