Nenhum dos demais países integrantes dos BRICS têm demonstrado interesse de ir além da parceria com o órgão. Preferem evitar a armadilha e manter sua autonomia, alerta Conselho Federal de Economia
O Conselho Federal de Economia aprovou, durante a 712ª Sessão Plenária Ordinária da entidade, realizada nos dias 11 e 12 de março de 2022, a nota As armadilhas do ingresso do Brasil na OCDE.
Em janeiro o governo brasileiro recebeu a carta-convite do conselho da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que formaliza o início do processo de adesão do país ao grupo que reúne 37 países, entre Estados Unidos, Japão e países da União Europeia.
A adesão do Brasil ao grupo, que faz uma série de exigências supostamente para “melhoria do ambiente de negócios”, é uma das metas de Paulo Guedes, ministro de Economia de Bolsonaro, que em fim de governo, está acelerando a aprovação de medidas em benefício de interesses estrangeiros, como a recente isenção de cobrança de IOF em operações cambiais.
O Cofecon destaca, na nota, que a adesão vêm a ser “um rígido alinhamento ao obsoleto Consenso de Washington”, estrutura imperial voltada para o domínio econômico das nações através da uma liberalização irrestrita de movimentação de capitais. Estas medidas levam “à redução de indispensável autonomia da política econômica nacional”, alertam os economistas.
Publicamos, a seguir, a nota do Cofecon na íntegra.
AS ARMADILHAS DO INGRESSO DO BRASIL NA OCDE
O Brasil recebeu, no começo deste ano, a notícia de que o Conselho de Ministros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aprovou o início das negociações para a sua adesão à entidade. Trata-se de um processo, em geral, de vários anos de adequação de normas e instituições aos padrões exigidos pela OCDE, para que então o país seja aceito como membro. Os defensores dessa adesão argumentam que esse status de membro favoreceria investimentos e melhoraria as condições dos empréstimos externos, ao, supostamente, propiciar altos níveis de segurança jurídica, estabilidade econômica e desenvolvimento institucional, boas práticas de políticas públicas e melhoria no ambiente de negócios.
Dentre esses padrões, alguns podem ser considerados consensuais e civilizatórios, como a defesa dos direitos humanos, da preservação ambiental e do combate à corrupção. Entretanto, no campo econômico, vêm a ser um rígido alinhamento ao obsoleto Consenso de Washington, voltado a uma liberalização irrestrita que leva à redução de indispensável autonomia da política econômica nacional.
Sempre a crença, já anacrônica no debate público internacional, por vezes escondendo interesses impróprios, de que a Política e o Estado são elementos estranhos e perniciosos à economia, trazendo apenas desperdícios e desvios geradores de ineficiência e perda de competitividade. Tal abordagem não tem impedido a participação ativa do Estado na economia em todos os membros da OCDE, sendo várias modalidades, sobretudo de muitos países europeus, interessantes para o Brasil. Contudo, muito do que estamos precisando, para alavancar a melhoria na qualidade de vida de todos, é incompatível com várias exigências, dentre as quais vale destacar:
- Engessamento da política fiscal, como já ocorre atualmente, inviabilizando medidas anticíclicas;
- Plena liberdade aos fluxos internacionais de capitais, impedindo qualquer controle de capitais;
- Perda de benefícios na Organização Mundial do Comércio (OMC), que o país possuía, relativos à proteção aos produtos nacionais e maiores prazos para cumprir com regulamentos;
- Impossibilidade de quebra de patentes, mesmo em casos justificáveis, como de medicamentos essenciais para salvar vidas no país;
- Empresas estatais funcionando de modo idêntico às empresas privadas, dificultando o cumprimento da sua finalidade de auxiliar a política econômica.
Segurança jurídica, estabilidade econômica e boas práticas e instituições não bastam. Infraestrutura satisfatória, disponibilidade de matérias-primas e de recursos humanos adequados, mercado consumidor suficiente, são indispensáveis para elevar os níveis de investimentos e o ritmo de crescimento econômico. Para avançar nesses requisitos, o Estado é imprescindível. Assim, esses alegados benefícios, além de incertos, impediriam políticas para o país melhorar, de modo mais rápido e eficaz, as demais condições.
Por suas dimensões e papel estratégico na economia mundial, o Brasil já é um parceiro-chave na OCDE, assim como a China, Índia, África do Sul e Indonésia, por isso participa das reuniões dos ministros e de grupos de trabalho, mantendo espaço de negociação e defesa de seus interesses. Nenhum dos demais países integrantes dos BRICS têm demonstrado interesse de ir além dessa parceria, que, no caso da Rússia, nem chega a existir. Preferem evitar a armadilha e manter sua autonomia, não excluindo a Política e o Estado de suas estratégias de crescimento da produção e do bem-estar. Os resultados de parte desses países – China e Índia – entre os melhores do mundo nas últimas décadas, em termos de elevação do PIB e da produtividade, mostram que suas escolhas não devem ser ignoradas.