“Não frequente apenas o seu gabinete de ódio. Percorra hospitais. Seja solidário com a realidade do seu país”, disse o governador. “Eu não acho que vida é número. Nem os meus filhos são tratados por número”, completou.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), iniciou a coletiva desta quarta-feira (29) criticando a declaração de Jair Bolsonaro que ironizou o recorde de mortes registrado no Brasil, ontem, terça-feira, 20. “O senhor disse: ‘O que eu posso fazer?’. Eu posso enumerar algumas atitudes que o senhor já deveria ter tomado. Começando por respeitar os brasileiros”.
Revoltado com Bolsonaro e emocionado com a situação que o Brasil vive, Doria afirmou: “No mínimo, sendo solidário e estando presente na realidade do seu país. Não a sua realidade do estande de tiros onde o senhor foi ontem celebrar enquanto nós choramos mortes de brasileiros, presidente Jair Bolsonaro”.
O governador também lembrou o cenário envolvendo o estado de São Paulo, onde mais de 2 mil pessoas morreram de Covid-19 até o último balanço. “Quero começar transmitindo meus sentimentos aos familiares de 5.017 brasileiros que perderam as suas vidas até ontem pelo coronavirus em todo o Brasil. E minha solidariedade também, em especial, aos familiares aqui de SP de pessoas que perderam suas vidas: 2.049 pessoas até ontem perderam suas vidas em SP pelo coronavírus”.
“Não acho que vidas são números. Nem meus filhos, presidente Bolsonaro, são tratados por números. São tratados pelos nomes. Com carinho e com afeto. Espero que o senhor possa resgatar seu sentimento para ter um olhar de carinho e compaixão pelos brasileiros”, disse Doria.
O governador repudiou a postura de Bolsonaro, na noite de ontem, que debochou das vítimas do coronavírus dizendo: “E daí, quer que eu faça o quê?”.
“Eu posso enumerar, presidente Jair Bolsonaro, algumas atitudes que o senhor já deveria ter tomado, como presidente da República, e não adotou. Esta é a resposta do ‘fazer o quê?’. É fazer aquilo que o senhor não fez. Começando por respeitar os brasileiros, os brasileiros que o elegeram presidente da República e os que não o elegeram também. Respeitando pais, mães, avós, parentes e amigos que perderam as suas vidas no Brasil até ontem pelo coronavírus. O coronavírus, que o senhor classificou como uma ‘gripezinha’, que o senhor classificou como um ‘resfriadozinho’.
“Percorra hospitais. Seja solidário com a realidade do seu país”, disse Doria que convidou Bolsonaro a visitar os corredores dos hospitais paulistas para testemunhar a realidade de quem está à frente do combate contra doença.
Ele pediu solidariedade às famílias que perderam parentes por conta do novo coronavírus e às milhares de vítimas que lutam pela vida em hospitais públicos e privados de todo país. Citou ainda a cidade Manaus, que enfrenta grande dificuldade para lidar com o avanço da doença sem apoio do governo federal. “Se não quiser visitar SP, presidente, por medo ou por qualquer outra razão, vá a Manaus. Vá ver o colapso da saúde em Manaus. Vá ajudar o governador do estado do Amazonas e o prefeito da cidade de Manaus”.
Confira o discurso na íntegra:
“Quero começar transmitindo meus sentimentos aos familiares de 5.017 brasileiros que perderam as suas vidas até ontem pelo coronavírus em todo o Brasil. E minha solidariedade também, em especial, aos familiares aqui de São Paulo de pessoas que perderam suas vidas: 2.049 pessoas até ontem perderam suas vidas em São Paulo pelo coronavírus.
Também quero transmitir minha solidariedade a todos que têm parentes e amigos enfermos e em tratamento neste momento. E quero também me dirigir ao presidente da República do Brasil, Jair Bolsonaro, que, hoje pela manhã, numa entrevista coletiva junto ao Palácio do Planalto, citou a mim e ao prefeito Bruno Covas nominalmente.
