Enquanto manifestantes eram expulsos de forma violenta dos corredores da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e com o plenário da casa tomado por gás lacrimogêneo, deputados governistas aprovaram o PL 1.501/2023 que autoriza o governo do Estado a privatizar a companhia de água e esgoto de São Paulo, a Sabesp.
A votação aconteceu após a Polícia Militar expulsar de forma truculenta, com cassetetes, spray de pimenta e agressões aos manifestantes contrários a privatização da Sabesp das galerias da Alesp. Uma sessão extraordinária foi convocada pelo presidente da casa, André Prado (PL), sem a presença da oposição no plenário da casa. Ao todo foram 62 votos favoráveis e apenas um voto contrário à entrega da água de São Paulo aos interesses privados.
Em vídeos divulgados nas redes sociais, é possível ver pessoas ensanguentadas e passando mal após ação policial. Em razão da confusão, o presidente da Alesp, André do Prado (PL), decidiu suspender a discussão e esvaziar o plenário. Porém a sana pela privatização falou mais alto e a sessão foi retomada 1h30min após o confronto, às 20h.
Um verdadeiro “cheque em branco” para que Tarcísio negocie a Sabesp, como denunciaram os parlamentares de oposição ao longo da semana.
Em coletiva do lado de fora do plenário, enquanto a votação ocorria, o deputado Paulo Fiorilo, líder da Federação PT/PCdoB/PV, disse que seria impossível voltar ao plenário, em razão do gás lacrimogêneo que se espalhou por todo o local.
Fiorilo citou os casos da deputada Paula Nunes (PSOL), que está grávida, da deputada Monica Seixas (PSOL), que sofreu um aborto recentemente, e de Leci Brandão (PCdoB) e Eduardo Suplicy (PT), ambos parlamentares idosos.
“Nós achamos que é impossível continuar esse processo do jeito que está o plenário agora. É um equívoco continuar o processo hoje”, criticou.
Os deputados governistas votaram de máscara por causa dos efeitos do gás lacrimogêneo. A aprovação da privatização aconteceu sem que o projeto passasse pelas comissões correlatas ao tema, com apenas uma audiência pública convocada pela Alesp e quase sem debate entre os parlamentares e a sociedade.
A toque de caixa, a base governista aprovou o projeto sem se manifestar em plenário. O objetivo estava claro, acelerar a votação e não comprometer ainda mais as falhas que o projeto já apresenta.
VIOLÊNCIA E AUTORITARISMO
“Os 64 deputados que permaneceram em plenário e votaram a privatização da SABESP legitimaram uma sessão que ocorreu sob violência e autoritarismo. A oposição não reconhece a legitimidade dessa sessão. Não há normalidade. Não vivemos uma ditadura nem um estado de exceção”, criticou o deputado Guilherme Cortez (PSOL-SP).
O deputado ainda afirmou: “Não vivemos num estado de exceção. Não dá pra votar normalmente com pessoas detidas, prisões feitas na garagem, agressões, imprensa proibida de acessar o local e parlamentares grávidas e idosas sem segurança e salubridade para permanecer. A oposição, além de não legitimar em plenário essa violência autoritária, vai judicializar essa sessão. Não é mais questão do mérito do projeto, de privatizar ou não. Nós não toleramos violência e autoritarismo”.
“Dias e dias de provocação e hostilidades na ALESP criaram uma situação de violência insustentável. Uma violência que tenta silenciar mulheres eleitas e outros grupos minorizados. Um debate essencial acabou de forma inaceitável”, afirmou a deputada Andrea Werner (PSB-SP).
“Uma violência imensa contra a deputada Paula Nunes (PSOL-SP), gestante, com o uso de gás de pimenta em um ambiente fechado. Uma violência contra mim, mulher autista, com transtorno de processamento sensorial. Uma violência contra a deputada Leci Brandão (PCdoB-SP), uma mulher idosa”, ressaltou Andrea Werner.
O deputado Emídio de Souza (PT-SP) também se manifestou. “Os aliados do Tarcísio lamentavelmente aprovaram a privatização da Sabesp, mas nós não abrimos mão da Sabesp pública. Vamos lutar judicialmente para que a vergonhosa venda da Sabesp não seja consumada.
