“Os culpados pelo problema elétrico têm nome e sobrenome: Nicolás Maduro Moros e Diosdado Cabello (chefe do arremedo de Assembleia Constituinte recentemente formada por Maduro e apoiadores). Esta situação é só um ápice do que estamos vivendo neste momento”, afirmou o engenheiro Pedro Fernández, em entrevista ao jornal mexicano Tribuna.
O engenheiro Fernández está entre os que formam um conjunto de especialistas em engenharia e serviços de infraestrutura que discordam da versão de Maduro para o maior apagão da história da Venezuela que, se estendeu por mais de 20 horas afetando a Capital Caracas e pelo menos 21 dos 23 Estados do país.
Diante da crise destes 7 e 8 de março, Maduro acusa o “imperialismo estadunidense” de “sabotagem”, que denominou de “guerra elétrica” dizendo que “para vencê-la, estão convocados todos os patriotas”.
O apagão teve início às 16h (hora local, 15h no horário de Brasília) e somente duas horas depois a empresa de energia venezuelana, Corpoelec, anunciou que o serviço de energia seria restituído em 3 horas o que nãoocorreu até agora, passadas mais de 18 horas do anúncio da empresa venezuelana.
O ministro de Energia Elétrica, Luis Motta Dominguez, secundou as denúncias de Maduro mas, o fez de forma estranha, sem se comprometer: “Camaradas, de acordo ao informe recebido da SEBIN (Servicio Bolivariano de Inteligencia Nacional) a falha inicial, em Caracas, se originou pelo corte de cabos de controle dos transformadores de tensão”.
De fato, é estranho que seja a SEBIN e não os especialistas da Corpoelec que saibam detalhes complexos sobre falhas do sistema de energia elétrica ocasionadoras de um apagão dessa dimensão.
As contradições seguiram desencontradas pois enquanto Dominguez parecia localizar a origem da falha, o próprio Maduro falava, de forma genérica, em problemas em “locais de difícil acesso” que teriam atingido a hidrelétrica Guri, principal do país e responsável pela geração de 70% da energia consumida pelos venezuelanos.
O ministro das Comunicações, Jorge Rodríguez, acrescentou mais confusão do que esclarecimento ao afirmar, primeiro, que “a falha se produziu em zona de difícil acesso e com instabilidade atmosférica, retardando o reparo” para, horas depois, sustentar que se tratara de uma “sabotagem criminosa, brutal” que busca deixar a Venezuela sem o fornecimento de energia elétrica por “vários dias”.
O jornal mexicano La Jornada destaca que “enquanto altos funcionários denunciam ‘sabotagem’, especialistas acusam o governo de falta de investimentos na manutenção da infraestrutura em meio a uma grave crise econômica”.
Domingo González, secretário de organização do Sindicato dos Trabalhadores Eletricitários, em entrevista, ao portal Sputnik, no dia 1º de agosto do ano passado, quando um apagão atingiu Caracas e os Estados de Vargas e Miranda, e o governo Maduro também denunciou suposta “sabotagem”, declarou:
“Não é sempre que haja corte de energia elétrica que se pode dizer que é sabotagem, estamos pedindo ao executivo que aprove recursos para ativar a empresa Corpoelec. Ela está em ruínas, porque se deixou, há anos, de investir na indústria de geração elétrica, muito menos em manutenção para que as unidades operem”.
Além disso, a versão da sabotagem é muito pouco verossímil. Em primeiro lugar, por não se ter – até agora pelo menos – mostrado onde e como teria se dado a sabotagem e, ainda mais, considerando-se que, há um ano atrás, em meio a outro corte de energia elétrica, Maduro ordenou às Forças Armadas que “ativem um plano especial para custodiar as instalações do sistema elétrico”.
O apagão afetou hospitais e a atividade do aeroporto internacional Simón Bolívar. O metrô de Caracas parou.
Há poucas horas, a vice-presidente, Delcy Rodriguez, e o ministro das Comunicações, Jorge Rodríguez, anunciaram que as atividades escolares estão suspensas. Também foi suspenso o programado jogo de futebol entre o Deportivo Lara, da Venezuela e o Emelec do Equador, pelo Grupo B da Copa Libertadores. O jogo estava previsto para a cidade de Barquisímeto na quinta-feira à noite.
A comunicação entre os familiares, com as multidões andando distâncias quilométricas pelas ruas, foram se impossibilitando com o fim da carga das baterias dos celulares.
Panelaços de protesto foram ouvidos em vários bairros de Caracas.
A situação está mais grave, pois com a perda constante de valor da moeda diante de uma inflação prevista para 10.000.000% para 2019 – uma cédula de 500 bolivares vale 0,15 centavos de dólar, o que mal dá para comprar um caramelo -, o pagamento para a quase totalidade das transações se dá por cartão de débito, o que ficou suspenso pelo apagão. Compras simples como pão e café estão praticamente suspensas.
Adriana Bellorín, uma advogada, que saiu em busca de comida, reclamou: “Sem luz não posso comprar nada”.
“Já estamos cansadas e esgotadas”, declarou à France Press, Estefania Pacheco, mãe de dois filhos e que teve que percorrer 12 quilômetros a pé de casa até seu lugar de trabalho como executiva de vendas em uma empresa situada em Caracas.
“Dá tristeza cada vez que estas coisas acontecem”, lamentou Estefania, referindo-se aos cortes de eletricidade habituais na Venezuela.
NATHANIEL BRAIA