
Noite de autógrafos do lançamento no Rio de Janeiro, na livraria Leonardo da Vinci, segunda-feira, 29/11
O lançamento do livro dos pesquisadores Elias Jabbour e Alberto Gabriele, “China: o Socialismo do Século 21”, pela Editora Boitempo, reuniu em debate, no dia 22, os dois autores e dois convidados, o jurista, professor e escritor Silvio Almeida e a ex-presidenta Dilma Roussef, sob mediação, direto de Xangai, de Tings Chak, pesquisadora do Instituto Tricontinental, e introdução de Ivana Jinkings, em iniciativa divulgada pela TV Boitempo, TV Grabois e rede TVT.
O livro, disse Jabbour, é sobre “a nova economia do projetamento, que é o estágio em que a China e seu socialismo de novo tipo estão” e tem como objetivo descobrir “a dinâmica da nova formação econômico-social que emerge em 1978”.
Ele destaca que a China inaugurou ao longo do tempo “inovações institucionais que foram realocando em diferentes lugares da economia o papel do Estado e das outras formas de propriedade”. Desde 2006, políticas industriais ativas deram origem a inovações tecnológicas como o 5G, Big Data, Inteligência Artificial e computação quântica. Isso elevou sobremaneira a capacidade do Estado de planejar a economia.
Filosoficamente falando – acrescenta Jabbour -, existe uma elevação da capacidade humana de domar a natureza, isso significa em termos marxianos “o surgimento ou irrupção de um novo modo de produção”.
Cujo estudo – uma “aventura intelectual”-, como disse o economista Gonzaga Belluzo na quarta capa do livro, instiga “a perplexidade dos conformistas”.
O coautor, Alberto Gabriele, é professor e especialista em desenvolvimento e políticas industriais, com larga experiência em organismos da ONU.
Silvio Almeida e Dilma Roussef dispensam apresentação e Jabbour se disse “muito honrado” com a participação deles.
Sobre Tings Chak, Jabbour destacou que ela comandou o estudo ‘Servir ao Povo, a Erradicação da Pobreza Extrema na China’, de leitura indispensável. Para fazer isso, o Partido Comunista Chinês teve de “retomar o trabalho de base e enviou 3 milhões de quadros, durante 8 anos, para viver nos povoados rurais”, ela revelou.
A China – enfatizou a mediadora – nas últimas décadas “se tornou a locomotiva do sistema econômico mundial, conseguiu desenvolver uma base poderosa industrial e científica, conseguiu tirar 850 milhões da pobreza extrema, com as taxas de crescimento mais estáveis da história, e ao mesmo tempo tem se defrontado com inúmeras contradições – desigualdade social, monopólios das gigantes da tecnologia, financeirização”.
“NOVA ECONOMIA DO PROJETAMENTO”
A nova economia de projetamento é o estágio em que a China está, assinalou Jabbour em sua apresentação. Este livro é um “exercício do livre pensar” muito grande – “iniciamos lançando um desafio aos neoclássicos, mostrando que o socialismo é possível, até porque a falácia do homus economicus foi desnudada por nós – e também por apresentar a China a partir do conceito de formação econômico-social”.
Ou seja, a China é um socialismo de novo tipo, uma nova formação econômico-social que emerge após 1978, e a compreensão dela na primeira parte do livro “passou pela ressignificação de conceitos do marxismo, como lei do valor, modo de produção e formação econômico-social”.
“Nós temos clareza do tamanho da confusão em que nos metemos ao fazer isso. Estamos mexendo, tanto eu quanto Alberto, com quatro ou cinco gerações de comunistas que acreditavam que as coisas seriam de uma forma, mas elas estão sendo de forma completamente diferente”, disse o pesquisador.
“Eu e Alberto chegamos à conclusão amplamente antidogmática de que o socialismo na China estava se desenvolvendo e se reinventando através de instituições de mercado”.
Isso – ressaltou – é “uma heresia que não é pequena quando se fala em socialismo, e quando nós chegamos à conclusão de que as reformas rurais estavam reconectando aquela formação social às suas antigas bases milenares, comerciais, e que gerou um crescimento econômico virtuoso”.
Como segundo passo do livro, a construção e a descoberta da dinâmica desse processo. Porque não se trata de só de falar de uma nova formação econômico-social, mas também da observação “da sua coerência interna”, de como o conceito “se manifesta no mundo real”.
Que a China “inaugurou ao longo do tempo inovações institucionais que foram realocando em diferentes lugares da economia o papel do Estado e das outras formas de propriedade” – até chegar ao ponto de o grande país asiático em 2006 “inaugura políticas industriais ativas que levou ao surgimento de inovações tecnológicas disruptivas como o 5G, Big Data, Inteligência Artificial e agora o computador quântico”.
