“Ele acha que vão fazer uma busca e apreensão… em casa”, diz o ex-ministro para a filha. Ela avisa: “estou falando de um celular normal”. “Ah, é? Então depois a gente se fala, tá?”, diz Ribeiro
O áudio, autorizado pela Justiça, de um telefonema entre o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, e sua filha, e com outras pessoas, onde ele diz a ela que Bolsonaro o avisou da operação de busca e apreensão na investigação do esquema de propina no MEC, agravou ainda mais a crise e levou a oposição a intensificar os esforços para a abertura de uma CPI para investigar o caso.
Ouça o áudio da conversa que ocorreu em 9 de junho
Veja a transcrição:
Conversa com uma pessoa identificada como Waldomiro:
MILTON RIBEIRO: Tudo caminhando, tudo caminhando. Agora… tem que aguardar né…. alguns assuntos tão sendo resolvidos pela misericórdia divina né…negócio da arma, resolveu… aquele… aquela mentira que eles falavam…que os ônibus estavam superfaturados no FNDE… pra… (ininteligível) também… agora vai faltar o assunto dos pastores, né? Mas eu acho assim, que o assunto dos pastores… é uma coisa que eu tenho receio um pouco é de… o processo… fazer aquele negócio de busca e apreensão, entendeu?
Conversa com uma pessoa identificada como Adolfo:
MILTON: (…) mas algumas coisas já foram resolvidas né… acusação de que houve superfaturamento… isso já foi… agora, ainda resta o assunto do envolvimento dos pastores, mas eu creio que, no devido tempo, vão ser esclarecidos.
Em conversa com a filha
MILTON: Não! Não é isso… ele acha que vão fazer uma busca e apreensão… em casa… sabe… é… é muito triste. Bom! Isso pode acontecer, né? se houver indícios né…”…A filha alerta o ex-ministro de que está falando de um celular normal. Milton, então, responde: “Ah, é? Então depois a gente se fala”.
Uma mensagem clara de que a conversa continha informações que não poderiam vir a público porque envolve a interferência de Bolsonaro.
RANDOLFE JÁ TEM ASSINATURAS PARA CPI DA PROPINA DO MEC
Na quinta-feira (23), o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, afirmou que conseguiu o número mínimo de assinaturas necessárias para abrir uma CPI sobre o Ministério da Educação no Senado. Ele tinha ficado de esperar até terça-feira próxima para apresentar oficialmente o pedido porque mais senadores queriam assinar o pedido.
O líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG), disse esperar que o STF (Supremo Tribunal Federal) e a PGR (Procuradoria-Geral da República) autorizem a Câmara a investigar se houve interferência do presidente Jair Bolsonaro no caso do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. Já a senadora Simone Tebet (MDB-MS), pré-candidata a presidente da República pelo MDB, afirmou que isso faz com que as suspeitas sobre o Ministério da Educação cheguem “na sala do presidente da República”. “Se comprovado, seria o mesmo caso do Bessias da Dilma com o Lula”, declarou ela.
O líder do PSB na Câmara, Bira do Pindaré (MA), afirmou que deveria haver uma CPI para investigar o caso. “É preciso que haja uma busca, uma investigação mais aprofundada para ver as conexões disso. Mas me parece que ali é só a ponta do iceberg”, declarou. “Não sei em que medida eles [eleitores bolsonaristas] estão preocupados com essas denúncias de corrupção. Agora, que a corrupção existe no governo Bolsonaro ninguém tem mais dúvida”, disse Bira.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) apontou corrupção no episódio. “Tráfico de influência, corrupção ‘light’ são inadmissíveis quando o assunto é dinheiro público. É preciso apurar e punir qualquer ilícito. Caso haja comprovação de que o presidente da República repassou informação privilegiada ao seu ex-ministro, ele deverá responder por seus atos”, afirmou a parlamentar.
ÁUDIO REFORÇA NECESSIDADE URGENTE DA CPI, DIZ ALESSANDRO VIEIRA
Para o senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), “o áudio reforça a necessidade urgente de instauração da CPI do MEC. O Congresso e a Justiça não podem fechar os olhos para a realidade”, destacou. “Tentativas de interferências do presidente Jair Bolsonaro em investigações da Polícia Federal, infelizmente, é uma rotina ilegal que precisa ser interrompida. Só creio nisto, com uma mudança de governo!”, disse o senador Rogério Carvalho (PT-SE).
A senadora Leila Barros (PDT-DF) afirmou que “a quebra de sigilo de operações policiais é muito grave”. Ela põe em risco preservação de provas. “Se comprovada essa notícia, além de configurar crime, a atitude do presidente afetará a credibilidade da Polícia Federal”, apontou. “Também chama a atenção na conversa entre Milton Ribeiro e a filha, o trecho em que ela o alerta que ligou de um celular normal. Logo em seguida, Milton desconversa e encerra a conversa”, observou a senadora.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES) também considerou grave a denúncia. “O sigilo, em operações de busca e apreensão, evita a destruição de provas. Essa notícia é gravíssima: se confirmada, o Presidente da República incorreu nos crimes de violação de sigilo (art. 325, CP) e de obstrução de justiça (art, 2º, § 1º, da Lei 12.850/13)!”, afirmou.