Investigadores descobriram empresas milionárias de Guedes nas Ilhas Virgens Britânicas e de Campos no Panamá. Guedes defendeu regras que beneficiam quem tem dinheiro fora e ganhou R$ 14 mil por dia só com a elevação do dólar
O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, são donos de empresas offshore, ou seja possuem dinheiro depositados em paraísos fiscais. As informações vieram a público com a “Pandora Papers”, uma investigação jornalística baseada em um grande vazamento de documentos confidenciais de 14 escritórios de advocacia especializados na abertura de empresas em países como Panamá, Ilhas Virgens Britânicas e Bahamas.
São mais de cinco décadas de registros que permitem reconstruir quem, onde e para que foram criadas essas empresas, dados que de outra forma não teriam se tornado públicos. Além da imoralidade que representa a existência das empresas offshore de Guedes e Campos, os dois cometem ilícitos internos ao afrontarem o Código de Conduta da Alta Administração Federal, que proíbe “investimento em bens cujo valor ou cotação possa ser afetado por uma decisão ou política governamental”.
Ambos, segundo a investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, em sua sigla em inglês), criaram empresas em paraísos fiscais e nunca informaram sobre isso à opinião pública, apesar da relevância dos cargos que ocupam no país.
MINISTRO DA ECONOMIA ESPECULA COM DÓLARES NO EXTERIOR
Guedes aparece como acionista da empresa Dreadnoughts International Group, registrada nas Ilhas Virgens Britânicas.
Atualmente, um seleto grupo de 20.554 pessoas, entre os quais estão Guedes e Campos, possui 204,2 bilhões de dólares em contas declaradas no exterior, segundo o BC. Mas os especialistas calculam que a cifra em dinheiro ilegal é muito superior e seria de um trilhão de dólares.
No último dia do governo de Michel Temer, em 31 de dezembro de 2018, o dólar comercial custava R$ 3,87. Já, atualmente, cada dólar equivale a mais de R$ 5. Dessa forma, Guedes lucrou aproximadamente R$ 14 mil por dia durante os 1.004 dias do governo Bolsonaro.
Agora dá para entender bem por que o dólar não parou de subir no governo Bolsonaro e na administração Guedes. Enquanto mais de 30 milhões de pessoas não conseguem um trabalho decente, enquanto 19 milhões de pessoas sofrem sem ter o que comer, Paulo Guedes, com sua política nefasta, está embolsando através da Dreadnoughts International Group, R$ 14 mil por dia.
CAMPOS NETO E A ARAPUCA MOSSACK FONSECA
Campos Neto, por sua vez, é dono de quatro empresas. Duas delas, Cor Assets e ROCN Limited, são registradas no Panamá em sociedade com sua mulher, a advogada Adriana Buccolo de Oliveira Campos. O objetivo declarado das empresas é investir nos ativos financeiros do Santander Private Bank, cujo conselho executivo Campos Neto integrou no passado. As outras offshores são Peacock Asset Ltda, gerida pelo banco Goldman Sachs, e que foi descoberta na investigação do Bahamas Leaks, de 2016. A quarta empresa é a Darling Group, que segundo informou o Banco Central, é uma empresa de “gestão de bens imóveis”.
Campos Neto abriu sua primeira empresa no exterior, a Cor Assets, uma sociedade anônima, em 6 de abril de 2004, através do escritório Mossack Fonseca, conhecida arapuca de evasão de divisas. Em abril de 2018, depois do escândalo dos Panama Papers, ele transferiu a offshore para outro gestor, a Overseas Management Company (OMC). Naquela época, ele tinha um capital de um milhão de dólares.
Quem intermediou a compra da offshore foi a Trident Trust, uma empresa suíça que mantém filiais em vários paraísos fiscais e oferece soluções secretas para pessoas ou organizações que desejem manter suas atividades ocultas, segundo fontes do mercado financeiro. É um serviço semelhante ao prestado pela Mossack Fonseca, o escritório de advocacia panamenho que ficou famoso depois que o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos revelou seus documentos, em 2016.