E antes de me referir a essa citação, eu quero dizer ao presidente da República, o mesmo presidente que, ontem, indagado por jornalistas sobre as mortes e o crescimento das mortes no Brasil, respondeu: “Quer que faça o quê?”.
Eu posso enumerar, presidente Jair Bolsonaro, algumas atitudes que o senhor já deveria ter tomado, como presidente da República, e não adotou. Esta é a resposta do “fazer o quê?”. É fazer aquilo que o senhor não fez. Começando por respeitar os brasileiros, os brasileiros que o elegeram presidente da República e os que não o elegeram também. Respeitando pais, mães, avós, parentes e amigos que perderam as suas vidas no Brasil até ontem pelo coronavírus. O coronavírus, que o senhor classificou como uma “gripezinha”, que o senhor classificou como um “resfriadozinho”, o coronavírus que o senhor minimizou, dizendo que “não era importante” e que “não era grave”, presidente Jair Bolsonaro.
Que o senhor respeite o luto de mais de 5.000 famílias que perderam os seus entes queridos e que hoje estão sepultados e, em praticamente todos, nenhum parente pôde acompanhar o sepultamento.
Respeite os médicos, os enfermeiros e os profissionais de saúde, presidente. Que, ao contrário do senhor, que vai treinar tiro em estande de tiro, esses profissionais da saúde do Brasil estão trabalhando para salvar vidas, para atender as pessoas, proteger seres humanos.
Pare, presidente, com essa política da perversidade. Pare de atrapalhar quem está lutando para salvar vidas. Pare de fazer política em meio a um país que chora mortes e infectados.
O senhor disse que o Brasil estava vivendo uma gripezinha, um resfriadozinho, teve a coragem de reafirmar isso várias vezes. E agora, presidente? Diante de mais de 5.000 mortos, o senhor continua afirmando que o país está vivendo uma pandemia de uma gripezinha, de um resfriadozinho?
Eu convido o senhor, presidente Jair Bolsonaro, venha a São Paulo. Saia dessa sua redoma de Brasília e venha visitar comigo o Hospital das Clínicas, o Hospital do M’Boi Mirim, aqui na capital de São Paulo, ao lado do prefeito Bruno Covas, os hospitais de campanha. E venha ver a gripezinha, o resfriadozinho. Venha ver as pessoas agonizando nos leitos, e a preocupação dos profissionais de saúde de SP e de toda parte do Brasil com aquelas pessoas que podem vir a óbito.
E se não quiser visitar SP, presidente, por medo ou por qualquer outra razão, vá a Manaus. Vá ver o colapso da saúde em Manaus. Vá ajudar o governador do estado do Amazonas e o prefeito da cidade de Manaus.
No mínimo, sendo solidário e estando presente na realidade do seu país. Não a sua realidade do estande de tiros onde o senhor foi ontem celebrar enquanto nós choramos mortes de brasileiros, presidente Jair Bolsonaro.
Saia da sua bolha, presidente Bolsonaro, saia dessa sua fábula, saia do seu mundinho de ódio. Não frequente apenas o seu gabinete de ódio. Percorra hospitais. Seja solidário com a realidade do seu país, com os brasileiros que já perderam as suas vidas e têm os seus familiares chorando mortos, e com outros familiares que choram aqueles que estão enfermos em hospitais públicos e privados em todo o país.
E, por fim, presidente Bolsonaro, o senhor que gosta de tratar tudo como números e acha que a vida é um número, eu felizmente, como brasileiro, como cidadão, como governador, mas sobretudo como ser humano, eu não acho que vida é número. Nem os meus filhos são tratados por número. Os meus filhos, presidente Jair Bolsonaro, são tratados pelo nome, com carinho, com amor e com afeto. O mesmo carinho que eu dedico na minha função, trabalhando de graça como governador, ao lado do prefeito Bruno Covas, ao lado de dezenas, centenas, milhares de pessoas que, em SP e no Brasil, estão trabalhando para salvar vidas.
A vida, presidente Jair Bolsonaro, não é um número. É sentimento. E eu espero que o senhor ainda possa resgatar o seu sentimento para ter um olhar de compaixão pelo seu país e pelos brasileiros.”