O jornal The Morning Star apontou que enquanto a premiê May recitava o mantra ‘Brexit significa Brexit’”, tinha como “prioridade nas negociações com a UE o pacote de exigências do setor financeiro, da City londrina”
Quatro ministros anunciaram renúncia do governo May, após a primeira-ministra formalizar a aprovação do esboço de acordo de saída da União Europeia. Ela foi recebida no parlamento com risadas de escárnio e gritos de “renuncie”. Um deputado do próprio partido de May apresentou pedido de voto de desconfiança.
O negociador-chefe do Brexit, Dominic Raab, foi o segundo no posto a renunciar por não concordar com o que estava sendo definido. Ele denunciou que o esboço de acordo “não pode ser conciliado com as promessas feitas ao público”. “Não posso, em boa consciência, apoiar os termos propostos para o nosso acordo com a UE”.
Ele advertiu que o acordo na sua forma atual dá à UE “o poder de veto sobre nossa capacidade de sair”. “Nenhuma nação democrática jamais se inscreveu para se comprometer com um regime tão extensivo”.
A primeira a deixar o governo conservador foi a ministra para assuntos da Irlanda do Norte, Shailesh Vara, que afirmou que o acordo de May deixa a Grã Bretanha em uma “situação intermediária sem limite de tempo de quando finalmente nos tornaremos uma nação soberana” e “limitados por regras determinadas pela UE sobre as quais não temos voz”. Ela acrescentou que o esboço deixa questões críticas sem definição, prevendo que “levará anos para concluir” um acordo comercial com o bloco.
CITY LONDRINA
A primeira-ministra May afirmou que acreditava “com cada fibra” de seu ser que estava oferecendo o melhor acordo disponível. O que foi contestado pelo jornal progressista inglês The Morning Star, que apontou como May, enquanto recitava “enganosamente o mantra ‘Brexit significa Brexit’”, tinha como “prioridade o tempo todo” nas negociações com a UE “o pacote de prioridades exigidas pelo setor financeiro, a City londrina”.
O jornal advertiu sobre as “restrições aos auxílios estatais à indústria” que constam do esboço de acordo, cujo alvo não são os governos neoliberais nas vertentes tory ou blairista, mas um governo Corbyn “com planos para uma maior intervenção estatal na economia, renacionalização de empresas, investimento público e planejamento governamental”. Nas eleições do ano passado, a campanha de Corbyn defendeu que não há como enfrentar de forma eficaz “os problemas de baixo investimento, salários estagnados e infraestrutura envelhecida através do neoliberalismo”.
Para o Morning Star, o esboço de acordo significa “deixar apenas um nome”, com os governos britânicos obrigados a seguirem “a maioria, se não todas as regulamentações” da UE “sem ter participação em sua definição”.
Esther McVey, a ministra do Trabalho e Previdência demissionária declarou que “não posso defender isso e não posso votar neste acordo. Não é bom tentar fingir que este acordo honra o resultado do referendo quando é óbvio para todos que isso não acontece”.
McVey disse ainda que “fomos de ‘nenhum acordo é melhor do que um mau acordo’, para ‘qualquer acordo é melhor do que nenhum acordo’.
Já May, asseverando que é seu acordo ou o dilúvio, ameaçou os britânicos com um “caminho de incerteza profunda e grave”. “Este não é o acordo que foi prometido ao país e o parlamento não pode e acredito que não aceitará uma falsa escolha entre este acordo ruim e nenhum acordo”, rebateu Corbyn.
Ele classificou o acordo de May de “fracasso” que não oferece ao país a chance de “retomar o controle da economia britânica”. “Quando até mesmo o ministro do Brexit que, teoricamente pelo menos, negociou o acordo diz ‘não posso apoiar o acordo proposto’, que confiança isso dá a mais alguém aqui ou no país inteiro?”
A oposição trabalhista advertiu que o governo conservador está à beira do colapso. “O governo May está desmoronando diante de nossos olhos”, afirmou o deputado Jon Trickett e a BBC descreveu a crise como “um dia de montanha-russa na política britânica”, enquanto May tenta freneticamente salvar seu governo do colapso. Há ameaça de mais renúncias
O Conselho Europeu anunciou a realização de uma reunião extraordinária para decisão do bloco sobre o esboço de acordo com a Grã Bretanha no próximo dia 25, embora o presidente do órgão do bloco europeu, Donald Tusk, haja acrescentado um “se nada acontecer de extraordinário”.
Nas mais de 500 páginas de acordo, entre outras cláusulas, fica estabelecido que a Grã Bretanha pague até 39 bilhões de libras esterlinas de multa por sair do bloco comercial, um período de transição sob regras da UE para negociação de tratado substituto e um mecanismo de flexibilização alfandegária na fronteira interirlandesa. Os acordos precisam ser votados pelos parlamentos Europeu e britânico, com a saída marcada para 29 de março de 2019. No plebiscito de 2016, o Brexit venceu com quase 52% dos votos. Tem havido manifestações por um segundo referendo, sobre o teor do acordo, e Corbyn tem defendido eleições gerais, para formar um governo com capacidade de negociar um acordo decente e que respeite a votação do Brexit e seu princip al significado, o repúdio à desindustrialização que grassa desde o regime Thatcher, o rechaço à austeridade e à especulação, e a disposição de retomar o controle sobre a economia britânica.
ANTONIO PIMENTA