
Em 2020, em pleno governo de Jair Bolsonaro, um servidor do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) apresentou à polícia do Distrito Federal, segundo reportagem da Rede Globo, uma denúncia de desvios ilegais em benefícios de aposentados e de pensionistas.
Assim que fez a denúncia, o servidor, que era da direção central do INSS, começou a receber ameaças de morte. Ele atuava na área de análises dos descontos nos benefícios e informou que as ameaças de morte começaram assim que ele identificou as irregularidades.
“Na época que a Diretoria de Benefícios estava cortando ali os ACTs (Acordo de Cooperação Técnica), estava fazendo uma auditoria em cima deles, alguns servidores receberam ameaças, isso foi falado lá dentro. O coordenador que estava atuando em cima dos ACTs e também o diretor. Eles receberam ameaças justo no período onde que ‘tavam’ enviando ali as auditorias dos descontos associativos”, disse ele à reportagem, na condição de anonimato.
O servidor foi chamado para depor em inquérito da Polícia Civil Civil do Distrito Federal em fevereiro de 2021. Ele repetiu as denúncias de descontos irregulares em benefícios feitos pela Conafer – a Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais.
Ele informou que em 2020 houve um aumento repentino e anormal em comparação com outras associações; que, em janeiro de 2020, a Conafer tinha cerca de 80 mil filiados com desconto nos benefícios previdenciários e em outubro de 2020 esse número superou 250 mil. Nesse mês, o acordo da Conafer estava suspenso.
O acordo da entidade foi suspenso em setembro de 2020, após servidores do órgão identificarem irregularidades. Em outubro, o então presidente do INSS, Leonardo Rolim, transferiu da Diretoria de Benefícios para a Diretoria de Atendimento a responsabilidade por analisar esses acordos. A mudança foi uma artimanha para que a Conafer fosse reabilitada. Na época, a Conafer chegou a homenagear o então diretor de atendimento do INSS, Jobson de Paiva Sales, responsável por reverter a suspensão.
Um relatório da CGU – Controladoria-Geral da União de 2024 mostra que a Conafer foi a entidade que mais aumentou o volume de descontos entre 2019 e 2024 em números absolutos. Passando de R$ 400 mil por ano em 2019 para R$ 57 milhões em 2020 e R$ 202 milhões em 2023.
Em março de 2021, o presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, prestou depoimento na investigação da Polícia Civil. Ele disse que “a Conafer ou seus integrantes não foram responsáveis pela inserção de descontos indevidos nos benefícios de aposentados e pensionistas, mas, sim, se tal fato ocorreu, a responsabilidade seria da Dataprev” – empresa pública federal que processa os pagamentos do INSS.
De acordo com a Polícia Civil, há indícios de que, entre 2019 e 2020, Carlos Roberto e a esposa dele, Bruna Braz, negociaram cinco imóveis, incluindo uma fazenda avaliada em R$ 3 milhões. Ainda em 2021, a Justiça do DF decidiu que a competência para investigar o caso era da Polícia Federal. Mas a operação para desarticular o esquema só ocorreu em abril de 2025, que acabou levando à queda do ministro da Previdência e do presidente do INSS.