O golpe de 1º de abril de 1964 foi um plano arquitetado nos porões da CIA e da Casa Branca com apoio de sua quinta-coluna interna para bloquear o desenvolvimento do Brasil
O golpe de Estado de 1964 representou o momento em que o imperialismo americano conseguiu, depois de várias tentativas frustradas, interromper o projeto político que propiciou ao Brasil um vigoroso desenvolvimento, iniciado em 1930, e que transformava o país numa grande nação, desenvolvida, e socialmente justa. Àquela altura, isso foi interpretado pelos governantes americanos como uma ameaça aos seus interesses.
DERRUBADA DE JANGO
A derrubada do presidente democraticamente eleito, João Goulart, não passou de um plano arquitetado nos porões da CIA e da Casa Branca – com apoio da quinta-coluna lacerdista – para tentar interromper o desenvolvimento econômico e social do Brasil. O regime implantado pela força foi uma ditadura que prendeu, torturou, exilou e matou opositores para, em essência, servir aos interesses dos EUA e de seus monopólios.
Há cinco séculos, o Brasil trava uma luta árdua por sua completa independência e soberania. Desde sempre, as potências imperiais exploram o país e se esforçam para sufocar e impedir o seu desenvolvimento. A luta de classes no Brasil de hoje, que opõe, de um lado a nação, e de outro, o imperialismo – batalha central de nossa época – vem se agudizando e se reflete na contenda entre as classes sociais que querem o progresso do país e rejeitam o imperialismo e as classes sociais submissas e ele e que defendem os seus interesses.
RESISTÊNCIA ANTI-IMPERIALISTA
A resistência à ditadura, que forjou uma ampla frente democrática e derrotou o regime implantado em 64, foi mais uma página heroica desta grande jornada mais geral do país para se livrar do domínio das potências, inicialmente coloniais – Portugal e Inglaterra – e depois imperialistas – Inglaterra e EUA.
Em diversos episódios de nossa história, as Forças Armadas se somaram ao país contra o domínio imperial. Só para recordar alguns desses momentos, tivemos a Batalha dos Guararapes, a Inconfidência Mineira, as lutas da Independência, a luta pela Abolição e a República, o Tenentismo, as revoltas de 1922 e 1924, a Coluna Prestes e a Revolução de 1930, para citar os mais significativos.
Em outros momentos, no entanto, o império e seus cúmplices conseguiram arrastar parte dos militares para o campo antinacional e antidemocrático. Exemplo marcante disso foi exatamente o golpe de 1º de abril de 1964. O imperialismo americano logrou neste episódio envolver setores importantes das Forças Armadas em seus planos ditatoriais e antinacionais. O resultado foi a imposição ao país de um regime pró-monopólios americanos e contrário aos interesses estratégicos do Brasil e de seu povo.
“AMARRAMOS A VACA PARA OS AMERICANOS MAMAREM”
O general Antônio Carlos de Andrada Serpa, um militar nacionalista que apoiou o regime de 64, e que, em 1983, ao lado de outros setores que se afastaram da ditadura, como Teotônio Vilela, Severo Gomes e outros, foi quem melhor sintetizou as consequências do golpe para o país. Numa reunião – presenciada por mim naquele ano – o militar analisou o que ocorrera e admitiu, sem meias palavras: “hoje nós militares percebemos claramente que amarramos a vaca para os americanos mamarem”.
Era uma confissão de que ele e seus companheiros haviam sido iludidos. Não só os militares haviam se deixado envolver na lábia imperial, mas também parte significativa da elite brasileira. O “envenenamento” da sociedade pelas intrigas do capital financeiro não poderia deixar de atingir também as Forças Armadas, que dela se origina.
Exemplo disso foi a reação de histeria às invencionices sobre uma fantasiosa “ameaça comunista de Jango”, e também às outras excrescências reacionárias usadas com o objetivo de abolir a democracia e colocar o país de joelhos.
NACIONAL DESENVOLVIMENTISMO INTERROMPIDO
Toda a artimanha golpista visava interromper o projeto nacional de desenvolvimento. Projeto este que colocava o Brasil naquela época – e por todo aquele período desde 1930 – como campeão mundial no ritmo de crescimento do PIB em comparação com o resto do mundo capitalista.
É verdade que eles tiveram muitas dificuldades para barrar esse crescimento brasileiro. Isto ocorreu porque o impulso de crescimento iniciado em 30 era tão avassalador que, mesmo com toda a sabotagem imposta pelo novo regime, o crescimento manteve-se com fôlego até o final dos anos 80 e início dos anos 90, quando o parasitismo neoliberal tomou conta de forma mais profunda da economia brasileira.
Há que se registrar que os setores militares que se deixaram envolver pela Casa Branca e a CIA em 1964 eram minoritários dentro das Forças Armadas. A história confirma que, para conseguir empalmar o poder, eles tiveram que prender e afastar mais de seis mil integrantes das Três Forças. Depois disso, os imperialistas e seus cúmplices internos reuniram o que havia de mais retrógrado e antidemocrático no país.
ARROCHO SALARIAL E VENDA DO BRASIL
O período de domínio do fascismo, tanto em 64 quanto em 2018, significou a submissão mais abjeta aos monopólios e bancos estrangeiros, particularmente os americanos, e a tentativa de destruição de tudo o que foi construído pelos brasileiros durante toda a sua história. Significou também um desprezo brutal ao povo brasileiro e aos seus anseios. Um arrocho sem tamanho dos salários e a destruição de direitos conquistados em décadas de luta.
Mais até do que apenas refletir sobre esse passado, o que devemos e podemos fazer nestes sessenta anos do golpe de 64 é comemorar a derrota dos que queriam desenterrar o atraso e o obscurantismo daquela época e destruir o futuro do país. Um atraso do qual o Brasil e o seu povo, depois de muita luta e muito sacrifício, já haviam se livrado.
O que impedimos ao tirar Bolsonaro em 2022 foi uma nova tentativa de transformação do Brasil em pária internacional e capacho dos EUA. A reação firme da sociedade, bem como o posicionamento legalista das Forças Armadas – apesar da intensa pregação fascista em seu interior – impediram que se consumasse outro golpe contra o país e a democracia.
SÉRGIO CRUZ