O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, entregou mais de 4 bilhões de dólares para obras da Odebrecht em projetos financiados em parte com dinheiro do BNDES. O pagamento foi ordenado dias após a eleição de Maduro, em 2013, cuja campanha a construtora admitiu ter financiado em esquema de Caixa 2.
Nos documentos, o presidente frisava, de próprio punho, que realizar os pagamentos, que se estenderam até 2015, era ‘muy urgente’, assinala reportagem de Jamil Chade, na edição de domingo no jornal Estado de São Paulo.
O jornalista afirma ter tido acesso a documentos inéditos sobre os repasses de propina da Odebrecht e da Andrade Gutierrez para Nicolás Maduro, acerto que foi intermediado pelo ex-presidente Lula. Em troca de US$ 35 milhões para sua campanha em 2013, o presidente venezuelano daria “prioridade” para que recursos extra-orçamentários bancassem obras da Odebrecht.
Chade diz, na matéria, que parte das informações está na delação do ex-diretor da Odebrecht, Euzenando Azevedo, que prestou depoimento no Ministério Público Federal, em 15 de dezembro de 2016. Ele afirma que o venezuelano Américo Mata, apresentando-se como coordenador da campanha de Maduro, pediu contribuições para financiar a propaganda eleitoral.
Azevedo condicionou a ajuda a garantias de que o governo liberaria recursos para manter as obras. O então diretor da Odebrecht, para sustentar a relação entre os US$ 35 milhões para a campanha e a liberação dos recursos, apresentou ao MP sete documentos do governo venezuelano, todos assinados por Maduro.
As delações do publicitário João Santana e de sua mulher, Mônica Moura, reforçam as provas sobre a relação espúria entre a direção do PT e o governo venezuelano. Em agosto de 2017, em depoimento à Procuradoria da República em Salvador, Santana afirmou que existia uma espécie de financiamento cruzado entre campanhas do partido brasileiro e o pagamento das contas dessas operações pela Odebrecht “em países onde ela articulava negócios, como Angola, Venezuela e Panamá”.
Os publicitários faziam campanhas mundo afora, com os contatos abertos por Lula e outros membros do PT por meio das sucursais da Odebrecht. No caso da Venezuela, isso aconteceu através da Polis Caribe SRL, com sede na República Dominicana. Eles registraram ainda que dos US$ 35 milhões negociados com Maduro em 2013, US$ 15 milhões não foram pagos.
Revelou que os restos a pagar da campanha de Lula, em 2006, se juntaram aos de outras campanhas. “O PT foi criando uma espécie de pirâmide somente interrompida em 2015, com uma dívida, jamais paga, superior a R$ 20 milhões”, diz o documento do MP.
O valor era pago “por fora” utilizando recursos ilícitos que o PT tinha para receber de empreiteiros.
De acordo com a matéria do Estado, o elo principal da relação entre o PT e o governo venezuelano é a construção do metrô de Caracas. Maduro liberou US$ 311 milhões para as obras da Linha 5 do metrô da capital venezuelana, com recursos obtidos no BNDES. “As obras do projeto da Linha 5 contam com financiamento do BNDES, do Brasil”, indica o documento assinado por Maduro.
Eram também solicitados mais US$ 32 milhões para a Linha 6, também financiada pelo BNDES. A liberação de recursos continuaria: em 15 maio de 2013, mais US$ 12,2 milhões para obras da Odebrecht na Linha 2.
Em junho de 2014, Maduro recebeu um pedido de US$ 800 milhões para quitar dívidas com a Odebrecht. “Submete-se à consideração do presidente Nicolás Maduro a designação de recursos financeiros para o cancelamento da dívida que se mantém com a Odebrecht”, diz o documento assinado por três ministros. Em 26 de janeiro de 2015, autoridades venezuelanas apresentaram uma lista de 10 obras da Odebrecht que precisavam da liberação de US$ 616 milhões e 268 milhões de euros. Desse total US$ 534 milhões viriam do BNDES, precisa a matéria.
A ex-procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega Díaz, denunciou, além das irregularidades que envolvem os financiamentos das obras da Odebrecht, que a maioria delas fica inacabada. A sistemática da empreiteira passou a ser jamais terminar a obra, pois o término desta seria também o término do roubo – e choviam aditivos elevando o custo sobre as obras inacabadas.
O processo de suborno em troca de contratos para obras governamentais foi se espalhando por pelo menos 9 países da América Latina. Assim, com parceiros em postos de mando – devidamente envolvidos com a propina – na Colômbia, México, Peru, Equador, Argentina, Venezuela, Guatemala, República Dominicana e Panamá foram obtidos contratos bilionários a favor da empreiteira.
O escândalo da Odebrecht já causou a renúncia, na semana passada, do presidente do Peru, Pedro Paulo Kuczynski e levou à destituição e condenação do vice-presidente equatoriano, Jorge Glas.