“Apagão é consequência do corte de pessoal em mais de 30% desde 2019 e da ausência de investimentos no sistema elétrico”, afirma Murilo Pinheiro, presidente do Sindicato
Publicamos, a seguir, artigo de Murilo Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP):
Apagão expõe equívoco da privatização de serviços essenciais
Para além da premência em garantir cidades resilientes em meio a eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, o temporal que atingiu a Região Metropolitana de São Paulo na noite da última sexta-feira (11/10) e ceifou a vida de sete pessoas revela o que especialistas têm alertado há tempos: o equívoco da privatização de serviços essenciais, como energia.
Três dias depois, ao final da manhã de segunda-feira (14/10), aproximadamente 460 mil consumidores continuavam sem energia, a maioria na Capital. O temporal – acompanhado de vendaval de 107,6 km na cidade de São Paulo, o mais forte registrado desde 1995 – derrubou 17 linhas de alta tensão, deixando às escuras 2,6 milhões de consumidores, sendo destes 2,1 milhões atendidos pela Enel no Estado.
Apagões têm se tornado frequentes nas áreas abrangidas por essa multinacional italiana, que somam 7,8 milhões de unidades consumidoras. Em novembro de 2023, 4 milhões foram afetadas e centenas de milhares ainda enfrentavam a falta de energia cinco dias depois. Em março último, outro blecaute na área central da Capital custou mais de 30 horas para que a luz fosse totalmente restabelecida.
A justificativa dada pela Enel se repete: a demora se deve à complexidade exigida para os reparos. Na verdade, é consequência do corte de pessoal em mais de 30% desde 2019 e da ausência de investimentos no sistema elétrico, como amplamente noticiado.
Não apenas a energia poderia ser restabelecida rapidamente, como também haveria condições de prevenir ocorrências de tal monta, caso se colocasse em ação plano de contingência, houvesse investimentos em engenharia de manutenção e adequação da rede.
O SEESP vem alertando sobre essas falhas não é de hoje e volta a chamar atenção para o equívoco da privatização de serviços essenciais. O debate agora é retomado diante da demora na restituição de energia nas áreas afetadas na Grande São Paulo.
Tendo assumido a concessão da antiga Eletropaulo em 2018 com vigência por dez anos, a precariedade no serviço prestado pela Enel vem elevando os questionamentos. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) informou que intimará a empresa a prestar esclarecimentos e adequar a distribuição, podendo inclusive vir a recomendar a caducidade da concessão junto ao Ministério de Minas e Energia, caso não haja solução imediata.
O assunto volta à baila a cada novo apagão, mas lamentavelmente o que se observa é que é deixado de lado ao acender das últimas luzes restantes.
Enquanto isso, a população sofre com problemas cada vez mais recorrentes e frequentes, fruto da piora da qualidade e desmonte como consequência das privatizações no setor elétrico.
Em prol do interesse público, é urgente rever esse modelo que já se provou desastroso. Aliado a isso, garantir o protagonismo da engenharia na tomada de decisões rumo a cidades inteligentes, ou seja, aquelas que funcionam adequadamente, assegurando bem-estar às suas populações.
Propostas nessa direção constam da nova edição do projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, iniciativa da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), com adesão do SEESP. Levá-las em conta se torna premente, para não mais termos que conviver com escuridão e tragédias anunciadas.
Engenheiro Murilo Pinheiro
Presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo