Paulo Cesar Ribeiro Lima, ex-engenheiro da Petrobrás e consultor legislativo lembrou que a Petrobrás era uma empresa fantástica, diversificada, integrada do poço ao posto, mas que agora está sendo destruída

Paulo Cesar Ribeiro Lima, mineiro de Três Pontas, ex-engenheiro da Petrobrás e consultor legislativo do Senado Federal, afirmou, nesta terça-feira (11), em entrevista ao HP, que o Brasil vive “o engodo, desde o governo Fernando Henrique Cardoso, de que o neoliberalismo pode trazer desenvolvimento para o país”.
Ele assinalou que nos governo do PT “houve uma certa reversão dessa visão”, mas, segundo Lima, “não foi uma reversão completa. Foi uma reversão bem parcial”. “E já no final dos governos do PT houve uma predominância da visão neoliberal. Ali se iniciaram os desinvestimentos na Petrobrás. Na gestão Bendine já houve um plano de desinvestimento bem arrojado, por volta de 2015”, acrescentou Paulo Cesar.
“Nos governo do PT “houve uma certa reversão dessa visão, não foi uma reversão completa”
“Esse plano já era um plano audacioso de desinvestimento, e foi consolidado e piorado depois do golpe de 2016, quando assumiu o novo governo. Depois ele foi aprofundado ainda mais no atual governo”, explicou. “O atual governo colocou na presidência da Petrobrás, vamos dizer assim, um ‘liberal convicto’, com uma visão de muitas décadas atrás, totalmente ultrapassada, que não existente mais no mundo, que apresentou essa visão de privatizar tudo e dizer que o mercado resolve. Ele foi escolhido pelo presidente antes mesmo do ministro das Minas e Energia, foi indicado pelo ministro da Economia. Este último presidente da Petrobrás foi o pior de todos em toda a história da Petrobrás”, denunciou.
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DESTRUIÇÃO DO MAIOR PROJETO NACIONAL
“Este último presidente da Petrobrás aprofundou e destruiu de fato o maior projeto nacional. Na minha visão, a Petrobrás é o maior projeto nacional. E ela já está basicamente destruída”, destacou Paulo Cesar. “Se não está totalmente destruída, estão dadas as condições para sua destruição completa e, eu diria até, a privatização completa num governo neoliberal. Você destrói o projeto quando você destrói as leis”, prosseguiu o consultor legislativo aposentado.

Ele salientou que esse é um processo longo. “Você não destrói o maior projeto nacional em pouco tempo, foi uma construção que pode culminar na destruição completa, uma privatização completa, ou pode também culminar numa eventual reestatização da Petrobrás, a partir de 2022. A gente tem que ter esperança, mas eu sou pessimista em relação à reestatização da Petrobrás”, observou.
Questionado sobre o que ele queria dizer quando afirma que a Petrobrás já estaria destruída, Paulo Cesar afirmou que, quando foi criada em 1953, “ela foi criada com uma visão de país, como uma empresa monopolista. E essa visão monopolista, apesar da distribuição nunca ter sido monopólio, foi construída numa visão de uma empresa diversificada integrada ‘do poço ao posto’ e com atuações em inúmeras áreas”. Lima disse que esta é a característica da Petrobrás que está sendo destruída.
PETROBRÁS ALAVANCOU OS PROGRAMAS DE BIODIESEL
“A Petrobrás”, disse ele, “começou como uma grande empresa de refino, porque o Brasil não tinha refinarias”. “Na década de 1980, houve grandes descobertas já em águas mais profundas, ela tornou-se também uma empresa produtora de petróleo. Era também uma empresa de petroquímica, já tinha sido criada a BR Distribuidora, foi criada a Petroquisa, que é a química, foi criada a Petrofertil, que atuava na área de fertilizantes, a Nitrofertil, que era uma empresa da Petrofertil, entrou também na área de energia elétrica, com as termoelétricas, e a Petrobrás foi também fundamental nos biocombustíveis líquidos, principalmente no Proálcool”, lembrou.
“Então, a Petrobrás era uma empresa fantástica, diversificada, integrada do poço ao posto”, destacou Paulo Cesar Lima. “Teve também a construção dos gasodutos e oleodutos. O que se vê é que a Petrobrás já saiu da distribuição, a BR já foi privatizada, então a Petrobrás já deixou de ser do poço ao posto”, observou. “Ela já ficou minoritária na petroquímica. Ainda no governo do PT ela já ficou minoritária na petroquímica. Eu sempre fui contrário a isso”, afirmou o especialista.
“A Petrobrás era uma empresa fantástica, diversificada, integrada do poço ao posto”
Ele lembrou que ela sai totalmente da área de biocombustíveis. “Já está no finalmente da venda das unidades de biocombustíveis”, apontou. “Está saindo também de todas as termoelétricas, está vendendo metade das refinarias, ela já vendeu todos os gasodutos da região sudeste, da região norte e do Nordeste, e está saindo de todos os campos de águas rasas e dos campos em terra. A Petrobrás está saindo da Amazônia também. Então, o que era uma empresa brasileira integrada, que apoiava o desenvolvimento, já se transformou no que eu chamo de ‘Petro Rio-SP'”, ´prosseguiu Paulo Cesar.
“Agora, ela é uma empresa produtora de petróleo em alto mar, exportadora e com cinco refinarias, quatro no estado de São Paulo e uma no estado do Rio. Então é a Petro Rio-SP que está aí”, denunciou. Lima disse que “provavelmente, a continuar com este modelo, ela deverá ser privatizada. Então, o que ocorre com a Petrobrás, eu nunca vi ocorrer com nenhuma empresa petrolífera do mundo, nem privada e nem estatal. O que o último presidente da Petrobrás fez dá a ele o título de campeão do entreguismo. Não tem o menor sentido o que ele fez.”
ATAQUES NÃO SÃO SÓ CONTRA A PETROBRÁS
Paulo Cesar chamou a atenção para o fato de que os ataques deste governo não são somente contra a Petrobrás. As nossas instituições estão sendo destruídas. “O Tribunal de Contas da União, os ministros do Supremo Tribunal Federal, da Receita Federal do Brasil, que é uma vergonha na área do petróleo, tudo o que eu estou dizendo aqui é na área de petróleo”, observou.
“O Cade é uma instituição vergonhosa, a ANP é uma agência totalmente capturada pelo mercado. Então, o problema do Brasil é muito mais grave do que só o atual governo. Eu não consigo entender porque nós chegamos a essa situação”, desabafou.
“Eu costumo dizer que estamos voltando à era pré-Vargas, estamos voltando a ser um país produtor e exportador de matérias primas. Então, a reconstrução do Brasil é um grande desafio. Eu digo que a Petrobrás está destruída, mas eu acho que em certo sentido, o país está sendo destruído, não é só a Petrobrás”, disse o consultor legislativo.
“Eu costumo dizer que estamos voltando à era pré-Vargas, estamos voltando a ser um país produtor e exportador de matérias primas”
Questionado se, num processo de reconstrução do país e da Petrobrás, ele defenderia a volta do monopólio estatal do petróleo e da Petrobrás como operadora única no pré-sal, Paulo Cesar respondeu afirmativamente. “O PT cometeu erros gravíssimos e erros históricos”, disse ele. A primeira medida. a meu ver, seria reestatizar a Petrobrás e ela não foi reestatizada. Aquela venda das ações, as ADRs, na bolsa de Nova York, no governo FHC, seria a primeira medida a ser revista num governo, não é nem de esquerda, num governo nacionalista”, ponderou.

Paulo Cesar disse que acha o mesmo em relação a outras empresas que foram privatizadas. “No caso da privatização Vale, por exemplo, na minha visão devia ser revista. O Estado brasileiro é riquíssimo e a Vale e a Petrobrás devem ser, na minha visão, empresas públicas. Eu não acho que ela deve ser uma empresa de economia mista. Não se deve misturar mercado com monopólio estatal”, defendeu ele.
“Você pergunta se eu sou a favor do monopólio. Eu respondo que sou a favor do monopólio do Estado, exercido por uma empresa pública. Uma empresa que tem 40% de acionistas estrangeiros e mais 23% de acionistas privados nacionais, essa empresa não tem condições de ser monopolista”, apontou.
“Eu defendo a Petrobrás como operadora única como uma solução menos ruim. O que eu sempre defendi, e vou continuar defendendo, e não foi o que foi defendido pelo governo do PT, é o investimento direto do Estado. Por meio do próprio Estado ou por meio de uma empresa 100% pública”, disse o consultor.
DESMONTE COMEÇOU N0 GOVERNO COLLOR
“Nós não chegamos a essa situação porque em 2018 aconteceu isso que aconteceu, não. A situação do Brasil é muito mais complexa”, disse Paulo Cesar. “A eleição de 2018 foi o sintoma de uma grave doença que acomete o país. Acabamos chegando nessa eleição de 2018, mas foi um processo construído antes. A destruição da Petrobrás já se iniciou no governo Collor. No governo Collor já houve a privatização da Petrofertil, da Petroquisa, depois no governo Fernando Henrique, a Petroquímica, os polos petroquímicos, de Camaçari, a Copesul, teve todo um processo”, apontou.
Paulo Cesar lembrou que, com o fim da ditadura, se esperava um MDB mais nacionalista, mais estatista, etc. Segundo ele, houve uma certa decepção com o desenvolvimentismo no Brasil já no fina da ditadura. “Com o consenso de Washington, na década de 90 começa aquele processo na China, sem levar em conta as questões ideológicas, analisando os números, eu estudei muito a China, e a gente tem que reconhecer que toda a base da China é estatal”, disse o especialista.
“A China é o que é por causa de sua base estatal”
“A produção de minério, a produção de óxidos, a produção de minerais estratégicos, de aço, de aço inoxidável, de petróleo, toda a base da economia chinesa é estatal. E a China é o que é por causa dessa base estatal. Enquanto a China constrói a sua base estatal, nós iniciamos a destruição da nossa base estatal no inicio da década de 90, nessa linha do consenso de Washington, que destruiu o país”, denunciou Paulo Cesar. Ele citou o exemplo da Argentina que, segundo ele, era um grande país, e que teve a sua economia destruída. Até hoje a Argentina não se recuperou da destruição neoliberal”, apontou.