Os deputados paraguaios que ainda dão respaldo ao presidente Abdo Benítez e a seu vice, Hugo Velázquez, retiraram-se do plenário da Câmara na quarta-feira, dia 7, para forçar o adiamento de uma sessão extraordinária na qual estava prevista a discussão do impeachment (que lá designam de ‘Juicio Político’) dos dois chefes de governo.
Os dois estão diretamente implicados nas escandalosas e nebulosas negociações envolvendo uma secreta ata normativa sobre a Hidrelétrica de Itaipu, que chegou a ser firmada por Benítez e Bolsonaro, mas logo anulada depois de denunciada pelo presidente da empresa paraguaia de energia elétrica, a ANDE, como “traição à pátria” e “extorsão financeira”.
Dos 80 parlamentares, 39 ficaram em plenário. A sessão foi então suspensa pelo presidente Pedro Allana.
Na pauta da sessão havia duas moções, a primeira entregue pelos deputados do Partido Liberal Radical Auténtico (PLRA), pedindo o julgamento do presidente e de seu vice e a segunda trazida pelos parlamentares do partido Pátria Querida (PQ) pedindo que o julgado seja apenas o vice, Velázquez.
Em mais uma obstrução para evitar que um assunto dessa gravidade siga adiante, os deputados do partido do presidente, o “Colorado Añetete” e do ex-presidente, Horacio Cartes, o “Honor Colorado”, ainda não indicaram os nomes para compor a comissão especial, sem a qual o presidente diz que não pode instalar uma CPI já aprovada para discutir as questões relacionadas a Itaipu.
Com a obstrução, houve risco do parlamento ficar em suspenso. Isso só não aconteceu porque se chegou a um acordo com base em uma proposta do presidente, definindo que as propostas de julgamento dos governantes paraguaios serão recebidas pela Comissão de Assuntos Constitucionais e que o assunto não seria trazido a plenário nas sessões seguintes, ordinárias.
Apesar do acordo, a tensão tem se elevado no país e no próprio parlamento. Na mesma noite, a casa do presidente da Câmara foi cercada por cidadãos revoltados que afixaram cartazes nos muros da residência com dizeres como: “Fora com os vende-pátria. Não os queremos mais. Julgamento Político Já! ”.
Na sessão do dia seguinte, quinta-feira, essa tensão veio à tona em um bate-boca entre a deputada Kattya González (Partido Encuentro Nacional, PEN) – que havia conclamado os paraguaios a tomarem as ruas contra os corruptos do governo – e o deputado governista Sarmaniego.
Ao tomar a palavra Kattya foi interrompida pelo deputado e revidou: “Já sei. O senhor não gosta que falemos de corrupção” e, voltando-se para o presidente da sessão: “É um mal-educado, esse senhor. Se acredita que, porque se faz de detrator, vai me fazer tremer, está equivocado. Porque tem esse ar de prepotente e afeito a maltratar e agredir, aqui não vai me maltratar”.
A seguir, voltando-se para o deputado que a havia interrompido, lhe recordou que ele havia agredido, no mês de junho, ao senador Jorge Querey, da Frente Guasu e pondo-se de pé, desafiou: “Venha se tem coragem!”.
O que os parlamentares e os chefes de governo não estão conseguindo deter, é a investigação que corre na Procuradoria Geral.
NOVAS MENSAGENS, NOVAS DENÚNCIAS
Na quarta-feira, o ex-presidente da ANDE, Pedro Ferreira, apresentou novas denúncias à Procuradoria, através de seu advogado, Jorge Bogarín. Mais cópias de mensagens de seu celular, desta vez implicando sua assessora na trama para beneficiar a empresa Léros, denunciada como ligada a interesses da família Bolsonaro. A assessora da Presidência da ANDE, Carmen Velázquez, que é irmã do vice-presidente, Hugo Velázquez, teria tentado impedir Ferreira de ir a um evento onde este – já com a posição formada de oposição à ata, em especial à exclusão do item 6 (exclusão que teria como objetivo garantir à Léros a primazia na venda de energia excedente do Paraguai no Brasil) – estava decidido a interpelar o presidente.
Em mensagem, cuja cópia foi entregue pelo advogado de Ferreira, Carmen diz a ele que não poderia, no dia 24 de maio pela manhã, se encontrar com o presidente Benítez, que naquele horário estaria vistoriando a construção de uma interconexão com uma subestação, enquanto que Ferreira estava convidado a dar uma palestra em outro local, no mesmo horário.
Ferreira diz que atuou para desmarcar os compromissos agendados e insistidos por Carmem, para ir ao encontro do presidente, horas antes da assinatura da ata. Lá, disse Ferreira, teria perguntado ao presidente Benítez se ele estava inteirado da exclusão do item 6.
Ainda segundo Ferreira, o presidente lhe teria dito que não sabia nada a respeito e, então, Ferreira o teria alertado para o problema.
Mesmo assim, a ata – agora anulada – foi firmada nos termos que se estava combinando com a participação de lobistas (pelo Brasil o suplente de senador, Alexandre Giordano, do partido de Bolsonaro, o PSL e pelo Paraguai, o advogado Joselo Rodríguez, que se apresentava como assessor do vice-presidente paraguaio, Velázquez).
NATHANIEL BRAIA