“O Banco Central do Brasil é uma das poucas autoridades monetárias do mundo que está aumentando de forma significativa a taxa de juros básica para enfrentar um choque de oferta de caráter temporário que está ocorrendo no mundo inteiro”, ressalta o economista José Luis Oreiro
“A combinação entre política ambiental desastrosa, conflitos diplomáticos frequentes com nosso principal parceiro comercial e a incerteza política causada pelos frequentes ataques do Presidente da República às instituições democráticas do país fazem com que o investidor externo fuja do país como o diabo foge da Cruz”, diz o economista e professor da UNB, José Luis Oreiro, ao avaliar o aumento dos juros pelo Banco Central.
“Nesse contexto de aumento da aversão dos investidores internacionais a aplicações denominadas em Reais, o aumento da taxa de juros pode ser contraproducente ao sinalizar para os mesmos que as aplicações no Brasil são, de fato, muito arriscadas pois o Banco Central do Brasil é uma das poucas autoridades monetárias do mundo que está aumentando de forma significativa a taxa de juros básica para enfrentar um choque de oferta de caráter temporário que está ocorrendo no mundo inteiro“, destaca o economista.
Segundo Oreiro, “o BCB aplica uma política monetária que destoa não apenas do praticado pelos bancos centrais dos países desenvolvidos, como também dos bancos centrais de outros países emergentes como é o caso da Turquia”, país que recentemente reduziu a taxa básica de juros.
“O aumento da taxa de juros levou a uma depreciação da taxa nominal de câmbio, o que deverá aumentar, ao invés de reduzir, as pressões inflacionárias nos próximos meses”, afirma no artigo publicado em seu site, que reproduzimos a seguir.
A relação entre câmbio e juros no Brasil:
Algo errado não está dando certo
JOSÉ LUIS OREIRO
No primeiro semestre de 2021, face a aceleração da inflação, não foram poucos os economistas “heterodoxos” que defenderam uma elevação da taxa de juros Selic, que se encontrava em 2% a.a em termos nominais até fevereiro de 2021. Os argumentos propostos foram de que (i) A selic muito baixa (com respeito a algum valor de referência, quem sabe a taxa natural de juros) estava produzindo um aumento da inclinação da estrutura a termo da taxa de juros, pois o mercado financeiro acreditava que o BCB teria que aumentar a selic no futuro próximo, o que aumentava a taxa de juros de longo-prazo; (ii) A redução da taxa selic ocorrida ao longo do ano de 2020 produziu uma forte depreciação da taxa de câmbio R$/US$, resultando numa aceleração da inflação a partir do último trimestre de 2020, com impacto fortemente negativo sobre o rendimento real da população, especialmente os mais pobres.
Nesse contexto, uma normalização da política monetária (leia-se aumento da selic) produziria automaticamente (a) uma redução da taxa de juros de longo-prazo e (ii) uma apreciação da taxa de câmbio com a correspondente redução das pressões inflacionárias.
Na reunião de ontem do COPOM, a taxa Selic foi aumentada em 150 b.p [basis points] para 7,75% a.a. Desde março do corrente ano a taxa selic já aumentou em 575 b.p. Isso deveria ter produzido, com base no raciocínio exposto acima, uma forte valorização da taxa de câmbio, bem como uma redução da taxa de juros de longo-prazo. Infelizmente, “sua majestade” o fato mostrou que o resultado esperado pelos “neo-rentistas” não foi realizado.
A figura acima, extraída do portal da Bloomberg, mostra que no período compreendido entre 21/09/2021 e 28/10/2021, o Real foi a segunda moeda que mais se desvalorizou no mundo, atrás apenas da Lira turca. Desde o dia 22 de setembro de 2021 o Banco Central do Brasil aumentou a selic em 250 p.b [pontos-base], ao passo que o Banco Central da Turquia, surpreendendo os mercados financeiros, reduziu a taxa básica de juros em 300 p.b. Enquanto na Turquia, o comportamento da taxa de câmbio seguiu o esperado pela teoria macroeconômica convencional, no Brasil o efeito foi oposto: o aumento da taxa de juros levou a uma depreciação da taxa nominal de câmbio, o que deverá aumentar, ao invés de reduzir, as pressões inflacionárias nos próximos meses.
Esse aparente paradoxo é explicado pelo que denominei de “custo Bolsonaro”: a combinação entre política ambiental desastrosa, conflitos diplomáticos frequentes com nosso principal parceiro comercial e a incerteza política causada pelos frequentes ataques do Presidente da República às instituições democráticas do país fazem com que o investidor externo fuja do país como o diabo foge da Cruz.
Nesse contexto de aumento da aversão dos investidores internacionais a aplicações denominadas em Reais, o aumento da taxa de juros pode ser contraproducente ao sinalizar para os mesmos que as aplicações no Brasil são, de fato, muito arriscadas pois o Banco Central do Brasil é uma das poucas autoridades monetárias do mundo que está aumentando de forma significativa a taxa de juros básica para enfrentar um choque de oferta de caráter temporário que está ocorrendo no mundo inteiro.
Com efeito, o BCE, o FED e o BOE têm mantido inalteradas suas respectivas taxas de juros num contexto de aceleração da inflação ao longo do ano de 2021. O BCB, contudo, aplica uma política monetária que destoa não apenas do praticado pelos bancos centrais dos países desenvolvidos, como também dos bancos centrais de outros países emergentes como é o caso da Turquia.
Em resumo, no Brasil tem algo errado – elevar a taxa de juros num contexto que a economia opera com enorme ociosidade dos fatores de produção – que não está dando certo, ou seja, não está produzindo os resultados esperados em termos de apreciação da taxa de câmbio e queda da taxa de juros de longo-prazo. A solução consiste em fazer o impeachment do Presidente da República e então reduzir os juros para um patamar compatível com o grau de ociosidade dos fatores de produção.