
Em ata do Copom, Banco Central diz que “não hesitará” em aumentar o arrocho monetário
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) sinalizou na ata, divulgada hoje, que não pretende reduzir os juros nos próximos meses, afrontando a indústria, o comércio e os serviços, enfim, o setor produtivo e os consumidores que estão sendo fortemente prejudicados pelo aperto monetário. Na última quarta-feira (19), o colegiado decidiu manter a taxa básica de juros da economia (Selic) em 15% ao ano – o maior nível desde 2006, mantendo o Brasil em segundo lugar com o mais alto juro real do mundo.
No documento, o Copom diz, a pretexto de convergir a inflação para a meta, que optou em “manter a taxa inalterada”, e como vem defendendo Gabriel Galípolo, presidente do BC, “por período bastante prolongado”.
“O Comitê seguirá vigilante e não hesitará em retomar o ciclo de alta se julgar apropriado”, ameaça em ata, no momento em que o país precisa crescer, avançar nas políticas de reindustrialização e na melhoria das condições de vida da população. Além dos juros mais altos do mundo, o Brasil está sob ataque do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, através da imposição do tarifaço. Mantendo o juro em 15% num situação como essa, o BC age como quinta-coluna.
Como disse o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), não existe reindustrialização com juros estratosféricos. “O que existe é a paralisia nos investimentos produtivos com sequelas para toda a sociedade”, denunciou Ricardo Alban. Só quem se beneficia com a Selic a 15% é o rentismo que não produz nada e não traz nenhum benefício ao país.
JURO DO BC SUFOCA A ECONOMIA
O Copom decidiu manter os juros elevados sufocando a economia brasileira que está em forte desaceleração. No segundo trimestre deste ano, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu apenas 0,4%, resultado bem abaixo dos 1,3% registrado no primeiro trimestre deste ano. A taxa de investimento foi de 16,8% do PIB no segundo trimestre, 1 ponto percentual (p.p.) menor em relação ao trimestre anterior. E muito aquém das necessidades do país, como aponta José Velloso, presidente da associação das indústrias de máquinas (Abimaq).
“O Brasil sofre na última década com uma taxa de investimento muito baixa. O Brasil teria que estar investindo 23% a 25% do PIB. Investimentos são máquinas, equipamentos, bens de capital, construção civil, e a taxa de investimento, média, no Brasil está em torno de 17% do PIB”, defende Velloso. “Hoje nós temos o maior juro real do mundo, uma taxa de 10%, uma Selic de 15% e uma inflação de 5% , uma taxa de juro muito elevada”.
De acordo com a ata do Copom, “a principal conclusão obtida e compartilhada por todos os membros do Comitê foi de que, em um ambiente de expectativas desancoradas, como é o caso do atual, exige-se uma restrição monetária maior e por mais tempo do que outrora seria apropriado”. As expectativas em questão são as do clube de bancos – setor que se beneficia do ambiente de juros altos – que alimenta os dados do Boletim Focus do BC.
No primeiro semestre deste ano, para se ter uma ideia, os três principais bancos privados do Brasil (Itaú, Bradesco e Santander), juntos, registraram um lucro líquido de R$ 42 bilhões, sendo uma alta de 19,8% em relação ao mesmo período de 2024, quando somaram R$ 35,1 bilhões.
Entre as justificativas para tal desancoragem das expectativas do mercado, o Copom aponta “as incertezas sobre a estabilização da dívida pública”. Desprezando a sua responsabilidade com o crescimento da mesma.
Sob efeito da elevada Selic do BC, o gasto do setor público (União, Estados/municípios e estatais) com os juros já ultrapassou a marca de meio trilhão de reais (R$ 525,7 bilhões) no acumulado de janeiro a julho deste ano. Em 2024, ao todo, foram R$ 950,423 bilhões, ou 8,05% do Produto Interno Bruto (PIB), superando em mais de R$ 200 bilhões o recorde anterior, de R$ 718,294 bilhões, alcançado em 2023.
INFLAÇÃO DESACELERA
Na ata, o Copom reconhece que “as leituras recentes de inflação mostram dinâmica mais benigna em relação ao que se previa no início do ano”, devido a “combinação de um câmbio mais apreciado e um comportamento mais benigno das commodities contribuiu para uma redução nas inflações de bens industrializados e alimentos”.
Desde a última disparada em fevereiro (alta de 1,31%) deste ano, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) passou a arrefecer mês a mês (0,56% em março; 0,43% em abril; 0,26% em maio e julho) até variar negativamente em agosto (0,11%), dado mais recente do indicador oficial de inflação, calculado pelo IBGE.
No entanto, o Copom avalia que a inflação segue “sendo pressionada pela demanda e que requer uma política monetária contracionista por um período bastante prolongado”.
Na passagem do primeiro para o segundo trimestre, o consumo das famílias, diminuiu da alta de 1% para alta de 0,5%. Período que houve recuo no consumo do governo, que caiu -0,6%, após não crescer no primeiro trimestre.
Segundo o colegiado, o setor de serviços “tem se mantido mais resiliente, respondendo a um mercado de trabalho que segue dinâmico e a uma atividade que tem apresentado moderação gradual”, diz o Copom.
No segundo trimestre, Serviços, atividade econômica que compõe a maior fatia do PIB, apresentou um crescimento de 0,6%. Neste período, houve estagnação do crescimento no Comércio (0%) – principal segmento de serviços. De abril a julho deste ano, as vendas do comércio varejista acumulam uma queda de 1,1%.
Do lado da oferta ainda, a Indústria – que impulsionou crescimento econômico do país no ano passado – também não vê crescimento significativo em sua produção entre os meses de abril a julho deste ano – tempo que acumula perda de 1,5%.
O baixo ritmo do setor está ligado à indústria de transformação – ramo que corresponde a mais de 80% da indústria geral, que não cresce há quatro meses (abril a julho). No segundo trimestre deste ano, a indústria manufatureira voltou a apresentar perda no crescimento, com queda de -0,5% no período, após um recuo de 1% no primeiro trimestre de 2025.
No segundo trimestre, os investimentos em máquinas, equipamentos e construção civil, medidos pela Formação Bruta de Capital Fixo, caíram -2,2%, o que retira boa parte dos ganhos obtidos no primeiro trimestre (3,2%).