
Levantamento inédito faz balanço do impacto negativo de decisões tomadas pelo governo nos últimos 4 anos e pede ao presidente eleito reconstrução da agenda climática e ambiental do país. Demandas são caríssimas ao Brasil e ao planeta
Levantamento inédito realizado entre 2019 e 2022 pelo Instituto Talanoa listou milhares de atos do atual Executivo federal e propõe que 401, dentre esses, sejam revogados pelo governo do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para a “reconstituição da agenda climática e ambiental brasileira”.
O desmantelamento da agenda ambiental, em que o Brasil é referência, é gigantesco. O governo eleito vai ter muito trabalho pela nesse segmento. Os ataques partiam do próprio ministério e também da comissão temática da Câmara, sob a presidência da deputada Carla Zambelli (PL-SP), em 2021.
O guia “Reconstrução”, realizado pelo Política por Inteiro, projeto de ciência de dados do Talanoa, foi escrito depois de pesquisa exaustiva que se debruçou sobre milhares de atos promulgados pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) ao longo do mandato dele, que começou em 2019.
“Esse documento é um guia de como, a partir do primeiro dia de governo federal eleito em 2022, vai ser possível apertar todos os botões, no caso, pelo menos 401, para desfazer as medidas que tiveram impactos negativos na área ambiental nesses últimos quatro anos”, explica Natalie Unterstell, coordenadora do Política por Inteiro.
“UMA CANETADA”
Segundo o documento, dos 401 atos que podem ser revogados “com uma canetada”, 107 deveriam ser anulados ou revertidos às políticas anteriores com urgência.
Além disso, os autores do estudo afirmam que mais do que a revogação, é preciso regular esses atos para fortalecer a agenda ambiental.
“A questão do tema ‘oceanoʼ, por exemplo, foi uma das agendas mais negligenciadas nesse governo. Ela foi totalmente esquecida pelo Ministério do Meio Ambiente. Ninguém mais fala em oceano. Não existe mais oceano na pauta ambiental”, diz Ana Paula Prates, diretora técnica do “Reconstrução”.
Em termos de urgência na revogação dos atos instaurados por Bolsonaro, Unterstell destaca o Decreto 9.759, de abril de 2019, que extingue diversos colegiados da Administração Pública federal, dentre esses, o Fundo Amazônia.
“É a razão pela qual, desde 2019, há R$ 3,2 bilhões parados numa conta do BNDES sem poder usar”, diz Unterstell. “Esse ato na verdade não derrubou só o Fundo, derrubou um monte de outras instâncias”, completou.
“Foi um desmonte muito grande e estratégico. Foi sendo desmontado realmente ao longo dos 4 anos. Então vai ter que ter uma força muito grande para reconstruir”, diz Prates.
BRASIL DE VOLTA AO DEBATE
Para Unterstell, essa reconstrução precisa começar no dia seguinte à posse de Lula. “É importante que isso seja feito rápido, porque o Brasil, até 2025, tem que entregar para o mundo o cumprimento de suas metas climáticas”, afirmou, ao lembrar do Acordo de Paris.
O Acordo de Paris “é uma série de objetivos para a redução da emissão de gases do efeito estufa” e foi assinado por diversos países em 2015, durante a COP 21, a Conferência do Clima das Nações Unidas, realizada na capital francesa.
Na semana que vem, começa a COP 27, que ocorre em Sharm El Sheikh, no Egito. O presidente eleito, Lula, vai participar do encontro, convidado para integrar a comitiva do Pará, pelo governador Helder Barbalho (MDB).
Para Prates, o momento é propício para que o Brasil deixe de ser “pária” em assuntos ambientais e climáticos, voltando assim ao centro do debate mundial. “Nós somos o país mais megadiverso do planeta. Então a gente tem que recolocar esse papel todo do Brasil nessa posição que a gente era”, afirma a diretora técnica do “Reconstrução”.
“A questão climática vai ter de ter um papel central no planejamento das questões de desenvolvimento do país. A gente vai ter que ter uma visão realmente de um desenvolvimento sustentável, mas um desenvolvimento climático, olhando as questões de adaptação e de mitigação”, afirma Prates.
INSTITUTO TALANOA
Organização civil independente, com sede no Rio de Janeiro, escritório em Curitiba e colaboradores baseados na Amazônia, em São Paulo e em Brasília.
“Talanoa é a tradição das comunidades insulares do Pacífico conversarem sobre temas difíceis e encontrarem soluções em conjunto para problemas comuns. ‘Resoluçãoʼ seria uma tradução livre para o termo”, está explicado no portal da organização: https://www.institutotalanoa.org/about-1.
M. V.