Para Murilo Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo, acabar com a contribuição teve o objetivo de “ferir de morte” a organização sindical
Em entrevista ao HP, Murilo Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP), entidade com 500 mil engenheiros na base e 60 mil sócios, considerou o fim da contribuição sindical, “um dos maiores golpes já aplicado contra o movimento sindical”.
Para ele, é prioridade absoluta, e urgente, a unidade das entidades sindicais para restabelecer um mínimo de equilíbrio nas relações trabalhistas. Sobre isso, existe um consenso no movimento sindical no sentido de as contribuições serem para toda categoria, aprovadas em assembleia, no acordo coletivo.
O aprendizado que deve ficar é “a convicção de mostrarmos à nossa base, à sociedade, a importância para democracia de termos sindicatos atuantes”. “Não podemos ter uma sociedade que considere a precarização natural. Só teremos um país próspero e desenvolvido com a valorização do trabalho e condições dignas de vida para a maioria”, afirma.
Leia, a seguir, a entrevista na íntegra.
CARLOS PEREIRA
HP – Como a organização dos trabalhadores foi atingida com o fim da contribuição sindical?
Murilo Pinheiro – Foi certamente um dos maiores golpes contra a livre organização dos trabalhadores, porque acabou, de uma hora para outra, sem qualquer debate democrático, com uma fonte de custeio legítima que existia há décadas. A medida visava, juntamente com as demais mudanças trazidas pela reforma de 2017, impedir que as organizações dos trabalhadores seguissem defendendo as suas categorias e lutando por conquistas.
Tem sido com muito esforço e dificuldades que entidades como a nossa seguem cumprindo seu papel. É certamente urgente rever essa situação a bem do equilíbrio nas relações do trabalho e da própria democracia.
HP – O Sistema ‘S’ dos empresários arrecada compulsoriamente, por ano, R$ 27 bilhões. Com o fim da contribuição sindical, a arrecadação dos sindicatos caiu 90%. Como fica a correlação de forças nas negociações coletivas?
M.P – Obviamente, a correlação de forças se torna ainda mais desigual. Esse quadro deixa muito claro que se trata de enfraquecer um lado da balança, o dos trabalhadores, claro.
HP – Na sua opinião o movimento sindical ficou encolhido na defesa dos seus interesses, nessa questão?
M.P – Eu não diria que ficou encolhido, mas talvez tenha faltado unidade ampla nessa batalha para que tivéssemos mais condições de mostrar aos trabalhadores, às nossas categorias e à sociedade em geral, a importância de existir organizações sindicais fortes e atuantes; mostrar que o sindicalismo é bom para a democracia e não prejudica a economia, pelo contrário. Esse é um aprendizado que precisa ser feito; há muitas trincheiras em que precisamos estar juntos, além de buscar aliados nos vários setores da sociedade.
HP – Você acha que é possível, se necessário, sustentar ou defender na base a contribuição sindical?
M.P – É totalmente possível e necessário, embora seja difícil transpor a mentalidade antissindical que foi construída por aqueles que desejam o império do capitalismo selvagem, sem direitos ou regras civilizatórias. E esses contaram, é necessário dizer, com apoio de parcela significativa da mídia, que repercute o discurso contra a organização dos trabalhadores. Mas, objetivamente, se queremos assegurar nossos direitos, ter remuneração digna, condições de trabalho adequadas, precisamos ter meios de fazer essa luta. O custeio desse esforço precisa ser algum tipo de contribuição coletiva, obviamente a ser definida de forma transparente e com bom senso. Esse debate precisa ser feito com a base.
HP – O fim da contribuição tem o objetivo de atingir a unicidade sindical?
M.P – A unicidade sindical impede a fragmentação excessiva da organização dos trabalhadores e, portanto, fortalece a luta. É uma regra importante que precisa ser preservada. Acabar com a contribuição, me parece, teve o objetivo de ferir de morte não o dispositivo da unicidade, mas a organização sindical em si. Lamentavelmente, na disputa em torno da opinião pública, prevaleceu a ideia equivocada de que as entidades sindicais têm receita sem prestar serviço, quando, na realidade, é a luta delas que conquistou os direitos trabalhistas existentes, e pode preservá-los.
HP – Temer e Bolsonaro desfiguraram a CLT, enfraqueceram a Justiça do Trabalho e acabaram com a contribuição sindical para toda categoria, a essência da obra de Getúlio Vargas para os trabalhadores. Como virar essa situação?
M.P – Recuperar questões essenciais previstas na CLT, que foram eliminadas nos últimos tempos, é fundamental para que se tenham relações de trabalho civilizadas no Brasil. Obviamente, esse resgate deve levar em conta o novo mundo do trabalho, transformado pela tecnologia, mas não podemos ter uma sociedade que considere a precarização natural. Só teremos um país próspero e desenvolvido com a valorização do trabalho e condições dignas de vida para a maioria.