Tirando Nova Iorque, os números da Covid-19 do resto dos EUA estão piorando
“Vemos estados que estão reabrindo onde ainda se está em uma ascendente [dos contágios]. Acho que isso é um erro”, afirmou o governador de Nova Iorque, o democrata Andrew Cuomo, na quarta-feira (6), conclamando a que as decisões sobre a quarentena sejam baseadas em fatos e na ciência, não em interesses eleitorais.
Em Nova Iorque, que se tornou o epicentro da pandemia nos EUA, graças à instauração da quarentena evitou-se por pouco o completo colapso da rede hospitalar, cemitérios e necrotérios, e a medida foi prorrogada por Cuomo até 15 de maio.
Como ressaltou Cuomo, “se você tira Nova Iorque dos números nacionais, os números do resto da nação estão subindo”. Isso no momento em que um grande número de Estados afrouxa as restrições ao comércio e à vida social, acrescentou.
Se, como ele salientou, “o pior” já passou no Estado, nem por isso a situação é tranqüila. Na terça-feira, as hospitalizações causadas pela Covid-19, a doença provocada pelo novo coronavírus, diminuiram para o nível mais baixo em mais de cinco semanas – embora expressivo: 9.179 (421 a menos em 24 horas).
Também caíram as intubações, isto é, a ocupação de leitos de UTI. 232 nova-iorquinos morreram devido ao coronavírus, cerca de metade da taxa vista duas semanas antes. Patamar mantido nos últimos três dias.
Esta semana, cerca de metade dos Estados, incentivados pela campanha de Trump de “reabre tudo” e usando como biombo as diminutas arruaças com cabos eleitorais, milicianos racistas e fanáticos em geral, com bandeiras confederadas, suásticas e armas de grosso calibre, contra a quarentena, liberaram o funcionamento de setores tão essenciais quanto boliches e estúdios de tatuagem, além de cinemas e praias em plena epidemia.
Outros Estados que vêm mantendo as medidas de distanciamento social necessárias para achatar a curva de contágio, quando não se tem nem vacina nem tratamento para a Covid-19, estão sob pressão do governo Trump e seus esbirros.
Pressão que foi Trump quem deu o tiro de largada com sua tuitada de “libertem” os estados da quarentena, depois reforçada com declarações de que a culpa era dos governadores que haviam ido “longe demais”.
Pressão que não é apenas sobre os governadores democratas, mas também sobre governadores republicanos que não se submetem à versão, no terreno da biologia e da medicina, de asnices assemelhadas ao terraplanismo.
Esses grupos de bate-paus, que inclusive vêm hostilizando os trabalhadores da saúde, se tornaram uma seita de culto à morte, com a vida dos cidadãos norte-americanos em jogo, para que não pare a roleta de Wall Street.
RECUO
Esta semana, Trump chegou a anunciar que a força-tarefa anticoronavírus seria extinta, mas já deu o dito pelo não dito, já que, com o repique na pandemia dando as caras em vários Estados republicanos, ele se arrisca a ficar mal na fita.
Como é que vai justificar – indagou um repórter – o desmonte da única ferramenta centralizada de combate à pandemia, sob os atuais e horripilantes números dos Estados Unidos na Covid-19?
Campeão absoluto em mortes (mais de 73 mil) e em infectados (mais de 1,2 milhão).
Trump confessou que ficou surpreso com o prestígio que a força-tarefa detém no país e resolveu que o Dr. Anthony Fauci e a Dra. Deborah Birx vão continuar assessorando o governo “indefinidamente”, mas que o foco do trabalho terá de mudar para a reabertura.
E olhe que Fauci veio a público desmentir a provocação do secretário de Estado Mike Pompeo, de que o coronavírus teria vindo de um laboratório chinês, e reafirmar que a origem é “natural”.
O líder da maioria no Senado, o republicano Mitch McConnell, faz a sua parte na chantagem contra os governadores que não querem abrir de forma caótica, prometendo dificultar a concessão de ajuda federal aos Estados e cidades e dizendo que, por ele, os Estados poderiam decretar falência.
AÇODAMENTO
Andando na corda-bamba, os principais epidemiologistas envolvidos com a força-tarefa vêm buscando deixar claro que se houver açodamento em deixar a “mitigação” do contágio, vai haver uma segunda e pior onda da pandemia no outono/inverno.
Aos governadores que saíram na maior sofreguidão para fazer o que Trump queria, sem respeitar as normas mínimas de contenção da pandemia, o Dr. Fauci alertou que eles deveriam decidir “sobre o sofrimento que se dispõem a suportar”
Entre os governadores favoráveis ao distanciamento social, a democrata Gretchen Whitmer, do Michigan, tem sido alvo de particular hostilidade de parte desses grupos e a bancada republicana no Senado Estadual se recusou a prorrogar o estado de emergência, que ela manteve através de um decreto executivo.
O presidente da Associação Nacional dos Governadores, e governador de Maryland, Larry Hogan, lamentou a balbúrdia feita por um reduzido grupo que, como salientou, “infelizmente era menor do que o número de mortos [da Covid-19] naquele dia”.
Também está havendo choques entre prefeitos de cidades afetadas em cheio pela pandemia, e que querem manter o distanciamento social, e governadores entusiastas de Trump, que querem agradar fazendo apologia do novo slogan de campanha “Reabra a América Agora”.
EXIGÊNCIAS PARA REABRIR
A resposta de Cuomo a essa pressão para reabrir a qualquer custo, sem atender sequer até mesma à norma mínima que Trump diz manter, de que o total de casos esteja em declínio nos últimos 14 dias, foi definir sete exigências que as regiões de seu estado terão de cumprir antes de afrouxar a quarentena.
São elas: 14 dias de declínio em hospitalizações, ou menos de 15 hospitalizações por dia; 14 dias de declínio das mortes em hospital relacionadas ao vírus, ou menos de 5 por dia; taxa de novas hospitalizações abaixo de 2 por 100 mil residents por dia; pelo menos 30% dos leitos disponíveis; pelo menos 30% dos leitos de UTI disponíveis; nível de testagem de vírus mensal de pelo menos 30 por 1.000 residentes; e pelo menos 30 rastreadores de contatos por 100 mil residentes.
Cuomo assinalou que algumas partes do Estado provavelmente atenderiam esses referenciais muito mais cedo que outros. Algumas áreas esparsamente habitadas já cumprem cinco das sete exigências. A cidade de Nova Iorque só atende por enquanto três: mortes hospitalares e novas hospitalizações estão em queda constante, e o número de testes.