(HP 17/02/2012)
MIKIS THEODORAKIS E MANOLIS GLEZOS*
Em tempos antigos, o perdão de Solón das dívidas que obrigavam os pobres a ser escravos dos ricos – a chamada reforma Seisachtheia, assentou as bases para a aparição, na antiga Grécia, das ideias da democracia, cidadania, política e Europa: os fundamentos da cultura europeia e mundial.
Lutando contra a classe dos ricaços, os cidadãos de Atenas assinalaram o caminho para a constituição de Péricles e a filosofa política de Protágoras, que disse: “O homem está muito acima de todo o dinheiro”.
Hoje em dia, vemos a vingança dos endinheirados: “Os mercados estão muito acima de todos os homens” é o lema que nossos líderes políticos abraçam com tanto gosto, aliados ao demônio dinheiro como novos Faustos.
Um punhado de bancos internacionais, agências de informação, fundos de investimento, numa concentração mundial de capital financeiro sem precedentes históricos, reivindica o poder na Europa e em todo o mundo e prepara a abolição de nossos estados e nossa democracia, com a arma da dívida, para escravizar a população europeia, colocando no lugar das imperfeitas democracias que temos a ditadura do dinheiro e a banca, o poder do império totalitário da globalização, cujo centro político está fora da Europa continental apesar da presença de poderosos bancos europeus no coração do império.
Começaram com a Grécia, utilizada como cobaia para deslocar-se a outros países da periferia europeia e, pouco a pouco, até o centro. A esperança de alguns países europeus para escapar eventualmente demonstra que os líderes europeus se enfrentam a um novo “fascismo financeiro”, não fazendo melhor do que quando se enfrentaram à ameaça de Hitler no período entreguerras.
Não é uma casualidade que grande parte dos meios de comunicação controlados pelos bancos tratem os países da periferia da Europa como “porcos – pigs” e sua campanha midiática, sádica e racista, vá tingida de desprezo. Seus meios de comunicação não se dirigem somente contra os gregos, mas também contra a herança grega e a antiga civilização grega. Esta opção mostra os objetivos profundos e ocultos das ideologias e dos valores do capital financeiro, promotor de um capitalismo de destruição.
A tentativa dos meios de comunicação alemães de humilhar símbolos, como a Acrópole ou a Vênus de Milo, monumentos que foram respeitados até mesmo pelos oficiais de Hitler, nada mais é senão expressão do profundo desprezo dos banqueiros que controlam os meios de comunicação, já não tanto contra os gregos, mas sobretudo contra as ideais de liberdade e democracia que nasceram neste país.
O monstro financeiro produziu quatro décadas de isenção de impostos para o capital, todo tipo de “liberalização de mercado”, uma ampla desregulação, a abolição de todas as barreiras aos fluxos financeiros e às especulações, os constantes ataques contra o Estado, a compra de partidos e meios de comunicação, a apropriação do excedente por um punhado de vampiros: os bancos mundiais de Wall Street. Agora, este monstro, um verdadeiro “Estado por trás dos Estados” parece preparado para acertar um “golpe de Estado permanente” financeiro e político, e para mais de quatro décadas.
Necessitamos criar uma frente de resistência potente contra “o império totalitário da mundialização” que está em marcha, antes que seja tarde demais.
A Europa somente pode sobreviver se apresenta uma resposta unida contra os mercados, um desafio maior que o deles, um novo “New Deal” europeu.
Devemos deter de imediato o ataque contra a Grécia e aos outros países da União Europeia na periferia, precisamos pôr fim a esta política irresponsável e criminosa de arrocho e privatização, que conduz diretamente a uma crise pior que a de 1929.
As dívidas públicas devem ser reestruturadas de forma radical na Eurozona, especialmente às expensas dos gigantes da banca privada. Os bancos devem voltar a ser avaliados e o financiamento da economia europeia deve estar sob controle social, nacional e europeu. Não é possível deixar a chave financeira da Europa nas mãos dos bancos, como Goldman Sachs, JP Morgan, UBS, Deutsche Bank, etc … Temos que proibir os excessos financeiros incontrolados que são a coluna vertebral do capitalismo financeiro destrutivo e criar um verdadeiro desenvolvimento econômico em lugar de ganâncias especulativas.
A arquitetura atual, baseada no Tratado de Maastricht e nas regras da OMC, instalou uma máquina na Europa para fabricar dívida. Necessitamos uma mudança radical de todos os tratados, a submissão do BCE ao controle político da população europeia, uma “regra de ouro” para um mínimo de nível social, fiscal e meio-ambiental da Europa. Necessitamos urgentemente uma mudança de paradigma, um retorno ao estímulo de crescimento através da demanda de novos programas de investimento europeus, as novas regulações, os impostos e o controle do capital internacional, uma nova forma de protecionismo suave e razoável numa Europa independente seria protagonista na luta por um mundo multipolar, democrático, ecológico e social.
Chamamos as forças e pessoas que compartilham estas ideias a convergirem, o mais rapidamente possível, numa ampla frente de ação europeia para produzir um programa de transição, para coordenar nossa ação internacional, com o objetivo de mobilizar as forças do movimento popular, para reverter o atual equilíbrio de forças e derrotar aos atuais líderes dos nossos países, historicamente irresponsáveis, com o fim de salvar a nosso povo e a nossa sociedade antes que seja demasiado tarde para a Europa”.
* Mikis Theodorakis, renomado maestro e compositor, e Manolis Glezos, herói grego que arrancou a bandeira nazista da Acrópole escreveram esta Carta Aberta pela mobilização popular contra o fascismo financeiro.
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