GUEDES DEFENDEU NORMA QUE BENEFICIA QUEM TEM DINHEIRO NO EXTERIOR
Os documentos mostram que o ministro da Economia possuía em 2014 pelo menos oito milhões de dólares (43,3 milhões de reais, pelo câmbio atual) investidos na companhia, registrada em seu nome e nos de sua esposa, Maria Cristina Bolívar Drumond Guedes, e filha, Paula Drumond Guedes. Esse número subiu para 9,5 milhões no ano seguinte, segundo os documentos obtidos pela investigação, da qual participou a revista brasileira Piauí.
O escândalo é ainda mais grave porque o ministro da Economia foi o responsável por enviar ao Congresso Nacional um projeto da reforma fiscal que, em sua versão atual (o texto saiu da Câmara para o Senado), beneficia quem mantém dinheiro em paraísos fiscais. Ou seja, enviou ao Congresso Nacional uma norma em seu próprio benefício. A proibição de possuir empresas é exatamente poder evitar que “a autoridade pública tenha informações privilegiadas, em razão do cargo ou função.”
Guedes tenta justificar o desrespeito ao Código de Conduta da Alta Administração Federal dizendo que declarou suas empresas offshore. O Ministro da Economia mantém milhões no exterior e toma decisões que beneficiam quem tem dinheiro no exterior. Isso extrapola o Código de Conduta. É um caso de polícia.
Na mesma linha da enrolação e do acobertamento, o Ministério da Economia, que ele dirige, informou que a atuação privada anterior à sua posse em 2019 “foi devidamente declarada à Receita Federal e aos demais órgãos competentes, o que inclui sua participação societária na empresa Dreadnoughts International Group”. Deve ter sido ele mesmo que redigiu essa nota. A verdade é que Guedes mantém milhões lá fora para sonegar impostos no Brasil.
MINISTRO DA ECONOMIA ESTIMULA BRASILEIROS A ENVIAREM DINHEIRO PARA FORA
É esse o exemplo que o ministro da Economia dá aos brasileiros. Especular com o dólar no exterior ao invés de investir no crescimento do país. As empresas offshore fazem exatamente isso. Ajudam a especular sem pagar impostos. Em seus anúncios, elas oferecem a seus potenciais clientes, entre eles Paulo Guedes e Roberto Campos, “evitar o pagamento de impostos”.
A manutenção dessas empresas em paraísos fiscais acaba esvaziando a arrecadação fiscal nacional, já que muitos contribuintes com rendas altas as usam para evitar os tributos. E é esse o caso do ministro da Economia e do chefe do BC.
O advogado tributarista Márcio Calvet Neves explica o trambique de Guedes e Campos ao jornal El País. O dinheiro pode permanecer durante anos em uma empresa no exterior, sem que seu proprietário pague nenhum imposto por ele. “O Brasil tem uma legislação muito completa para tributar os benefícios das companhias no exterior. Mas não ocorre o mesmo com as pessoas físicas. Basta possuírem uma empresa no exterior e assegurarem que essa empresa não distribui dividendos para o Brasil para que nunca sejam tributados”, diz Neves.
Por esse caminho, os espertalhões, tipo Guedes, mantêm seu dinheiro blindado no exterior. Podem, inclusive usufruir dele lá fora, mesmo que o recurso tenha sido ganho em atividades ou negócios no Brasil. Se não fosse pelos Papéis da Pandora, não seria possível saber que o ministro da Economia e o presidente do Banco Central possuem empresas em paraísos fiscais. A agência tributária brasileira considera paraísos fiscais as jurisdições com uma alíquota tributária inferior a 20%, ou cuja legislação proteja o sigilo da composição societária das empresas. Mais de 60 países e territórios compõem essa lista, entre eles o Panamá, Hong Kong, as Ilhas Virgens e Chipre.