Estudo “Extremismo violento em ambiente escolar” publicado no Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP vinculou escalada da violência nas escolas aos discursos de ódio na internet. Para sindicalistas, ataques têm vinculação com bolsonarismo
Dados do Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP, coordenado pela pesquisadora Michele Prado, apontam que a escalada do número de ataques nos últimos anos estão diretamente vinculados aos discursos extremistas e de ódio na internet.
O estudo “Extremismo violento em ambiente escolar”, divulgado em 28 de março, mostra ainda que dez dos 22 atentados em escolas do Brasil desde 2002 ocorreram nos últimos 13 meses. Nove somente no ano passado, último ano de Jair Bolsonaro e com uma ampliação da propagação de ódio na internet.
Segundo o estudo, a média de idade dos suspeitos é de 16 anos e a arma preferida para cometer os ataques são revólveres e pistolas. Ela explica em nota técnica as motivações dos jovens criminosos e analisa a propagação do extremismo nas redes sociais.
A progressão dos ataques nas instituições de ensino do país teve um crescimento acelerado. O levantamento não inclui as tentativas frustradas, o que “subiria assombrosamente” o número de atentados da lista, segundo a pesquisadora. O estudo, divulgado em 28 de março, também não contabilizou a tragédia ocorrida numa creche particular em Blumenau, no último dia 5, que causou a morte de quatro crianças.
Somente neste início de ano, já foram ao menos quatro casos de mais destaque: o ataque com bomba caseira por um ex-aluno em Monte Mor (SP), em 13 de fevereiro; o ataque a faca por um aluno de 13 anos a uma escola em São Paulo, que deixou uma professora morta e quatro pessoas feridas em 27 de março; o ataque a faca por um aluno a colegas em uma escola do Rio de Janeiro em 28 de março; e agora o atentado à creche em Santa Catarina.
Os agressores são em geral jovens (10 a 25 anos), do sexo masculino. E muitos deles são vítimas de bullying na escola, apresentam características de isolamento social e indícios de transtornos mentais não diagnosticados ou acompanhados. Eles se articulam em comunidades online onde há incentivo à violência, à misoginia, e em plataformas de fácil acesso na internet, apontam os estudos.
Para Michele Prado, o aumento da frequência dos ataques no país é resultado de um processo de radicalização online em massa que atinge principalmente o público jovem, a partir dos 10 anos. “Elas não estão da deep web ou na dark web, estão na superfície, em aplicativos como Discord, Twitter, TikTok, Telegram e WhatsApp”, diz Prado.
Ela avalia que não há uma razão única para a radicalização e os agressores têm perfis radicalizados distintos. “Alguns jovens se queixam de bullying, outros parecem ter transtorno de personalidade narcisista, com perfil de agressores e não de vítimas. Nas redes, eles são expostos a teorias conspiratórias que desumanizam grupos específicos”, exemplifica.
Veja a nota técnica:
Levantamento feito por pesquisadores da Unicamp, liderado pela professora Telma Vinha, chegam a números semelhantes. Considerando apenas casos envolvendo alunos e ex-alunos como agressores, o grupo registra 22 ataques entre 2002 e 2023, sendo 10 deles nos últimos dois anos.
Para Danila Di Pietro, pesquisadora da Unicamp, que integra o grupo coordenado por Telma Vinha, o aumento no número de ataques a escolas nos últimos anos está relacionado também ao avanço da cultura de violência no país.
“De cinco anos para cá, passamos por uma banalização da violência. O uso de armas de fogo, de um discurso de ódio, separatista, racista, misógino, homofóbico, até por autoridades oficiais, com isso ganhando escala pública, tudo isso faz com que as pessoas que cultivavam esses valores no seu ambiente privado passem a ganhar corpo público”, afirma Di Pietro.
VINCULAÇÃO COM BOLSONARISMO
Em entrevista à Hora do Povo, Claudete Alves, presidente do Sedin – Sindicato dos Educadores da Infância do Município de São Paulo – também corrobora para essa tese. “Quando você vai analisar o perfil de todos esses agressores, de todos esses envolvidos nesses ataques, nessas tentativas, todos, de alguma forma, têm vinculação com o Bolsonaro”, observa. “Através de clube de tiros, de grupos, através da defesa do fascismo, (das ideias) de Hitler – e de armas”, completa.