“Na falta de argumento, Tarcísio quer privatizar a Sabesp na força. Não bastasse isso, o presidente da Alesp retoma o processo de forma antidemocrática, com as galerias vazias e sem a presença da oposição. Atentado contra o povo na Alesp”, concluiu o deputado.
O deputado Carlos Giannazi condenou a votação. “VERGONHA! Mesmo depois da barbárie que ocorreu na Alesp, de toda violência contra estudantes, educadores e trabalhadores, a sessão vai continuar para que eles consigam aprovar a privatização da Sabesp”.
“Continuamos defendendo nossas posições. Eu sou contra a privatização da SABESP, a usar dinheiro público para subsidiar uma empresa e que vai colocar todos os cidadãos em risco. Hoje foi um dia de desrespeito”, finalizou a deputada.
“Após toda violência ocorrida nas galerias ficou inviável a permanência no plenário por conta do gás de pimenta, principalmente para parlamentares idosos, PCDs e uma deputada grávida. Pedimos que a sessão fosse remarcada p/ amanhã, mas resolveram avançar hoje mesmo”, relatou o deputado Caio França (PSB-SP).
“Todos sabemos que eles já tem votos suficientes para aprovar o projeto, portanto o pedido era mais para permitir que todos exercessem a sua função parlamentar. A decisão de não participar dessa votação foi tomada de forma conjunta pelos partidos de oposição e independentes”, explicou Caio França
“Infelizmente a base governista da Alesp aprovou a autorização para que Tarcísio privatize a Sabesp, com uso da repressão policial. Estivemos apoiando a segurança dos jovens que foram protestar contra esta barbaridade que vai aumentar as tarifas e piorar os serviços”, afirmou o deputado Simão Pedro (PT-SP).
EMPRESA LUCRATIVA
A Sabesp é a maior empresa de saneamento da América Latina, a terceira maior do mundo e há mais de 20 anos não dá um real de prejuízo aos cofres públicos. Dados públicos apresentados pela própria companhia apontam que a empresa disponibilizou vários bilhões de reais na forma de dividendos para o governo investir, além de distribuir bilhões em lucros aos acionistas. Apenas em 2022 foram 3 bilhões de reais de lucro líquido.
Fundada em 1973, a Sabesp tem um valor de mercado de R$ 46,56 bilhões e teve um lucro líquido de R$ 743,7 milhões no segundo trimestre de 2023, uma alta de 76,1% em relação ao mesmo período do ano anterior. Suas ações tiveram alta de 14,81% no último ano. A companhia atende a 366 dos 645 municípios do estado.
Pela legislação municipal, qualquer mudança no controle acionário da Sabesp faz com que a Prefeitura de São Paulo volte a assumir o serviço de água e esgoto na cidade.
RESISTÊNCIA
Estudantes e trabalhadores ocupavam as galerias da Alesp para acompanhar a votação e marcar a posição contrária à entrega da água e foram violentamente agredidos pela Polícia Militar.
“Hoje, a base de Tarcísio na ALESP conseguiu aprovar a autorização para vender a Sabesp com sangue nas mãos. Aprovaram a venda da Sabesp à base do cassetete, base do spray de pimenta, sob uma violência que nunca foi vista naquela casa”, criticou o presidente da União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES-SP).
“Eles votaram a privatização expulsando todo mundo do Plenário, batendo na população sem ouvir e, pior, com nenhum deputado governista com coragem de explicar o porquê que eles querem privatizar a Sabesp. Não tem argumento, eles não conseguem argumentar, eles estão vendendo puramente pelo dinheiro e pela ganância”, destacou.
“Nós precisamos continuar mobilizado, continuar forte porque a luta não acabou. Vamos resistir à venda da Sabesp em todos os municípios. Todas as cidades, todas as escolas, todas as comunidades… Nós vamos barrar a privatização da Sabesp”.
“Não podemos deixar a principal empresa de saneamento do Brasil e da América Latina ser vendida por um projeto de lei que nem sequer estipula o valor mínimo que ela deve ser vendida. Então vamos seguir na luta contra essa privatização criminosa e indefesa do povo paulistano e do povo brasileiro”, pontuou Lucca.