“Isso elevou sobremaneira a capacidade do Estado de planejar a economia. Filosoficamente falando, existe uma elevação da capacidade humana de domar a natureza, isso significa em termos marxianos o surgimento ou irrupção de um novo modo de produção”.
E essa elevação do novo modo de produção interna àquela formação econômico-social, suas características, “conseguimos encontrar algumas evidências delas em Ignácio Rangel, no livro famoso de 1959, evidentemente, não fizemos uma associação mecânica”, registrou Jabbour.
Ignácio Rangel foi fundamental para descobrirmos algumas regularidades que estão por trás desse novo estágio de desenvolvimento em que a China se encontra, que é o que nós chamamos de nova economia de projetamento, destacou.
A China tem hoje 2 milhões de pessoas – economistas, engenheiros, geógrafos – que estão ocupadas em planejar, elaborar e colocar em execução grandes projetos. E nesses projetos não é apenas uma relação custo-benefício que se busca neles. Tem também o que Ignácio Rangel chamava de “circunscrever o desemprego a uma circunstância restrita ao capitalismo”.
“Então esses engenheiros e economistas são obrigados a levar em conta, ao analisar um projeto, a necessidade de criar 13 milhões de empregos urbanos por ano. Isso é um grau de planejamento da economia que não existe parâmetro no mundo”.
“A partir disso, qual é a forma histórica como o socialismo se apresenta hoje? Para nós, o socialismo está em uma fase embrionária, ele surge hoje como forma histórica que é a nova economia de projetamento, que coloca a razão como instrumento de governo”.
O livro foi escrito antes da pandemia, e o pós pandemia demonstrou duas coisas: “que as hipóteses levantadas são corretas e a história não acabou, o socialismo vive e é uma realidade científica, que temos de abordar de forma científica”.
“LIVRO CORAJOSO”, DESTACA SILVIO ALMEIDA
Silvio Almeida – a quem Jabbour chamou de “maior expressão intelectual da nossa geração” – disse que China: Socialismo do Século 21 é “um livro perturbador, incontornável, seja qual for a posição que se tenha sobre a China. É exatamente nos debates que vai gerar que repousa sua grandiosidade”.
“É um livro corajoso, porque coloca em questão uma série de posições já estabelecidas. Primeiro, aos economistas neoclássicos que achavam que o jogo estava ganho, ou que não havia qualquer outro tipo de alternativa”.
“Assume outra briga, que é com os keynesianos. A pior briga é dentro de casa, com o pensamento marxista”.
Silvio Almeida também relatou a inusitada situação como conheceu Jabbour: advogando para ele, quando este era presidente de uma agremiação carnavalesca. Ambos, recordou, de raízes no samba.
O jurista saudou o resgate da “potência do pensamento racional” feito pelo livro. “Não é qualquer país que produz Ignácio Rangel, não é qualquer país que produz um Guerreiro Ramos, um Celso Furtado, um Darcy Ribeiro, um Florestan Fernandes”, sublinhou.
“O que eu estou falando aqui é um país forjado no fogo, na luta, nos horrores, nas contradições do capitalismo, do desenvolvimento, e é exatamente aqui que surgem as respostas necessárias para a superação de nossa condição histórica”. “Nós brasileiros, pensando junto com os chineses, com os africanos, com os nossos irmãos latino-americanos”, convocou.
“TEM GOSTO DE QUERO MAIS”, DIZ EX-PRESIDENTA DILMA
Para a ex-presidenta Dilma Roussef, o livro China: Socialismo do Século 21 tem uma “importância central” por investigar “o caminho alternativo traçado e seguido pela China”, e contrário “do que é pregado no Consenso de Washington”.
“Não se pode deixar de admirar um país que sai do feudalismo, do mais brutal controle colonialista, para se tornar a segunda maior economia do mundo e a primeira já em termos de paridade de poder de compra”, reiterou.
O livro tem “um grande mérito”: ele abre uma discussão teórica, uma discussão econômica, uma discussão política a respeito do que é a China, acrescentou Dilma Roussef, que aponta a “perspicácia e originalidade” com que Jabbour e Gabriele esboçam “conceitos e leis de movimento do que, de forma interessante, designaram como economia planificada de orientação socialista de mercado”.
A hipótese fundamental do livro, salientou Dilma Roussef, é que a China do século 21 “inaugura uma nova classe de formação social”, não é “um desdobramento dentro do capitalismo”, mas uma nova formação econômico-social.
Ela considerou ainda “extremamente bem construído” o conceito de “metamodo de produção” introduzido pelos autores, porque permite a vigência da lei do valor, quando se refere a “um tempo histórico maior” e a “um plano global” onde um modo de produção determinado domina. Ao mesmo tempo, contempla experiências nacionais de formações econômico-sociais.
Para concluir, a ex-presidenta disse que o livro de Jabbour e Gabriele “tem gosto de quero mais”.
Vídeo do lançamento