Cláudio Fonseca, presidente do Sinpeem – Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo – que também concedeu entrevista ao HP, vê uma relação entre o discurso bolsonarista e os atos violentos nas instituições escolares. “Foram 4 anos de incentivo a discriminações, preconceitos, liberação para posse e uso de armas, campanha de ódio”, diz.
Michel Prado analisa que o caso do adolescente de 13 anos que matou a facadas uma professora de 71 anos, em São Paulo, no dia 27 de março, é mais um atentado “relacionado às subculturas extremistas que atuam como um catalisador da radicalização online para o extremismo violento e que alcança um público com faixa etária cada vez mais jovem (a partir dos 10 anos).
“Ao menos seis agressores responsáveis por atentados de extremismo violento e/ou tentativas no último ano aqui no Brasil exibiram (através de análise de suas pegadas digitais) conexões diretas com a subcultura online extremista e letal True Crime Community e outras subculturas ligadas à ‘black pill’ como a ‘incelsfera’”, menciona em um trecho da nota técnica
O termo black pill (pílula preta, em inglês) traduz a profunda desesperança de um indivíduo com relação à sociedade, sem expectativa de melhora. A estudiosa alerta para os riscos de redes sociais mundialmente populares, como o TikTok, que são também porta de entrada para radicalização de jovens para cometer ataques violentos.
“No TikTok, as hashtags relacionadas à essa subcultura online extremista são abundantes e circulam livremente como mostra levantamento realizado no período de dezembro de 2022 a janeiro de 2023 pela equipe do Núcleo Jornalismo. O levantamento encontrou aproximadamente 344 milhões de visualizações relativas aos conteúdos de extremismo violento online produzidos por usuários dessa subcultura”, exemplificou.
Claudete defende que as medidas anunciadas pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, sobre as novas regras de regulação da internet, que devem ser seguidas pelas plataformas digitais, com o objetivo de prevenir violência contra estudantes, “têm que tomar corpo”.
“Têm que tomar corpo, tem que inundar (as decisões) de todos os governantes, e tem que contar com o apoio da sociedade brasileira porque a gente tem que imputar responsabilidade aos responsáveis pelas redes sociais. […] Não tem outra saída”, ressalta. “Tem que haver punição, tem que haver suspensão da vinculação das redes que divulgam e que facilitam a disseminação dessas práticas, dessas ameaças.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) solicitou a exclusão de 270 contas do Twitter que veiculavam hashtags relacionadas a ataques contra escolas de todo o país no último dia 9. Hashtags são palavras-chave ou termos associados a uma informação ou discussão que se deseja indexar de forma explícita em aplicativos, como Twitter e Facebook, antecedidos pelo símbolo cerquilha (#).
Segundo a dirigente sindical, nas escolas que ela visita, as pessoas estão com medo, assustadas por conta de mensagens difundidas nas redes que ameaçam novos ataques às escolas em diversas cidades do país. Apesar de a maioria dessas mensagens ser falsa, pais, alunos e professores manifestam medo.
A deputada estadual Maria Isabel Noronha (PT), que também é presidente da Apeoesp, o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paul, em pronunciamento na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), afirma que o discurso hostil do ex-presidente Bolsonaro influenciou a violência por parte de jovens. “Nós acompanhamos o comportamento hostil de um presidente, que fazia a simbologia de arma o tempo todo. E ao mesmo tempo promovia a negação da ciência –se isso não tiver um impacto na cabeça dos jovens, eu não sei então o que é lidar com o ser humano”.
Após os últimos ataques, autoridades têm adotado medidas para combater a violência nas escolas. O governo de São Paulo anunciou a alocação de policiais no interior dos estabelecimentos escolares e a ampliação de um programa de mediação de conflitos nas unidades de ensino.
Por sua vez, o governo federal criou um grupo interministerial para estudar propostas de políticas públicas que possam reforçar a segurança e o bem-estar nas escolas.
JOSI SOUSA
Internet é terra sem lei. O que mais tem é criminoso, vagabundo e trambiqueiro. Galera confunde liberdade com libertinagem.
Essa onda de extremismo não é de hoje. Esses pensamentos se disseminam, pois as pessoas precisam colocar a culpa de seus problemas em alguém. Por isso que tem um monte de ultraliberais por aí. Parece que o extremismo ficou mais forte, mas o que aconteceu foi tão somente a popularização das redes sociais.
Já havia blogueiros que xingavam todo mundo muito antes de Bolsonaro ficar famoso.
Nunca se preocuparam com isso. Ninguém fez nada. Deu no que deu.
Abraços de Aracaju.